quinta-feira, 14 de maio de 2015

De leitura obrigatória

O jornalista italiano Pippo Russo tem escrito para o Calciomercato uma série de artigos sobre os fundos, certamente provocado pelas notícias do interesse da Doyen na aquisição do AC Milan. Hoje publicou um artigo dedicado à luta que o Sporting tem levado a cabo contra os fundos. O original pode ser lido AQUI. O idioma italiano não é propriamente o meu forte, mas tentei traduzir o melhor que consegui.

O artigo é de um jornalista e de uma publicação cuja opinião é totalmente insuspeita, e é de leitura obrigatória - e em particular os últimos dois parágrafos.

Nota: as partes a negrito e os links do texto foram colocados pelo próprio autor.




Sporting vs. TPO: não te pago!


Somos todos sportinguistas. Devíamos ser. Não só pela simpatia que o Sporting levanta, devido ao facto de ser uma das maiores fábricas de talento do futebol europeu. Devemos estar ao lado dos Leões porque desde agosto do ano passado são a vanguarda da batalha contra os fundos de investimento. O primeiro e, até agora, único clube que teve a força de dizer basta à invasão do turbocapitalismo financeiro no futebol.

É uma batalha promovida pelo jovem presidente Bruno de Carvalho, eleito no verão de 2013. Uma personagem de sangue na guelra, populista, e que frequentemente pisa os limites no campo da comunicação pública. Tanto é assim que alguns dos seus disparos em redes sociais causaram grandes divergências com a equipa e com o treinador Marco Silva, cuja demissão chegou a parecer certa num determinado momento da época. Mas existe um ponto em que Bruno de Carvalho está a conduzir uma guerra santa com o apoio unânime da comunidade sportinguista: a guerra contra os fundos e investidores privados.

Ao assumir o cargo, o presidente foi forçado a enfrentar uma situação económica e financeira pesada, herdada do antecessor Luis Godinho Lopes. Essa situação resultou numa recente multa imposta pela UEFA pelo não cumprimento das regras de Fair Play Financeiro: reduzir para 22 o número de jogadores inscritos nas competições da UEFA, e uma multa de 2 milhões de euros, suspensa condicionalmente por um ano.

Uma punição bastante branda, que pode ser lida como uma decisão política da UEFA em premiar o percurso desta direção que, desde que entrou em funções, tem trabalhado para recuperar o clube, mas que sobretudo teve a força de colidir frontalmente com um dos atores mais poderosos e arrogantes da economia paralela do futebol mundial: a Doyen Sports Investments. As suas relações com o clube verde e branco são outra péssima herança da gestão de Godinho Lopes.

A história começou em agosto passado, e explodiu durante o processo de transferência de Marcos Rojo, defesa da seleção argentina, que depois de ter terminado o mundial como vice-campeão puxou a corda para ser transferido. Pode ler aqui uma reconstrução detalhada das razões que levaram à explosão do conflito entre o Sporting e a Doyen. Recapitulando brevemente, o que aconteceu foi que o clube verde e branco concluiu que a atitude do jogador foi motivada por pressões do fundo, proprietário de 75% dos seus direitos económicos. Em seguida, Bruno de Carvalho escolheu ir para o confronto. E depois de vender Rojo ao Manchester United por 20 milhões decidiu não entregar 75% desse montante ao fundo. Verificou-se apenas a devolução dos 3 milhões do investimento inicial. Isto resultou num processo no TAS em Lausanne, que em junho irá decidir da legitimidade das exigências de Doyen, que reivindica ter direito aos seus 75%  - não sobre os 20 milhões, mas sim sobre 25. O fundo deve somar o valor do empréstimo de Nani do Manchester United ao Sporting, incluída como parte do negócio.  E no contexto das manobras preparatórias de julgamento no TAS, é conhecida a notícia de que a Doyen terá do seu lado Benfica e Porto. Estes clubes, fortemente ligados ao fundo de Malta, vão testemunhar sobre a honorabilidade de Doyen. Como se sabe, as pessoas de honra conseguem sempre entender-se.

Enquanto espera para saber como vai terminar o caso no TAS, o Sporting vai abrir uma nova frente de batalha com o mundo dos TPO. Desta vez, o jogador sobre o qual se prepara para explodir um novo conflito é o peruano André Carrillo, cujos direitos económicos estão nas mãos de um dos empresários mais poderosos do futebol mundial: o israelita Pini Zahavi. Carrillo tem uma cláusula de 30 milhões de euros, mas Bruno de Carvalho já deixou claro que o vende por 15 milhões. Para Zahavi seria um gigantesco negócio, porque tem em em sua posse 50% a partir de um investimento de 800 mil Euros. Então, se o negócio fosse concluído por um montante de 15 milhões, ele colocaria ao bolso 7,5. Ou seja, o valor do investimento seria aumentado quase dez vezes. E com que mérito? Por ter feito alguma coisa? Mais uma vez, trata-se de uma valorização económica e financeira que foi produzida pelo futebol. Designadamente, foi o Sporting que transformou um jogador de futebol de 1,6 milhões num valor de mercado de pelo menos 15 milhões de euros. E fê-lo confiando no jogador, educando-o, apostando nele ao invés de outros, e finalmente tornando-o conhecido no mundo graças à sua participação em competições nacionais e europeias. E depois de tudo isso, vemos chegar um Pini Zahavi para amealhar metade do saque, apenas por ter investido há uns anos atrás. Levando para fora do futebol um valor produzido exclusivamente pelo futebol. Parece ser uma coisa saudável? Para mim e para o Calciomercato.com, não. E, felizmente, também não é para este novo Sporting, que mandou dizer a Pini Zahavi que nada lhe será devido em caso de transferência de Carrillo para além da devolução dos 800 mil Euros do investimento inicial  

Zahavi já anunciou que vai levar o Sporting a tribunal. E nós estaremos prontos para torcer pelos verdes e brancos, e para testemunhar sempre que pudermos que a única honra que existe neste processo é aquela que procura esvaziar a água do tanque onde nadam os tubarões do turbocapitalismo do futebol. Força Leões!