quarta-feira, 9 de março de 2016

Paradise Lost, de Carlos Janela

Os maluquinhos das teorias da conspiração, que dizem existir uma prolongada e ininterrupta campanha contra Bruno de Carvalho, ficarão certamente desarmados perante a lucidez de um comentário feito pelo insuspeito Carlos Janela, há dias, na sempre fiável CM TV:


Ficámos a saber, portanto, que Bruno de Carvalho foi o responsável pela crispação existente na 2ª mão da meia-final da Taça de Portugal entre Braga e Rio Ave, graças ao efeito de contágio da sua violência verbal. E, pelos vistos, daqui para a frente, será de esperar todo o tipo de tragédias.

Mas, como não concordar com Carlos Janela? Todos sabem que até Bruno de Carvalho ter tomado posse como presidente do Sporting, o futebol português vivia num estado de completa paz e harmonia. Nunca antes se tinha visto dirigentes a insultar outros dirigentes. Nunca antes tinha havido dirigentes a acusar outros clubes de atos ilícitos. Nunca antes tinha havido tensão entre duas equipas num jogo decisivo. Nunca antes tinha havido um jogo com muitos cartões e com agressões entre jogadores ou provocações entre equipas técnicas. Nunca antes tinha havido jogadores a perseguir um árbitro. Nunca antes tinha havido adeptos a entrar no relvado para agredir jornalistas. Nunca antes tinha havido qualquer adepto a entrar em campo para bater num fiscal-de-linha. Nunca antes houve violência nas bancadas entre claques. Nunca antes houve esperas de claques no exterior a adeptos dos clube visitantes. Nunca se lançaram petardos para o meio dos adeptos adversários. Nunca ninguém apunhalou adeptos da outra equipa nas imediações do estádio. Nunca se matou num estádio de futebol.

Não há outra conclusão que se possa tirar a partir das sábias palavras de Carlos Janela: o futebol português vivia no Jardim do Éden, e a chegada de Bruno de Carvalho representou a sua queda.

Milton tinha 59 anos quando Paradise Lost foi publicado. Não sei quantos dentes teria ainda na boca, mas estou em crer que não precisou de um mecenas que, em recompensa dos versos, lhe pagasse uma dentadura nova.


For neither man nor angel can discern
Hypocrisy, the only evil that walks
Invisible, except to God alone


John Milton, Paradise Lost, "Book III", v. 682-84.

(obrigado, @tonicasubtonica!)