segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Um leão viciado em sofrimento

                                                                                                                                                        
Há muito que não me lembrava de passar um intervalo de um jogo a conversar de forma totalmente descontraída, como se a partida já tivesse terminado. Tanto eu como os meus companheiros de bancada encarávamos os segundos 45 minutos como uma espécie de pró-forma em que a única dúvida era quanto mais golos iríamos marcar.

Uma primeira parte bastante convincente permitiu acumular uma vantagem de 3 golos: começando com um autogolo de Bauer a cruzamento de Carrillo, seguido de um cruzamento fantástico de Nani lido e desviado de forma perfeita por João Mário, que se deixou deslizar até ao ponto onde a bola iria tocar no chão, e um invulgar (para o que tem sido tradicional nesta época) golo a partir de um canto - marcado por Paulo Oliveira, com nova assistência do suspeito do costume.

No entanto, um início de segunda parte desastroso poderia ter deixado tudo a perder. A equipa cometeu demasiados erros que foram aproveitados pelo Marítimo para relançar o jogo, funcionando como uma espécie de ice bucket challenge coletivo sobre os jogadores do Sporting e os adeptos presentes no estádio.

Valeu um golo fantástico de Montero para matar a ansiedade que tomou conta do estádio durante 10 minutos - que mais pareceram 10 horas -, e que veio pôr um pouco mais de justiça no resultado. No rest for the weary, lá diz o ditado anglo-saxónico.



Positivo

Aquela coisa que Nani joga - mais um grande jogo de alguém que nitidamente vive na sua própria realidade. Há a velocidade de raciocínio e execução do comum dos mortais, e depois há a velocidade de raciocínio e execução de Nani. Resultados práticos: duas assistências que acabaram em golo, mais um punhado de assistências que acabariam em golo se fosse outro Nani a finalizar, uma bola na barra e ainda outro remate que não ficou muito longe de fazer balançar as redes. Há o futebol e depois há aquela coisa que Nani joga. Gosto muito.

Omnipresença de Adrien e João Mário - dois batalhadores com muito futebol nos pés. Acabaram por ser decisivos: João Mário ao marcar o 2º golo e Adrien ao encontrar Montero para o golo que devolveu a tranquilidade a Alvalade. Adrien teve direito à ovação da noite, quando foi substituído a poucos minutos do fim. Mereceu-a.

O golo de Fredy - só por si justificou o preço do bilhete. Segundo golo consecutivo para o campeonato, o que é importantíssimo perante a ausência de Slimani. O colombiano não tem a mesma presença na frente de ataque que o argelino, mas aproveitou bem a oportunidade da titularidade.

Miguel Lopes, o reforço silencioso - foi bom ver finalmente Miguel Lopes regressar aos relvados. Entrou muito bem em jogo, e é uma mais-valia para Marco Silva dispor de alguém no banco ou em campo que a qualquer altura pode ser chamado para qualquer um dos corredores.

Muitas crianças nas bancadas - jogar às 18h é um convite para trazer as famílias à bola mas, no caso do Sporting, é uma raridade termos direito a jogos que não comecem às 20h ou mais tarde. Ontem as famílias corresponderam à chamada, e foi bom ouvir os cânticos que um conjunto de miúdos sentados duas filas atrás ia improvisando à medida das circunstâncias do jogo. Mar-ca Mon-te-ro! Mar-ca Mon-te-ro! ou De-fen-de, tu tu tu, de-fen-de! Seria bom termos mais jogos que não terminassem à hora das crianças estarem na cama.

Negativo

Descompressão e gestão do jogo não são a mesma coisa - a partir do 2-0 o Sporting pareceu abrandar um pouco o ritmo, o que se compreende atendendo ao facto de estar a cumprir o 3º jogo no espaço de uma semana, e que incluiu duas partidas altamente desgastantes. Mas não convém exagerar. A equipa começou a perder demasiados lances divididos, deu demasiado espaço ao Marítimo, agravado por momentos de desconcentração que acabaram por resultar em várias oportunidades junto à baliza de Rui Patrício. A displicência com que Carrillo falhou um golo um pouco antes do 4-2 foi provavelmente o caso mais gritante. Gerir vantagens é uma coisa boa, tirar férias com o adversário ainda em campo é que não pode ser.

Sub-Jonathan - não sei se terá alguma coisa a ver com a "mão" de Gelsenkirchen, mas poucas coisas saíram bem ao argentino - quer a defender quer a atacar. No entanto, foi pelo seu papel defensivo que acabou por ser destaque pela negativa: deixou Maazou fugir nas suas costas no lance do 3-1 (apesar de Rui Patrício ser o principal responsável), e estava completamente desposicionado (subiu demasiado no campo a perseguir a bola em posse do Marítimo) no 3-2. De resto, muitos passes errados e pouca ou nula acutilância ofensiva. Foi bem substituído por Marco Silva.

As bestas que lançam petardos - é incompreensível que após todas as (pesadas) multas que o Sporting tem que pagar, após os avisos da UEFA para uma eventual interdição do estádio ou fecho de determinadas bancadas, após os pedidos do clube para pararem com essa brincadeira, continuem a haver energúmenos a disparar petardos em TODOS os jogos. A esmagadora maioria dos sportinguistas desaprovou com uma monumental assobiadela. As câmeras de vigilância não podem ser usadas para identificar e expulsar esta malta?


Acabou por ser um bom domingo. A derrota do Benfica coloca-nos apenas a 3 pontos da liderança, e ainda há um Porto - Benfica por disputar na 1ª volta. Olho para o que o Sporting joga e não vejo mais ninguém em Portugal neste momento a conseguir fazer melhor. Segue-se uma prova de fogo em Guimarães. Na minha opinião não poderia vir em melhor altura.