segunda-feira, 16 de maio de 2016

Parabéns à estrutura

Fazendo um balanço sobre a vitória do Benfica no campeonato, penso que é da mais elementar justiça (sem ironia) atribuir a maior fatia de responsabilidade do êxito ao presidente Luís Filipe Vieira. Quando tomou a decisão de dispensar Jorge Jesus - treinador bicampeão que revolucionou o futebol benfiquista e que, de certa forma, acelerou o processo de perda de hegemonia do Porto no futebol nacional - e o substituiu por Rui Vitória, não o fez para poder ter um treinador que finalmente apostasse nos jovens da formação - isso ficou tacitamente desmentido a partir do momento em que o Benfica investiu mais em jogadores em 2015/16 do que em qualquer outra época. Vieira trocou Jesus por Vitória por sentir que o clube que dirige já tinha as condições necessárias para alcançar aquilo que vimos mais a norte durante durante décadas: vencer campeonatos independentemente do treinador à frente da equipa. 

Sem querer retirar o mérito devido (que também o há) a Rui Vitória, parece-me evidente que este campeonato poderia ter sido vencido por qualquer outro treinador minimamente competente, incluindo alguns que num passado não muito distante passaram pelo Benfica sem sucesso.

Se houve um rumo bem definido na estratégia desenhada pela estrutura no que se jogava fora das quatro linhas - com peças-chave distribuídas em todos os tabuleiros que importava controlar -, há que recordar que muito daquilo que de bom (sem ironias, mais uma vez) houve dentro das quatro linhas surgiu mais por obra do acaso do que por um planeamento de época bem delineado. 

Rui Vitória recuperou ontem, na conferência de imprensa, a conversa do caminho, mas convém que não se esqueça a desorientação que revelou durante boa parte da temporada.

Veja-se, por exemplo, as circunstâncias em que Vitória apostou na formação. Sempre pareceu acontecer mais por querer provar a sua faceta de professor do que por convicção nas apostas concretas que foi fazendo. Primeiro colocou Nélson Semedo, mas apenas após certificar-se de que Sílvio não era solução. Nélson Semedo que, quando regressou da lesão, nunca mais agarrou o lugar. Lançou Victor Andrade num par de jogos, mas rapidamente foi descartado e acabou a época a dividir minutos entre a equipa principal e a equipa B do V. Guimarães. Depois lançou Guedes que, após alguns jogos em que deu nas vistas, acabou por não resistir ao hype criado e acabou a época na II Liga, juntamente com Nélson Semedo. Renato teve a sua primeira oportunidade (entrando como suplente) no jogo a seguir à 2ª derrota com o Sporting, e foi titular pela primeira vez no jogo a seguir à 3ª derrota com o Sporting. A utilização de Clésio (que era avançado da equipa B) como lateral direito titular (também após uma derrota com o Sporting) ainda está por explicar. Clésio, que nem sequer é titular no seu atual clube, o Panetolikos. Lindelof aproveitou muito bem as oportunidades que teve, mas que aconteceram devido a lesões prolongadas em simultâneo de dois centrais que estavam à frente na hierarquia. E Ederson, que foi igualmente uma excelente surpresa, teve o seu destino diretamente ligado à lesão da Montblanc de Júlio César.

Se as hesitações reveladas por Vitória até acertar finalmente com a equipa foram mais que muitas, a estratégia da estrutura esteve sempre bem definida. Foi possível vê-la a funcionar em pleno desde o início da época, e nunca abrandou: intoxicação da opinião pública através de uma legião de avençados colocados nos jornais e televisões, promovendo uma parada de difamação e mentiras que, infelizmente, acabou por arrastar o Sporting para a mesma lama onde os Guerras e Gabrieis se sentem à vontade para chafurdar; a consolidação de um quadro de árbitros formado maioritariamente por simpatizantes da causa vieirista, seja por serem adeptos benfiquistas, seja por receio de retaliações na hora das classificações; a facilidade com que conseguiram constantemente impor a sua vontade no adiamento ou recalendarização de jogos (Braga, União ou Nacional, que provavelmente valeu aos madeirenses a eliminação da Taça de Portugal), bem como na definição dos horários de jornadas que se seguiam ou antecediam outras competições; e a forma como, mais uma vez, puderam jogar em campo neutro mais do que qualquer outro clube (Arouca, União, Tondela). 

Não há dúvida: é muito mais fácil ser-se treinador do Benfica do que de qualquer outro clube, com toda esta máquina a apoiar. Vieira aproveitou bem os anos de estágio que fez com Pinto da Costa, nos seus tempos de Alverca, numa altura em que o presidente portista estava no auge das suas capacidades, e conseguiu replicar com sucesso o modelo que deu ao Porto a hegemonia ao futebol português durante décadas, com as devidas adaptações para a realidade pós-Apito Dourado. Quantos pontos terá valido esta máquina bem oleada de Vieira? Não sei responder, mas tenho a certeza de que terão sido muito mais do que os dois pontos com que o Benfica "de Vitória" superou o Sporting de Jesus. Foi aí que esteve o segredo da conquista que se consumou ontem.

Parabéns à estrutura!