sexta-feira, 11 de novembro de 2016

O novo administrador da FC Porto, SAD

A notícia já tem duas semanas, mas confesso que só agora me apercebi dela. E, devo dizer, é algo que roça o escândalo.

Na sequência da saída de Antero Henrique da SAD, o Porto prepara-se para nomear novo um administrador em sua substituição. E o nome escolhido por Pinto da Costa é, nem mais nem menos, que Eduardo Vítor Rodrigues, atual presidente da Câmara Municipal de Gaia.


Não é difícil perceber os motivos que tornam esta decisão altamente polémica. Falamos do presidente em exercício de um município que tem um imenso historial de favorecimentos ao FC Porto. Não que os favorecimentos do poder central ou local aos clubes sejam um exclusivo do FC Porto, bem entendido, mas, nesta "parceria" em particular entre FC Porto e o concelho de Gaia, os limites do tolerável foram ultrapassados há muito. O melhor exemplo é a cedência do centro de estágios do Olival a troco de uma renda pouco mais que simbólica - não os €500 mensais de que se falava há uns anos, é certo, mas ainda assim... 


... não se pode dizer que uma renda de cerca de €3.000 mensais (que totalizam €36.145 por ano) seja um valor justo para a utilização em exclusividade de um equipamento que custou 16 milhões de euros aos contribuintes. É mais cara a renda de um T4 espaçoso em Campo de Ourique do que a de um centro de estágio de 6 hectares.

Para se perceber o ridículo da situação, a SAD demorará 442 (não é uma tática, é mesmo quatrocentos e quarenta e dois) anos a pagar o investimento alheio. Mas, na realidade, o apoio dado pela Câmara de Gaia ao FC Porto inclui várias outras cedências (desde estádios a pavilhões), em que as obrigações estão quase todas do lado da autarquia.

A nomeação do presidente da câmara (ou de um vereador) para a administração da SAD poder-se-ia compreender se fosse uma imposição do município (num cenário em que este fosse acionista da SAD), mas não é este o caso: aqui, falamos apenas de um conhecido adepto portista a ocupar uma das suas cadeiras de sonho que, por acaso, é também presidente de uma das câmaras municipais mais endividadas do país.

Mas o facto de ser uma das câmaras municipais mais endividadas do país não a impede de manter os mesmos tiques do passado, que contribuíram para a colocar na atual situação:

via @IvoRafaelSilva

Ainda recentemente, em dezembro passado, a Câmara Municipal de Gaia gastou €9.300 na oferta de quatro viagens a Londres e bilhetes para assistir ao Chelsea - Porto. Os felizes contemplados foram dois presidentes de Junta, um vereador e um padre. Este gasto é, só por si, tremendamente discutível, mas, para piorar, a escolha da agência de viagens não o é menos: o serviço foi adjudicado à empresa Dragon Tour, que pertence... ao FC Porto. É caso para dizer que saíram todos a ganhar: os convidados puderam viver uma experiência diferente, houve uma companhia aérea que vendeu mais oito viagens, os responsáveis pela CM Gaia conseguiram os seus intentos, quaisquer que fossem, e o clube teve mais quatro adeptos no estádio e ainda ganhou as comissões das marcações das viagens. Pronto, há o pequeno pormenor de as contas da Câmara Municipal terem ficado 10 mil euros mais pobres, mas é para isso que cá está o Zé Contribuinte.

É óbvio. para toda a gente, que esta acumulação de cargos de Eduardo Vítor Rodrigues é um caso grave de conflito de interesses. Mesmo sendo um administrador não executivo da SAD, é legítimo que os munícipes de Gaia coloquem em causa esta decisão do homem que elegeram há três anos: afinal, votaram nele para endireitar a Câmara, e não para andar a fazer jeitinhos a um clube de futebol. De qualquer forma, os políticos já deviam ter aprendido que não ganham nada em se misturarem com o mundo do futebol: Todos se lembram das benesses que Luís Filipe Menezes arranjou ao FC Porto enquanto autarca de Gaia, e também todos se lembram do que aconteceu quando o ex-autarca de Gaia concorreu à Câmara do Porto, em 2013: teve uma derrota estrondosa, com apenas 21% dos votos.