sexta-feira, 4 de novembro de 2016

As contas dos três grandes

Finalmente, já se pode fazer uma comparação entre os relatórios anuais de Sporting, Benfica e Porto. Comecemos pelos proveitos operacionais:


À semelhança do que já se verificava na época anterior, pode-se concluir que o Sporting consegue ter números idênticos aos de Benfica e Porto naquilo que depende diretamente dos adeptos, mas continua a uma grande distância na capacidade de atrair a Alvalade o mundo empresarial.
  • Direitos TV: o Sporting conseguiu um aumento significativo graças aos 8 milhões adicionais que passaram a entrar anualmente, graças à renegociação do contrato com a PPTV. Na próxima época, os números deverão subir graças ao market pool da Liga dos Campeões. O Benfica registou uma ligeira quebra de receitas da BTV em relação à época anterior. Apesar de, neste gráfico, os valores recebidos pelo Benfica serem muito superiores, há que considerar que, para uma comparação correta, seria necessário subtrair todos os custos de funcionamento da BTV - coisa que não é discriminada no relatório do Benfica. Com base nos últimos números que foram tornados públicos, é bastante provável que o Sporting tenha sido o clube, dos três, que maior lucro conseguiu nesta rubrica.
  • Bilhetes de época: depois de um aumento de 40% na época anterior, as receitas com bilhetes de época voltou a aumentar, desta vez em 16%. O abrandamento do crescimento tem, no entanto, uma atenuante: o preço das Gameboxes baixou significativamente em relação à temporada anterior por não incluir jogos da fase de grupos da Champions. O Sporting continua a ser o clube que mais dinheiro fez em lugares de época. É previsível que, em 2016/17, as receitas de bilhetes de época voltem a subir bastante: não só o número de Gameboxes vendidas subiu, como o preço unitário também aumentou.
  • Bilheteira: apesar de ter registado um recorde de assistência média, o Sporting teve apenas um aumento ligeiro ao nível da bilheteira, devido à não qualificação para a fase de grupos da Liga dos Campeões. Ao nível da Liga, o valor dos bilhetes aumentou 40% em relação à época anterior. O Benfica foi, como se esperava, a equipa que mais dinheiro fez, graças ao recorde de assistências para a Liga e às receitas extra alcançadas nas eliminatórias com Zenit e Bayern.
  • Merchandising: o Benfica é a equipa que mais dinheiro faz nesta categoria. Note-se, no entanto, que as receitas de merchandising pertencem ao clube, e não à SAD benfiquista. Apenas coloquei aqui os valores para haver um termo de comparação. Quanto ao Sporting, é importante assinalar um aumento de 150% em relação à época anterior, sinal de que havia um enorme sub-aproveitamento na exploração desta vertente comercial, que começa agora a ser corrigido.
  • Camarotes e Business Seats: apesar de ter aumentado as suas receitas corporate em 15%, o Sporting continua a uma grande distância dos seus rivais. Há muito trabalho a fazer nesta área.
  • Patrocínios e publicidade: as receitas do Sporting caíram ligeiramente devido ao facto de ter estado um semestre sem patrocínio nas camisolas e por ter perdido o patrocínio de duas bancadas. O Porto teve um problema idêntico, mas ainda assim conseguiu subir ligeiramente em relação à época anterior. O Benfica continua a ser o clube mais capaz de atrair patrocinadores, mas, na próxima época, com os contratos de patrocínio de camisolas a tempo inteiro, Sporting e Porto aproximar-se-ão significativamente.
  • Prémios UEFA: a vantagem do Benfica é avassaladora, graças à excelente carreira na Liga dos Campeões. O Sporting viu as suas receitas serem reduzidas devido à derrota na eliminatória contra o CSKA.

Quanto aos custos operacionais, o Sporting quase que duplicou os gastos com pessoal, mas continua a ser o clube que menos gasta com salários. Ao nível dos FSE's (contratação de serviços, deslocações e estadias, comissões, gastos com publicidade e propaganda, honorários, etc.), o Sporting é, de longe, o clube que menos gasta.


Um dos pontos fulcrais passa pela realização de mais-valias na transferência de jogadores. Os números apresentados pelos clubes foram os seguintes:


O Sporting teve números extremamente baixos, pois acabou por realizar as suas principais vendas já no exercício de 2016/17. O Benfica conseguiu os melhores números, graças às vendas de Renato Sanches, Gaitán, Ivan Cavaleiro e Lima. Como é óbvio, os negócios de Gaitán e Ivan Cavaleiro levantam grandes pontos de interrogação, no que à circulação real de dinheiro diz respeito. Serviram, no entanto, para ajudar a empolar as receitas imediatas.

Uma coisa se mantém: todos os clubes teriam apresentado resultados negativos se não fossem as mais-valias realizadas com a transferência de jogadores. Essa necessidade de venda de jogadores é bastante mais acentuada em Benfica e Porto. O Sporting, ao aumentar significativamente a sua massa salarial, e ao falhar o apuramento para a Champions, viu essa dependência crescer em relação aos dois primeiros anos de mandato de Bruno de Carvalho. É muito provável que, em 2016/17, essa dependência volte a descer para os níveis iniciais, sobretudo devido à participação na Champions e ao aumento das receitas de publicidade.


Nota: no quadro acima retirei os cerca de 15 milhões de prejuízo extraordinário devido à provisão criada por causa do processo Rojo.

Para concluir, observemos os números do endividamento bancário e obrigacionista:


Apesar do lucro acentuado do Benfica e do prejuízo acentuado do Sporting, os níveis de endividamento mantiveram-se estáveis. O mesmo não se pode dizer do Porto, que aumentou os empréstimos em cerca de 10%. A tendência de crescimento da dívida do Porto é preocupante: praticamente que duplicou em apenas três anos (de notar que, pelo meio, o estádio passou a ser considerado nas contas, o que ajudou a este aumento - no entanto, o estádio não é, nem de perto nem de longe, o principal responsável por esta subida). 

Fazendo uma projeção para as contas de 2016/17 do Sporting, o apuramento para a Liga dos Campeões, a recuperação do patrocínio das camisolas (que estimo valer entre 7,5 e 8 milhões anuais) e as vendas de Slimani e João Mário (que deram mais-valias de 54 milhões de euros) deverão contribuir para um lucro recorde da SAD, que superará largamente o prejuízo da época que terminou.

O Benfica, sendo o clube com fontes de receitas mais diversificadas, continua a ter uma estrutura de custos pesadíssima para manter a máquina a funcionar. Mantém uma grande dependência da venda de atletas para equilibrar as contas, sendo que, todos os anos, parte significativa dessas vendas é feita através do carrossel Mendes. Se calhar isso ajuda a explicar o facto de, apesar dos anos sucessivos de vendas recorde e de lucro no final dos exercícios, não se observar uma redução do endividamento.

O Porto tem, neste momento, o pior de dois mundos: apresenta receitas ao nível do Sporting e custos ao nível do Benfica, pelo que fica excessivamente dependente do sucesso desportivo e da valorização de jogadores. A situação financeira degradou-se significativamente nos últimos três anos, que coincide, precisamente, com o período de fracasso desportivo. É óbvio para todos que a SAD necessita de rever a sua estratégia. O dinheiro do contrato televisivo da Meo veio dar um novo fôlego financeiro e permitirá que se mantenham determinados vícios nos próximos anos, mas não é inesgotável.