terça-feira, 15 de março de 2016

O dia em que o Luís Filipe e eu estivemos de acordo

A propósito de um link recuperado recentemente pelas redes sociais, relativo a um processo colocado pelo jornalista António Tavares-Teles a Luís Filipe Vieira, decidido em 2009 (LINK):


Com as escutas do apito dourado, ficou-se a saber que, efetivamente, António Tavares-Teles aceitou escrever uma notícia falsa a pedido de Pinto da Costa. Não há forma de provar a extrapolação seguinte, mas a naturalidade de trato registada na conversa - sobre um assunto que deveria ser imensamente melindroso para o jornalista -, leva a crer que não se trataria de uma situação nova para os dois.

Se António Tavares-Teles era pago e se recebia almoços, jantares ou charutos, não faço ideia. Mas efetivamente escreveu (pelo menos) um artigo encomendado. E num sistema que - também sabemos - tinha o hábito de premiar a lealdade e os bons serviços com todo o tipo de contrapartidas, materiais ou imateriais, não me custa a acreditar que as alegadas encomendas tenham sido devidamente recompensadas por quem delas usufruiu.

Não me lembro do processo, mas calculo que Vieira tenha sido condenado por as escutas não terem sido dadas como admissíveis em tribunal. Neste caso, sabendo nós o que se passou - graças à tal escuta em particular -, Vieira não devia ter sido condenado. Vieira tinha razão em pelo menos parte das acusações que fez. Bravo, Luís Filipe!

Mas gostaria de aproveitar algumas frases deste artigo para fazer uma transposição para acontecimentos bem mais recentes, em que Vieira é também (direta ou indiretamente) um dos protagonistas:

1. "em que António Tavares-Teles era acusado (...) de receber 'almoços, jantares e charutos'"

É bom saber que o presidente do Benfica, num determinado momento da sua existência, considerou a oferta de refeições a agentes relacionados com o mundo do futebol como algo de imoral, fosse para recompensar pessoas pelos serviços prestados, ou com o objetivo de as influenciar a fazer determinado tipo de favores. Se o presidente do Benfica considerasse as refeições como uma simples cortesia, sem quaisquer intenções menos honradas, seguramente que não as teria referido nas suas acusações.


2. "o presidente do Benfica acusou alguns jornalistas de serem 'jagunços', 'lixo', 'porcaria' e de serem pessoas sem 'valores de família'"

Apesar de o site do Sindicato de Jornalistas ter o arquivo dos comunicados emitidos desde o ano 2000, não se encontra qualquer tomada de posição do organismo de repúdio a estas declarações de Luís Filipe Vieira - que são seguramente tão ou mais violentas que aquelas que Bruno de Carvalho fez no Facebook.


3. "quando lhe foi pedido para revelar os nomes dos tais jornalistas, Luís Filipe Vieira viria a referir apenas o nome de António Tavares-Teles"

Portanto, o Sindicato dos Jornalistas nunca criticou Vieira pelos ataques feitos ao jornalista. Pelo contrário, em 2008, o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas (CDSJ) até se pronunciou - e bem - sobre as ações de António Tavares-Teles, referindo que este infringiu o Código Deontológico que está obrigado a seguir. Note-se, no entanto, que o CDSJ não fez qualquer referência à existência de pagamentos ilícitos nem tão pouco ao facto de Tavares-Teles o ter feito a pedido de terceiros. O CDSJ apenas criticou o jornalista por não ter relatado os factos com rigor e exatidão nem os ter interpretado com honestidade. (LINK)

Falta de rigor e exatidão no relato de factos e falta de honestidade na sua interpretação: ora cá está algo que, como sabemos, encontra-se com demasiada facilidade no trabalho de determinados jornalistas desportivos, numa base diária. Seria apenas uma questão de o CDSJ ter vontade de olhar com atenção para as barbaridades que vão sendo ditas ou escritas na comunicação social, para dar de caras com inúmeras outras situações semelhantes.