sexta-feira, 1 de agosto de 2014

O choque da saída de Dier

                                                                                                                                        
E afinal a história tinha mesmo um fundo verdadeiro. Demasiado verdadeiro. Dier vai à sua vida e deixa-nos com a novamente com o amargo sabor de vermos um jovem muito promissor da academia partir sem dar um proveito desportivo razoável ao clube que investiu anos no seu desenvolvimento. Não posso negar: fiquei profundamente desapontado quando ouvi a notícia no princípio da noite de ontem.

O facto de Dier estar a ser aposta de Marco Silva leva a crer que o clube contava com ele para a época que se avizinha, com fortes hipóteses de ser titular. No entanto, isso não era claramente suficiente para o jogador, caso contrário não teria saído.

Convenhamos: não foi nos últimos dois ou três meses que este desfecho ficou definido. O problema vinha de trás, desde que Bettencourt renovou com Dier permitindo que se incluísse no contrato uma cláusula com um preço de amigo para clubes ingleses. Isto iliba a atual direção de todas as responsabilidades? Não é possível saber, mas ano momento em que escrevo este texto, um pouco mais a frio, parece-me que Bruno de Carvalho não poderia fazer muito mais sem comprometer as reformas que está a realizar no Sporting.

Será que se Leonardo Jardim tivesse entregue a titularidade a Dier faria com que o jogador sentisse que era uma aposta forte e aceitasse renovar o contrato que incluísse uma cláusula que protegesse melhor os interesses do clube? Acho que não. Quanto mais tempo Dier jogasse, mais perto ficaria de despertar a atenção dos clubes ingleses, facto que seria certamente aproveitado pelo jogador e pelo pai.

Poderia Bruno de Carvalho oferecer um salário milionário a Dier, ao nível dos atletas mais bem pagos no Sporting? É evidente que não. Não só Dier nunca provou em campo merecer ganhar um salário a rondar um milhão de euros anuais, como isso seria um tiro no pé no esforço do clube em sanear as suas contas. O que diriam outros jogadores como Maurício, Rojo, William, Cédric, Jefferson, Montero, Slimani, André Martins e Carlos Mané perante a diferença de tratamento? Não nos podemos esquecer que o orçamento do clube é de €25M. A questão salarial tem que ser gerida com pinças de forma a não comprometer aquilo que ficou acordado com os nossos credores.

O maior pecado de Bruno de Carvalho em todo este processo acaba por ser as declarações que fez no dia anterior, ao dizer que não existiam propostas por jogadores do Sporting. Não acredito que não soubesse que o Tottenham estivesse na iminência de bater a cláusula. Tecnicamente o Tottenham não fez nenhuma proposta, é verdade. Uma proposta tem o atributo de poder ser aceite ou ser recusada pela entidade que a recebe. Neste caso, o Sporting não tinha o poder de aceitar ou deixar de aceitar. Mas Bruno de Carvalho devia ter-nos preparado de alguma forma para esta notícia, em vez de negar a existência de quaisquer propostas.

Para os adeptos que estiverem furiosos com este desfecho, recomendo que direcionem esses sentimentos para os grandes responsáveis por esta situação, que felizmente já não estão no Sporting, mas cujo legado se fará sentir durante pelo menos mais 5 anos. Falo da gente que hipotecou de forma inaceitável o futuro do clube ao não acautelarem devidamente os interesses do Sporting nos contratos assinados com os jogadores, e ao alienar por valores irrisórios percentagens significativas dos passes de jogadores formados em Alcochete: Adrien Silva (70% cedidos a terceiros), André Martins (70%), Bruma (50%), Cédric (50%), Rui Patrício (35%), William Carvalho (40%), Wilson Eduardo (70%), Chaby (52,5%), Ponde (25%), João Mário (40%), Tobias Figueiredo (50%), Betinho (5%), Nuno Reis (15%), Renato Neto (40%). E este episódio prova que a política de contratos de longa duração com cláusulas proibitivas para os jovens da academia faz todo o sentido.

Quanto a Dier, desejo-lhe felicidades para a sua carreira. Ao contrário de Bruma e Ilori, foi sempre um excelente profissional, mesmo quando não foi opção para o onze durante uma grande parte da época passada. Não amuou, não fez qualquer tipo de chantagem, e sai do clube utilizando um direito que contratualmente lhe assistia.

A vida continua, e é com quem fica que temos que contar. Sem Dier, passa a ser fundamental a manutenção de Marcos Rojo, a bem das ambições da nossa equipa. Nenhum dos centrais que entraram para o plantel principal estão ainda em condições de serem titulares numa equipa que quer vencer o campeonato e vai participar na Liga dos Campeões.