terça-feira, 10 de março de 2015

Magnetismo para o sofrimento

Oito minutos depois de o árbitro ter apitado para o início da partida, sentia-se na bancada um ambiente de descontração que ainda não sido vivido em Alvalade esta época. Acabávamos de assistir a uma entrada fulgurante do Sporting no jogo que se traduziu em dois golos e numa outra oportunidade flagrante, que deixavam antever o mais tranquilo jogo da época. As únicas dúvidas que pairavam nas mentes sportinguistas para o final de noite em Alvalade passavam por saber quantos mais golos iríamos marcar e quais as opções que Marco Silva tomaria para a tão necessária gestão física dos jogadores neste fim de ciclo de jogos tão exigente.

Mas eis que, dois minutos mais tarde, os deuses decidiram-nos castigar pelo atrevimento que tivemos em achar que o jogo estava resolvido. Uma sequência de 3 asneiras consecutivas condenou-nos a jogar com 10 homens durante 80 minutos e, como se isso não fosse suficiente, o Penafiel marca na sequência do livre. Pior que isto era mesmo impossível. Mais uma demonstração de algo que tem sido recorrente esta época: uma espécie de magnetismo para o sofrimento, uma criatividade imensa na forma como deixamos os adversários voltar ao jogo quando tínhamos tudo para o matar. Tudo, mas mesmo tudo nos acontece. E raramente são coisas boas.

Justiça seja feita no entanto à equipa: mandou sempre no jogo e mesmo o 2º golo do Penafiel só surge graças a mais um erro nosso. Na 2ª parte o Penafiel esteve 37 minutos em superioridade numérica e nunca conseguiu chegar com perigo à nossa área nesse período - e só o conseguiu mesmo ao cair do pano graças a mais uma gritante demonstração de falta de inteligência da nossa parte - ao querer, de forma disparatada, procurar o 4º golo em vez de segurar a bola nos poucos minutos que restavam. Vitória inteiramente justa que peca por escassa e que, acima de tudo, não merecia ter sido alcançada de forma tão sofrida.



Positivo

Nani, artista de circo - preciosíssimo o golo que o mágico Nani marcou (grande cruzamento de Carrillo), dando depois lugar ao acrobata Nani a fazer o mortal de festejo; já não foi tão apreciado o número de malabarismo com milhares de corações verdes e brancos, quando decidiu passear com a bola dentro da nossa área com vários adversários nas redondezas. Apesar de ter sido muito castigado pelos jogadores do Penafiel - inicialmente com a complacência do árbitro -, foi quase sempre o jogador mais esclarecido que tivemos.

William multi-funções - começou por voltar a fazer o gosto ao pé, um ano depois, com um remate oportuno de ressaca dentro da área do Penafiel. Após a expulsão de Tobias, William desceu para o lado de Paulo Oliveira e fez o resto da primeira parte numa posição que não é a sua. Mas como não poderia deixar de ser, William saiu-se bem, chegando perfeitamente para as encomendas. Na segunda parte regressou ao meio-campo e foi o varredor eficiente de sempre, mesmo atuando uns metros mais à frente do que é costume. Viu um amarelo a poucos minutos do fim e não poderá jogar contra o Marítimo.

Rui Patrício - passou a 2ª parte a fazer sprints de um lado para o outro para se manter quente, já que o adversário não lhe dava qualquer trabalho. Mas quando foi necessário fez uma enorme intervenção ao impedir o empate, já nos descontos. Mais uma vez a valer pontos.

A estreia de Ewerton - exibição positiva do brasileiro. Impôs-se com facilidade nas bolas divididas e revelou bastante tranquilidade numa conjuntura que não era nada fácil.


Negativo

A tripla asneira que quase deitava tudo a perder - aos 10 minutos, Adrien faz um passe absurdo que coloca a bola nos pés de um adversário no nosso meio campo; Slimani reage rapidamente e consegue roubar-lhe a bola mas atrasa-a mal para Tobias; e finalmente a decisão do central que, com o resultado em 2-0, não devia ter arriscado o corte. Mais valia ter acompanhado Guedes e estorvado o remate o melhor que pudesse. Coisas que acontecem a miúdos de 20 anos. Faz parte do processo de crescimento. Felizmente que desta vez acabou por não nos custar pontos.

Falta de inteligência a gerir o relógio - infelizmente não é a primeira nem a segunda vez que acontece: é incompreensível que nos últimos minutos o Sporting tenha procurado o golo em vez de fazer rodar a bola e esgotar o tempo que restava. Honestamente: aguento 80 minutos de sofrimento apoiando sempre a equipa, mas fico furioso quando vejo que não há ninguém que mande um berro lá para dentro e os obrigue a circular a bola - ainda por cima estávamos a jogar 10 contra 9. Exemplo: numa dessas ocasiões, João Mário decide rematar de fora da área com poucas hipóteses de sucesso. Resultado: oferecemos de mão beijada duas posses de bola ao Penafiel - e numa delas quase que chegaram ao empate. Inadmissível.

As mágoas de Rui Quinta - Rui Quinta devia fazer uma estatística de quantos treinadores na I Liga tiveram o privilégio de jogar 80 minutos em superioridade numérica num estádio de um grande. Marcou dois golos sem saber bem como, e uma vez empatado dispôs de mais de 40 minutos para se colocar em vantagem até ter o seu primeiro jogador expulso. Mas em vez disso optou por meter o autocarro e nunca fez por chegar à área do Sporting com perigo. Em superioridade numérica acabou por encaixar um golo, mas podia ter levado mais. Queixar-se de ter um jogador mal expulso aos 83 minutos como causa principal para sair derrotado é desculpa de mau pagador. Queixar-se de ter um jogador mal expulso, quando ficou calado nos jogos contra Porto e Benfica - em que teve bem mais razões de queixa das arbitragens -, revela uma criatura invertebrada desesperada por agradar aos donos.



O essencial foi conseguido. Pelo segundo jogo consecutivo, conseguimos transformar dois resultados negativos em positivos em inferioridade numérica, no meio de uma fase de enorme desgaste. Depois de nos colocarmos em boa posição para alcançar a final da Taça de Portugal, voltámos hoje a colocar o Braga a uma distância minimamente higiénica no campeonato. Nestes dois jogos abanámos mas não caímos - porque soubemos ser persistentes em cenários bastante adversos. Há que pegar nisso para voltar a construir uma equipa mais sólida, confiante e consistente para os jogos que se seguem.