quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Football Leaks: a parceria obscura entre Rybolovlev e Jorge Mendes

Artigo do L' Equipe, que pode ser lido aqui: LINKSegue-se a tradução para português. Vale a pena ler até ao fim.



FOOTBALL LEAKS: A PARCERIA OBSCURA ENTRE RYBOLOVLEV (MONACO) E JORGE MENDES

Segundo as novas revelações do Football Leaks, o proprietário do AS Monaco, Dmitri Rybolovlev, ter-se-á associado a um fundo de investimento que compra percentagens de jogadores, alguns dos quais passaram pelo seu próprio clube. Tudo isto com o agente português Jorge Mendes.

Sabe-se que Jorge Mendes já fez bons negócios com o Monaco, onde o agente português colocou os jogadores Falcao, Moutinho, James Rodriguez e Ricardo Carvalho. As últimas revelações do Football Leaks, publicadas quarta-feira pela Mediapart, mostram uma outra faceta dos negócios entre Dmitri Rybolovlev, presidente do AS Monaco, e Mendes.


Um fundo registado no Chipre

O bilionário russo terá usado um fundo de investimento (Browsefish Limited) para comprar, em total sigilo, parcelas de jogadores. Este fundo está registado no Chipre, mas o seu verdadeiro endereço aponta a Rybolovlev, no Monaco. O fundo terá comprado em junho de 2014 partes dos direitos económicos de seis jogadores do Braga, numa época em que a compra de jogadores por terceiras entidades (TPO) era autorizada, excetuando em certos países como a França ou o Reino Unido. Segundo o Football Leaks, a Browsefish detinha percentagens de doze futebolistas. "Se dirigir um clube ao mesmo tempo que se possui partes de jogadores dificilmente haverá compatibilidade, mas o conflito de interesses agrava-se quando um desses futebolistas acaba por ser contratado pelo Monaco", explica a Mediapart. É o caso do médio brasileiro Fabinho, membro do clube Mendes.



O exemplo absurdo de Fabinho

A transferência de Fabinho resume bem este esquema. Segundo o Football Leaks, em janeiro de 2014, a Browsefish terá adquirido 48,5% do jogador, isto é, metade da percentagem que pertencia a Mendes. No momento dessa compra, Fabinho já jogava no Monaco, emprestado pelo Rio Ave (Portugal) em junho de 2013. O seu presidente seria, portanto, proprietário de metade de um jogador que alinhava no seu clube. Posteriormente, o Monaco comprou-o, a 15 de maio de 2015. Isto é, quinze dias após a interdição dos TPO pela FIFA. Sendo que, algures durante esse intervalo de tempo, a 1 de janeiro de 2015, a Gestifute recomprou a parte de Fabinho que pertencia à Browsefish, pelo que o Monaco não comprou um jogador detido parcialmente... pelo seu presidente.

De acordo com a comunicação social, o Monaco comprou Fabinho por um valor entre os 5 e os 6 milhões de euros. Mas o documento oficial registado pelo Monaco no sistema de regulação de transferências da FIFA indica a soma de 10 cêntimos de euro. Para além disso, a sociedade Gestifute, que detinha 97% de Fabinho no momento da transferência, não aparece nos documentos enviados à FIFA. "Parece uma operação de TPO disfarçada em benefício de Jorge Mendes, quinze dias após a interdição de tais práticas", explica a Mediapart. Outro negócio igualmente nebuloso foi o do antigo defesa do Monaco, Wallace, que também integrou o portefólio de TPO da Browsefish.

Segundo o Football Leaks, entre janeiro de 2014 e junho de 2015, as vendas de parcelas de jogadores ao fundo de Rybolovlev representaram 87% da atividade TPO da Gestifute, a empresa de Mendes, e gerou 6,85 milhões de euros em mais-valias para o agente. Para a Mediapart, este sistema poderá ser também um meio para pagamento de comissões disfarçadas a Jorge Mendes. A Mediapart tentou contactar Mendes e Rybolovlev, mas os dois não responderam. Não há informações que indiquem se o fundo em questão ainda existe e se, em caso afirmativo, se respeita as novas leis.



O artigo do L' Equipe terminou na linha anterior. Daqui para a frente, o texto é meu. 

Este artigo do L' Equipe baseou-se num outro artigo da Mediapart, cujo link foi colocado mais acima, e que apenas pode ser lido na totalidade por assinantes. No entanto, tive a oportunidade de ler o artigo completo, e existem mais pormenores interessantes:

  • Em junho de 2014, a Browsefish Limited (o fundo de investimento de Rybolovlev), comprou 30 a 40% dos direitos económicos de seis jogadores do Braga, nos quais se incluía Rafa Silva, que entretanto se transferiu para o Benfica.
  • Jorge Mendes comprou 97% dos direitos económicos de Fabinho por 1 milhão de euros. Posteriormente, vendeu 48,5% a Rybolovlev por 2,325 milhões. Mais tarde, a Gestifute recomprou esses 48,5% por apenas 1 milhão! Conforme escreve a Mediapart: "Ficamos a imaginar o motivo que terá levado o proprietário do Monaco a aceitar um negócio tão desfavorável".
  • Ao contrato de venda de Fabinho do Rio Ave para o Monaco por 10 cêntimos, foi acrescentada uma adenda que, em caso de uma venda futura do jogador, o Monaco deverá entregar 50% do valor da transferência ao Rio Ave.
  • Em relação a Wallace, Jorge Mendes comprou, faseadamente, 90% dos direitos económicos do jogador por 6,4 milhões. Posteriormente, vendeu 45% a Rybolovlev por 4,4 milhões. Nesta altura, Wallace jogava no Monaco, por empréstimo do Braga (que, por sua vez, tinha pago 1€ ao Cruzeiro pelos direitos desportivos). Para apresentar um aspeto menos nebuloso, no dia 3 de julho de 2014, o Braga comprou os 90% dos direitos económicos a Mendes e Rybolovlev, mas comprometendo-se  a entregar à Gestifute a totalidade do valor de uma futura transferência. Não há nenhuma referência à Browsefish de Rybolovlev, mas presumindo-se que a Gestifute seria responsável pelo encontro de contas com o fundo - resta saber com que percentagem de comissão. Entretanto, em 2016, o Braga vendeu Wallace à Lazio por 8 milhões, o que significa que o lucro para os investidores foi relativamente reduzido. O Football Leaks não esclarece como Mendes e Rybolovlev distribuíram os ganhos.
  • O Football Leaks mostra que a Browsefish detinha percentagens de 12 jogadores, incluindo o mexicano Raul Jimenez, que agora joga no Benfica. O que pode lançar a seguinte questão: considerando as movimentações sucessivas de direitos económicos (compras, vendas e recompras) nestes negócios que envolvem Gestifute e Browsefish, usando os clubes como meros repositórios de jogadores, será que os 100% que o Benfica detém de Jimenez são reais? Ou estamos perante uma situação igual ou parecida com aqueles 100% que o Braga "detinha" de Wallace? Jimenez que, recorde-se, já terá guia de marcha definida por uma verba recorde - pelo menos é o que diz o feeling de Luís Filipe Vieira. E quem fala de Jimenez, fala de Rafa Silva.