quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O Sporting e a comunicação

Um assunto que tem sido muito discutido entre os sportinguistas (e também por adeptos de outros clubes) nos últimos tempos é a estratégia de comunicação do clube. Não sou um especialista na área da comunicação e não tenho pretensões de dar lições a quem quer que seja, mas, enquanto recetor dessa estratégia, posso partilhar a minha perceção sobre o que está a ser feito e os resultados que estão a ser obtidos.

Desde que Bruno de Carvalho tomou posse como presidente do Sporting, tem-se pautado por uma postura frontal e agressiva em relação a tudo aquilo que considera ser importante denunciar. É uma figura que nunca se esconde e que (pelo menos até há pouco tempo) raramente deixa que sejam outros a falar por si, não hesitando em usar os vários meios que tem à sua disposição para passar a sua mensagem: entrevistas na televisão (generalista, de informação ou no canal do clube), na rádio ou nos jornais, posts no Facebook, conferências de imprensa ou, ainda, aproveitando eventos a que comparece para conversas mais curtas na comunicação social.

No princípio desta época, notou-se um abrandamento das intervenções públicas de Bruno de Carvalho. Isso pode ter-se devido a três motivos: considerou que não havia motivos para falar/escrever; decidiu resguardar a sua imagem à entrada de uma época em que se realizarão eleições no clube; e pela entrada de Nuno Saraiva para Diretor de Comunicação, que passou a fazer parte das despesas de guerrilha em lugar do presidente.


O Sporting e o setor da arbitragem: da trégua inicial ao regresso à normalidade

Houve, também, uma mudança estratégica evidente no relacionamento com a arbitragem. A mudança de responsáveis do CA deixou o Sporting numa atitude de expetativa em relação à eficácia das medidas implementadas para combater os efeitos dos desastrosos mandatos de Vítor Pereira. O bom-senso inicial revelado nos critérios de nomeação ajudou a construir uma boa imagem inicial deste CA. Infelizmente, o quadro de árbitros continua o mesmo, e foi uma questão de tempo para a dualidade de critérios e a influência nos resultados regressarem em força. Convém relembrar que o Sporting não criticou publicamente a escandalosa arbitragem de Artur Soares Dias em Guimarães (que nos custou dois pontos), nem a atuação de Vasco Santos na Choupana (que nos poderá ter custado mais dois pontos). No entanto, as más arbitragens voltaram a ser uma constante, com os suspeitos do costume a saírem sistematicamente prejudicados. Creio que faltará apenas uma coisa para o Sporting voltar ao estado de guerra aberta com o setor de arbitragem: uma não revisão da escandalosa nota dada a Jorge Sousa no último dérbi. Se não for revista, será sinal evidente que estão a brincar com o Sporting, e é previsível que termine em definitivo o benefício da dúvida dado a este CA.

Há sportinguistas que criticam que o clube aponte baterias ao setor da arbitragem (ou aos seus rivais), por acharem que nos devemos concentrar exclusivamente nos nossos próprios problemas. Não concordo com quem pensa assim, porque uma coisa não condiciona a outra, e a atual fase por que passa o clube é um bom exemplo disso: há apostas desportivas falhadas, com certeza, mas o clube tem sido empurrado para baixo pelas más arbitragens. Outros há que dispõem de (muito) mais margem para errar, mas o Sporting joga sempre no limite do risco. Se marca apenas um golo, está sujeito a que este seja anulado. Se o adversário mete um braço na bola, tem boas possibilidades de que os árbitros considerem o lance casual. 

As (más) arbitragens têm uma influência enorme no desenrolar das épocas. Num longo campeonato em que a regularidade é um fator essencial, não há clube que consiga manter níveis de competitividade constantemente perfeitos. Todos têm momentos maus. Mas, num caso, há a mão que ampara a queda. Noutro (ou noutros, como preferirem), há a mão que está pronta a provocar a queda. E sabemos que dois ou três insucessos acumulados em pouco tempo podem ser suficientes para que se coloque em causa todo o projeto desportivo.

Como tal, considero que o presidente faz MUITO BEM em denunciar publicamente as movimentações que existem para tentar prejudicar o Sporting e beneficiar outros à margem das regras. Alguém acha que fazer de conta que o problema não existe vai solucionar o quer que seja? Se até quem manda no futebol português rasga as vestes assim que se sente minimamente prejudicado (vide Vieira pós-Setúbal e a campanha antiantijogo pós-Márítimo), por que razão não haveria o Sporting, que tem razões de queixa incomparavelmente superiores, de fazer o mesmo?


Comunicação em quantidade, mas terá qualidade?

No entanto, concordo com uma crítica que muitos apontam à forma como o Sporting comunica: deve haver mais objetividade e critério nos momentos em que se fala. O problema de se falar e escrever muito é que rapidamente as pessoas se saturam e deixam de prestar atenção. Doseando as intervenções para quando há conteúdo relevante, e mantendo-as concisas e claras, o impacto será sempre muito superior. Infelizmente, não tem sido essa a tendência seguida pelos principais responsáveis do Sporting. 

Também não sei se ajuda falar tanta gente ao mesmo tempo: após a derrota com o Benfica, falaram, no espaço de 12 horas, Jesus, Octávio, Saraiva, Marta Soares e Bruno de Carvalho. Não será contraproducente ter tantas pessoas a abordarem o mesmo assunto, cada qual com os seus argumentos?

Para além disso, não faz sentido que o presidente ou o diretor de comunicação do Sporting estejam constantemente a reagir às criações dos paineleiros dos outros clubes. São pessoas a que ninguém dá credibilidade, pelo que qualquer reação sportinguista deveria ter outras origens - seja pelos representantes dos clubes nesses programas, seja nas redes sociais ou em blogues, que, costumam desmontar rapidamente as mentiras dos Guerras e Venturas da vida. Muito pior é haver resposta de pessoas com responsabilidade do clube: ao fazerem-no, estão apenas a dar-lhes protagonismo que não merecem. Ao mesmo tempo, desgasta-se a comunicação do Sporting, queimando munições que deveriam ficar reservadas para assuntos realmente importantes. 


O Sporting e os media

É evidente que é muito mais difícil para o Sporting não usar canais oficiais para passar a sua mensagem. Vieira não necessita de falar porque tem quem faça o trabalho sujo por ele: paineleiros sem qualquer respeito próprio, capazes de fazer as piores figuras e de mentir descaradamente; diretores e subdiretores de jornais disponíveis para contorcer as suas opiniões e ajustar os critérios editoriais das suas publicações em função das necessidades; canais de televisão e estações de rádio inundados de comentadores supostamente isentos, mas que estão sempre prontos a colocar na agenda os temas que convêm ao Benfica.

O Sporting ainda não encontrou antídoto para a bandalheira que se assiste diariamente na comunicação social desportiva deste país. Mas o pior é que parece não haver um plano coerente para obrigar a comunicação social a respeitar o clube. Ao longo destes anos, têm sido várias as tentativas de aproximação a um determinado órgão ou grupo de comunicação social, mas que acabam, invariavelmente, por não produzir resultados. Foi penoso (para mim), na semana passada, ver Bruno de Carvalho dar uma entrevista exclusiva à CMTV, o maior esgoto noticioso nacional, onde se dá palco a Venturas, Janelas, Figueiredos e Antunes. Como é uma questão de tempo até o Sporting ser enxovalhado pelo grupo Cofina, para quem se virará a seguir Bruno de Carvalho? Para a TVI de Moniz, que já conseguiu fazer edições do MaisTabaco com um cast totalmente vermelho (Braz, Aguilar, Diamantino e Rola)? Ao jornal A Bola, dos inenarráveis Serpa, Delgado e Fernando Guerra? Ao MaisFutebol, onde se fazem posts destes...


... posteriormente corrigidos, mas sem que o diretor, em conversas no Twitter, fosse capaz de admitir qualquer tipo de atitude incorreta por parte do seu site?

Não acho que os boicotes sejam eficazes, mas que tal, por exemplo, deixarmos de responder a perguntas dos órgãos de comunicação social que nos desrespeitam - seja nas conferências de imprensa de Jesus, seja em declarações nas zonas mistas, ou onde quer que seja? É do jornal X? Então não respondo. Não seria nenhuma inovação: ainda recentemente, Jurgen Klopp disse que deixaria de responder a jornalistas do The Sun. Tenho ideia de que aconteceu o mesmo em Itália há poucas semanas.


Se por acaso os media tomarem uma ação conjunta em reação a essa posição do Sporting - normalmente só têm coragem para as tomar connosco -, passemos a usar exclusivamente os canais do clube: Sporting TV, Jornal Sporting, site e redes sociais. Como referi no princípio, não sou um especialista na matéria, mas será que haveria uma perda de eficácia assim tão grande da comunicação sportinguista se deixássemos de recorrer à comunicação social tradicional? Será que a comunicação social não precisará mais do Sporting do que o Sporting precisa da comunicação social? Não é o Sporting que precisa de cliques, de vender jornais e de audiências para sobreviver.