quarta-feira, 16 de setembro de 2015

A cartilha III, ou "Agora imaginem se não estivéssemos no topo da classificação"

Se me perguntassem para escolher apenas um critério para separar um jornalista / comentador desportivo sério de um que não o seja, provavelmente indicaria as tendências que revelam na forma como interpretam os factos em função do clube em análise.

Deixo-vos um exemplo: a forma como Rui Pedro Braz, um dos mais badalados opinion makers da nossa praça, costuma comentar as notícias de contratações falhadas de um jogador pretendido por Benfica ou Sporting. Se é o Sporting que falha, a explicação tradicionalmente dada é que não houve argumentos para convencer o jogador a rumar a Alvalade. Se é o Benfica, normalmente é porque Luís Filipe Vieira considerou que o jogador era muito caro e que existem melhores alternativas no mercado. Nuances argumentativas que acabam por trazer consigo um julgamento subjacente à ação dos protagonistas: um não tem capacidade para impedir o fracasso, o outro é sensato por não entrar em loucuras por um jogador.

A mesma coisa pode ser aplicada aos números e estatísticas apresentadas por uma equipa. É normal que cada um de nós, enquanto adeptos, prefira ver a realidade pelo prisma que mais lhe interessa, mas isso não se deveria aplicar a jornalistas. Jornalistas, por princípio, deveriam manter-se equidistantes em relação aos clubes que comentam. 


No entanto, não é a isso que assistimos diariamente. E não há órgão de comunicação social com um uso mais enviesado dos números que o jornal O Jogo, capaz de encontrar uma luz radiante em qualquer banalidade que envolva o Porto, mas sempre pronto a escarafunchar nos aspetos menos positivos das atuações de Sporting e Benfica. O exemplo mais recente é o aviso que podem ver à direita, feito na capa da vitória do Sporting em Vila do Conde.  

Sim, o Sporting sofre golos há seis partidas consecutivas. Mas por acaso o do Tondela foi marcado com a mão e em fora-de-jogo, o da Académica nasceu de um penálti inexistente, e o do Rio Ave teve origem num fora-de-jogo que ficou por assinalar. Ou seja, não havendo esses erros poderíamos estar hoje a elogiar a competência do setor defensivo do Sporting que apenas teria sofrido 1 golo num total de 5 partidas de competições nacionais. "Poderíamos" nós, os sportinguistas, porque jornalistas destes conseguem sempre arranjar outro foco menos positivo para centrar as suas atenções.

Mas nesta muy nobre e popular atividade de desencantar cenários catastróficos para o futuro do Sporting, creio que não haverá em Portugal figura tão experiente e brilhante como o decano jornalista Ribeiro Cristóvão, o homem que um dia disse temer que o Sporting poderia envergonhar o futebol português na eliminatória com o Manchester City. No passado domingo, enquanto comentava a vitória do Sporting em casa do Rio Ave, mostrou que ainda está em forma:

(obrigado, Mário!)

Quem o ouça a falar de jogadores que não estão a corresponder às expetativas e a afirmar com um ar preocupado que ainda nada está perdido, nunca imaginaria que o Sporting está no topo da classificação e que já venceu um título ao derrotar o atual campeão nacional.

Agora pensem o que se diria e escreveria se estivéssemos com um atraso de quatro pontos, como no ano passado...