segunda-feira, 23 de maio de 2016

O artigo do El Mundo sobre as investigações às transferências do Valência

Finanças atrás do Valência


A Agência Tributária prepara um relatório pedido pela Anticorrupção sobre as contratações de Lim


A Agência Tributária abriu uma investigação sobre o Valência CF e há várias semanas que revê, sobretudo, aspetos fiscais das contratações realizadas durante a gestão do magnata Peter Lim, maior acionista do clube. A iniciativa das finanças acontece a pedido da Fiscalidade Anticorrupção, que tem abertas, desde o passado mês de março, diligências de investigação penal, segundo confirmaram ao El Mundo fontes conhecedoras do caso.

A Fiscalidade decidiu agora aceitar investigar parte dos argumentos que faziam parte de uma denúncia genérica apresentada pelo ex-vice presidente do Valência, Miguel Zorio. Essa denúncia inicial, muito pouco consistente, referia a existência de "presumíveis delitos económicos" que, no seu juízo, teriam sido cometidos por Lim em conluio com o conhecido agente Jorge Mendes e o ex-presidente Amadeo Salvo, referentes tanto à compra das ações do clube como ao mercado de contratações.

O primeiro pedido, por supostos delitos de gestão danosa, corrupção na condução de negócios e apropriação indevida, foi arquivada praticamente de imediato pela Fiscalidade Provincial, ao não encontrar quaisquer motivos na denúncia. Isso sucedeu no mês de outubro do ano passado.

Essas diligências iniciais centraram-se sobretudo em supostas irregularidades no processo de aquisição de ações. O Ministério Público não detetou nada de ilícito a esse respeito. No entanto, agora decidiu-se que a Agência Tributária deverá fazer um relatório preliminar sobre a forma como o Valência realizou algumas das suas últimas contratações, em que intervieram sociedades radicadas fora de Espanha. É essa engenharia financeira que está a ser analisada.

No Valência CF, cuja direção se encontra estes dias em Singapura, espera-se que a denúncia acabe também arquivada. Em todo o caso, o clube alega que não recebeu qualquer notificação oficial da AEAT ou da Fiscalidade Anticorrupção. Tal como o representante legal da Meriton em Espanha.

A investigação está todavia numa fase muito embrionária e é prematuro retirarem-se conclusões. O que é significativo é que a Anticorrupção recebeu nova documentação e desta vez acabou por decidir iniciar as investigações que, em princípio, partirão das teses desenvolvidas por Zorlo, que em setembro de 2015 pôs em marcha a Marea Valencianista como plataforma de oposição a Lim e de fiscalização da Meriton Holding e da Meriton Capital, as duas principais empresas que Lim usou para a compra de ações e para as transferências de jogadores.

A teoria de Zorlo é que, com a autorização de Lim, Mendes realizou as contratações do clube com preços inflacionados e incluindo comissões cujo valor se desconhece.

Miguel Zorlo é uma personagem com uma ligação ao clube já bem conhecida. Dele se recorda a divulgação juntamente com Soriano a venda do velho Mestalla, algo que nunca se veio a concretizar. Também esteve ligado ao caso Nóos, tendo participado como assessor de comunicação da candidatura de Valência aos Jogos Europeus.

Na Fiscalidade, evitam dar detalhes sobre uma investigação que se pretende que seja conduzida com cautela, dado o impacto que qualquer decisão pode ter sobre a imagem do Valencia CF, em especial num momento em que se levantam suspeitas sobre muitos assuntos ligados ao futebol, grande estrelas incluídas.


Contratações de Lim debaixo da sombra de Mendes


A primeira aparição de Peter Lim em Espanha após ter sido tornada pública a sua oferta de compra do Valencia aconteceu no Vicente Calderón, e com um escudeiro de luxo: o superagente Jorge Mendes. Amigos pessoais, o português transformou-se em assessor do magnata de Singapura, aconselhando-o na compra de direitos de jogadores para o seu fundo de investimento: Meriton Capital Ltd. O mercado português tem sido um bom local de recrutamento.


A primeira compra de Lim foi em janeiro de 2014, de dois jogadores do Benfica que acabaram vestindo a camisola do Valencia: Rodrigo e André Gomes. Pelo primeiro, a Meriton Capital pagou 30 milhões ao clube português, dos quais foram declarados à CMVM um lucro de 13, enquanto que 17 se destinaram a pagamentos a terceiros e comissões. No caso de Gomes, a sua contratação fez-se por 15, dos quais apenas 9,5 ficaram nos cofres do Benfica. Em ambas as operações, Mendes participou ativamente como agente.

Nesse mesmo verão, os dois foram cedidos ao Valência, já propriedade de Lim, e em junho de 2015 passaram a ser propriedade do clube por contrapartida do mesmo valor pago pela Meriton. Nesse novelo de direitos económicos, desportivos e comissões, é onde pode estar o foco das finanças.

O Valência, já sem a mediação do fundo de Lim, comprou também ao Benfica, na temporada passada, Enzo Perez, por 25 milhões, e João Cancelo por 15, e as comissões pagas pelo clube lisboeta chegaram aos 25%. Ambas as contratações foram mediadas por Jorge Mendes.


Compra de direitos

A figura do agente de Cristiano aparece também nas contratações de Negredo, Abdennour, Santi Mina e Bakkali, estes dois últimos de quem é representante. Como na de Danilo Barbosa, cujos direitos económicos eram divididos com o Sp. Braga e o presidente do Mónaco, Dimitri Rybolovlev, com quem negociou a venda de Abdennour por 25 milhões.

Noutra das contratações, de Aderlan Santos, os 10 milhões de transferência foram metade para o Sp. Braga e a outra metade para a empresa MNM, de Fernando Meira, ex-futebolista que tinha Mendes como agente.

É nesta teia que as finanças procuram pontas soltas.