segunda-feira, 4 de abril de 2016

Panama Papers


Ficámos ontem a saber que houve uma fuga de um arquivo gigantesco de documentos que põe a nu a atividade de inúmeras sociedades offshore, algumas das quais estão ligadas a figuras mundialmente conhecidas nas mais variadas áreas da sociedade: política, economia, desporto, entretenimento, entre outras.

O nível do escândalo varia de caso para caso. Pelo que se diz, há situações em que essas empresas offshore "apenas" foram usadas para aproveitar lacunas da legislação de forma a evitar pagar impostos - algumas das quais metendo ao barulho alguns hipócritas moralistas que em público se dizem totalmente contra estas práticas. Noutras, envolvem situações absolutamente tenebrosas relacionadas com todo o tipo de atividades criminosas, como evasão fiscal, corrupção, tráfico de droga ou mesmo financiamento de guerras.

Recorro a este excerto do texto com que Pedro Santos Guerreiro, diretor do Expresso, apresentou o Panama Papers: como surgiu, a ponta do icebergue que já se conhece, e as implicações que poderá ter para o mundo.

O que tem isto a ver com o futebol português? Diretamente, nada. Indiretamente, muita coisa.


Nos últimos meses, o futebol português tem discutido dilemas, à sua escala, sobre o que é "apenas" aproveitamento de lacunas na legislação, ou algo mais.

Tem-se debatido se a oferta dos vouchers - que durante mais de um ano foi escondida do público por quem os oferecia e quem os recebia - são apenas o tal aproveitamento dos buracos legais (por quem alega que o seu valor fica abaixo do tal limite de €200 e não passa de uma cortesia) ou se representa algo mais do que isso. 

Debate-se se os telefonemas de aviso de Vítor Pereira antes dos jogos do Benfica - que foram mantidos em segredo até ao momento em que um dos intervenientes decidiu revelá-los - são simples pressões de um patrão preocupado ou se representam algo mais que isso. 

Num passado não muito distante, durante duas décadas, toda a gente sabia que existia uma rede que viciava resultados. Ninguém a via, mas todos sabiam que estava lá. Simplesmente, não se sabia como funcionava em concreto. Até que as escutas do apito dourado lançaram luz sobre o assunto, infelizmente sem consequências para quem montou toda essa rede e usufruiu dela. 

Seria bom que o futebol português tivesse o seu Panama Papers. Porque, não existam dúvidas, há uma indústria de segredo, que é tão grande que toda a gente sabe que existe, mas tão intestina que ninguém a vê. Ou, em alguns casos, não a querem ver, o que ainda é pior.