sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Conceição, Casillas, Sá, Vitória e Svilar

Os jogos de Porto e Benfica para a Liga dos Campeões lançaram a discussão sobre as apostas que os respetivos treinadores fizeram para a baliza: Sérgio Conceição, sem que nada o fizesse prever, colocou Casillas no banco e lançou José Sá na Alemanha; Rui Vitória, não tão surpreendentemente, deu a Svilar a estreia na Luz contra o Manchester United, tornando o belga o mais jovem guarda-redes a alinhar na história da Liga dos Campeões.

No entanto, apesar do que se possa ter dito num dos casos, ambas as apostas correram mal. Os dois guarda-redes tiveram culpas num golo dos seus adversários, golos esses que acabaram por ser determinantes no desfecho dos dois encontros.

Duas decisões polémicas, por motivos diferentes.


Conceição, Casillas e Sá

No caso de José Sá, a surpresa foi total porque Casillas tem estado a fazer boas exibições. Depois de uma primeira época irregular em que custou vários pontos à sua equipa, o veterano guarda-redes espanhol subiu de rendimento na época passada e estava a manter a bitola elevada na atual. Com exceção de um dos golos sofridos contra o Besiktas, não havia nada a apontar às suas exibições. A opção de Sérgio Conceição em tirá-lo do onze num jogo da Liga dos Campeões ainda mais estranha fica se olharmos para o perfil do jogador que o substituiu. Na minha opinião, José Sá não é um guarda-redes com potencial para vir a ser titular absoluto numa equipa com as ambições do Porto: aos 24 anos, tem apenas 17 partidas disputadas na I Liga. Muito pouco, mesmo considerando que os parâmetros de evolução de um guarda-redes são diferentes dos que se aplicam aos jogadores de campo.

Nenhum treinador, no seu perfeito juízo, tomaria uma decisão destas por questões meramente técnicas. É legítimo que se as pessoas se questionem se terá havido algum problema disciplinar na origem da saída de Casillas do onze. Não havendo, as alternativas que sobrariam não seriam propriamente abonatórias para Conceição: ou excesso de confiança, a querer sacar novo coelho da cartola (um pouco à imagem do que fez com Sérgio Oliveira) num jogo de grande visibilidade; ou um capricho, aproveitando o momento de popularidade adquirida (muito justamente) entre os adeptos portistas para retirar um jogador que, por algum motivo, não aprecia.

O Jogo refere na sua edição de hoje que, na base desta decisão, está a insatisfação da equipa técnica pela falta de empenho nos treinos e pelo uso indevido do telemóvel. Pelo que me diz alguém bem informado, o que O Jogo escreveu é um eufemismo para o que realmente se está a passar: Casillas tem, ao que parece, uma atitude permanente de prima donna - das quais a falta de empenho nos treinos e nos estágios é um dos exemplos -, e já usou o telemóvel para fazer lives do autocarro da equipa numa altura em que as convocatórias ainda não eram do conhecimento público. Algo mais ou menos na linha da postura que tinha quando ainda jogava no Real Madrid:


Para tomar uma decisão desta importância, pode-se concluir que Conceição vê em Casillas uma ameaça para a coesão do grupo e para a continuidade da boa época que a equipa tem feito. A pergunta que se pode colocar perante isto é: será uma decisão justa ou é excesso de zelo por parte do treinador, considerando a importância que Casillas tem tido? E até que ponto o afastamento do guarda-redes espanhol poderá vir a revelar-se contraproducente dentro de campo?


Vitória e Svilar

Em relação a Svilar, a opção é menos difícil de compreender se considerarmos que Varela parece ter caído em desgraça (a forma como Rui Vitória o descartou após o erro do Bessa é muito discutível, ao passá-lo diretamente de titular para não convocado) e que Júlio César parece estar cada vez mais afastado do nível que o celebrizou. 

Rui Vitória diz que foi uma opção ponderada, mas não sei até que ponto isso é verdade, porque conhece-se a sua apetência para lançar jovens na sequência de maus resultados: em anos anteriores acertou no jackpot com Renato e fracassou com Clésio, enquanto esta época já lançou Rúben Dias após a derrota com o CSKA. Esta semana foi a vez de Svilar e Diogo Gonçalves. Sinceramente, dá mais ideia de os estar a usar como uma espécie de escudos humanos, que aumentam a tolerância ao inêxito junto dos adeptos, do que algo realmente pensado e que proteja os interesses da equipa e dos próprios jogadores.

Se o Benfica vê em Svilar potencial para vir a ser um guarda-redes de top mundial, é normal que, perante a falta atual de concorrência, se sinta tentado a antecipar a sua utilização. Agora, uma coisa é ir lançando o jogador em partidas em que tenha alguma margem para errar (nada a dizer na sua utilização contra o Olhanense, como nada haveria a dizer em jogos da Liga em casa contra as equipas teoricamente mais fracas), outra é atirá-lo às feras de forma tão repentina. Às vezes corre bem, outras vezes corre mal. Na quarta-feira correu mal.

As palavras que Mourinho dirigiu ao jovem guarda-redes foram simpáticas, mas parvo é coisa que o treinador do Manchester United não é:


O Benfica parece estar a querer utilizar em Svilar fórmulas bem sucedidas no passada: acreditam que têm em Svilar um novo Oblak/Ederson, e estão a aplicar-lhe o marketing usado com Renato. O problema é que cada caso é um caso: Oblak e Ederson já tinham 3 ou 4 anos de sénior, a jogar noutras equipas, antes de assumirem a titularidade no Benfica; e Renato Sanches ocupava uma zona do terreno em que os erros não se pagam tão caro.

Ainda assim, tomando como verdadeiro o potencial que Svilar parece ter, ao menos será um investimento que, mais cedo ou mais tarde, dará frutos - já sobre o Porto e Sá não se poderá dizer o mesmo.

Acredito, por isso, que o Benfica aposte de forma consistente no belga, pelo menos até janeiro - altura em que entra Vlachodimos. Resta saber se Svilar conseguirá corresponder às expectativas criadas no tempo de jogo que entretanto lhe será dado. Mesmo que não corra tão bem quanto os responsáveis pelo clube desejam, não haverá um tratamento idêntico a Varela, porque Varela nunca foi visto como o futuro da baliza benfiquista, e apenas ficou no plantel porque a contratação de Hradecky falhou. A margem de progressão e os ganhos que o Benfica poderá vir a ter com o jogador não estão em causa, mas é, sem dúvida, uma jogada de risco num ano em que o 3º classificado não entra na Liga dos Campeões.