segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Luís Sobral e o jornalismo desportivo cor-de-rosa

Luís Sobral não gostou das declarações de Bruno de Carvalho no final do Sporting - Nacional. Tanto não gostou, que dedicou ao presidente do Sporting um artigo no seu espaço sobe / desce no Maisfutebol. Na zona do desce, como devem calcular.

Neste artigo, perde alguns parágrafos a elogiar o bom trabalho que Bruno de Carvalho fez para levantar o clube. Mas depois avança para o essencial:

"Percebe-se que a primeira fase era esta, estancar a dor, organizar, equilibrar. Por esta altura talvez já se esperasse um pouco mais sobre o que deve seguir-se. Menos sportinguismo de almoço e mais explicação sobre o que se pretende. Apostar na Academia, dar tempo aos mais jovens, eventualmente não voltar a ter, nos próximos anos, como objetivo ser campeão? Será isto mais um ano, três, dez?"

"Além deste Bruno de Carvalho, que dirige, até ver muito bem, o clube, há o outro, o que se senta no banco."

"Esse Bruno de Carvalho, o adepto, é o que festeja os golos e abraça dos jogadores no final dos jogos felizes. Ou dirige-se aos árbitros quando as coisas não saem bem. Foi assim na Luz, voltou a ver-se este sábado, depois do empate em Alvalade"

"A presença de Bruno de Carvalho no banco é uma exceção a essa regra. Uma exceção perigosa, do meu ponto de vista. O exemplo que deu no final do dois jogos referidos foi muito mau. Face à forma de dirigir populista que adotou desde o início, este tipo de comportamento poderá um dia ter consequências muito negativas."

"Quem pensa como adepto não sente sequer a necessidade de propor algo que ajude a melhorar o que critica. Os adeptos só querem duas coisas: ganhar ou, em caso de frustração, encontrar rapidmente um culpado para o desaire. Deve ser por isso que Bruno de Carvalho ainda não conseguiu tempo para apresentar um documento com ideias que ajudem a melhorar o futebol português."

"NOTA: quando oiço discursos como o de Bruno de Carvalho depois do jogo com o Nacional tenho vergonha do futebol português. Na verdade, nada disto é novo. Só mudam os nomes. Hoje Bruno, ontem Luís, Jorge, João, Pimenta, Bartolomeu, Valentim. Coisa triste e lamentável esta."

Antes de comentar este texto, devo começar por dizer que respeito a opção de Luís Sobral e do Maisfutebol não relevarem o peso dos erros de arbitragem nos jogos e evitarem a discussão sobre a influência que esses mesmos erros acabam por ter na verdade desportiva em Portugal. Tanto quanto me lembro, jornalista e site desportivo têm tido uma postura coerente ao longo dos anos, independentemente do clube queixoso.

Para além disso, acho que a qualidade do Maisfutebol é superior à dos jornais desportivos diários. Talvez por não terem uma pressão para vender semelhante, raramente dão importância a especulações de transferências, não alimentam polémicas onde elas não existem, e fazem por manter uma equidistância saudável dos três grandes.


A crítica de Luís Sobral a Bruno de Carvalho

O presidente do Sporting tem uma missão muito difícil pela frente. É que não basta a tarefa hercúlea de levantar o clube e dar continuidade ao saneamento financeiro sem comprometer as aspirações desportivas, como aparentemente, lendo o que Luís Sobral escreveu, tem que:
  • explicar o que pretende para o Sporting no próximo um, três, dez anos;
  • aprender a não festejar os golos da sua equipa ou abraçar os jogadores no final dos jogos;
  • arranjar tempo para apresentar um documento com ideias que ajudem a melhorar o futebol português;
  • perceber como, em 8 meses, já consegue entrar numa galeria de dirigentes notáveis como Pimenta Machado, João Bartolomeu e Valentim Loureiro.

Não me parece que estas quatro observações de Luís Sobral façam algum sentido. Dizer o que pretende para o Sporting nos próximos 10 anos seria algo inédito para alguém que tem um mandato de 4 anos. Apresentar um documento com ideias para melhorar o futebol português quando não tem nenhum poder real na Liga e Federação seria uma perda de tempo e um motivo de chacota para quem realmente manda. E compará-lo a dirigentes apanhados nas escutas do apito dourado é um insulto. Curiosamente não incluiu Luís Filipe Vieira e Pinto da Costa nessa lista de dirigentes notáveis, também eles envolvidos no capítulo mais negro da história da bola indígena. Sobral mencionou um Luís e um Jorge, mas deve estar a referir-se a outras pessoas que pertencem ao ontem do dirigismo nacional.

No meio deste longo artigo, curiosamente conseguiu não fazer nenhum comentário à conferência de imprensa de Bruno de Carvalho, e muito menos à arbitragem escandalosa de Manuel Mota que esteve na origem da conferência de imprensa de Bruno de Carvalho.

É a política seguida por Luís Sobral e pelo Maisfutebol, e por outros comentadores da nossa praça como Luís Freitas Lobo e João Rosado. Preferem fingir que a podridão que grassa pelos estádios é uma coisa menor no meio desse mundo tão bonito que é o futebol português.


O jornalismo desportivo cor-de-rosa

Os ilustres nomes que acabei de referir representam uma espécie de jornalismo cor-de-rosa adaptado ao futebol. Os tais que, como Bruno de Carvalho bem refere, preferem ver tudo lindo e fabuloso. Tudo o que não se enquadre nesse mundo cor-de-rosa, faz-se de conta que não existe.

Falo daquele jornalismo que se desfaz em elogios à organização tática de equipas pequenas que jogam apenas para o empate, ao mesmo tempo que omitem o anti-jogo que praticam, a dureza aplicada sobre os verdadeiros artistas, e a colaboração nula para o espetáculo para o qual muitas pessoas pagaram para assistir. Por exemplo, na análise do Maisfutebol ao Sporting - Belenenses, que acabou com a vitória dos da casa por 3-0, podemos ler o seguinte:

A análise do Maisfutebol ao Belenenses no jogo contra o Sporting

A análise do Maisfutebol ao Sporting no jogo contra o Belenenses

A única equipa que tentou ganhar o jogo desafiou a paciência de um espetador isento de futebol. A outra equipa, que raramente saía do seu meio-campo e teve 0 oportunidades para marcar em todo o jogo, é fantástica.

Outro dos princípios do jornalismo desportivo cor-de-rosa passa por considerar o árbitro como uma figura decorativa que pouca influência tem no desfecho dos jogos. O jornalismo desportivo cor-de-rosa costuma até criticar com alguma superioridade moral aqueles que apontam o dedo aos árbitros pelos maus resultados em vez de olharem para os erros próprios. Esquecem-se no entanto estes jornalistas que muitas vezes os árbitros acabam por ser uma rede de segurança para os erros das equipas beneficiadas, que acabam por não serem penalizadas pelas suas falhas.

Se Luís Sobral fosse convidado por James Cameron para escrever o guião do filme "Titanic", teríamos uma bela história de amor sobre Jack e Rose, a bordo do maior navio construído até essa altura, que se afundaria nas águas frias do Atlântico sem que em algum momento aparecesse o embate com o iceberg.


Descubra as diferenças

Só para terminar, andei a ver como o Maisfutebol tratou os erros de arbitragem com possível influência no resultado dos jogos do Sporting. Note-se que não estou a comparar o tratamento dado ao Sporting em relação a Benfica a Porto, nem a colocar em causa a isenção do Maisfutebol.

Sporting - Benfica, golo de Montero, MF diz que há erro de arbitragem a beneficiar o Sporting

Olhanense - Sporting, golo de Montero, MF diz que há erro de arbitragem a beneficiar o Sporting

Sporting - Rio Ave, penalty não assinalado a favor do Sporting, MF não faz juízo de valor à decisão do árbitro

Sporting - Belenenses, penalty mal assinalado, MF diz que há erro de arbitragem a beneficiar o Sporting

Sporting - Nacional, golo mal invalidado a Slimani, MF não faz juízo de valor à decisão do árbitro

Benfica - Sporting para a Taça, penalty não assinalado, MF não faz juízo de valor à decisão do árbitro

Benfica - Sporting para a Taça, penalty não assinalado, MF diz que há erro de arbitragem a prejudicar o Sporting

Nos 3 lances em que o Sporting foi beneficiado, o Maisfutebol mencionou sempre o erro do árbitro de forma explícita. Dos 4 lances em que o Sporting foi prejudicado, só num é que o Maisfutebol entendeu fazer o mesmo.

Não percebo que critério é este, mas talvez deva ser revisto.