segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Analisando o programa de Madeira Rodrigues

É normal que um candidato que concorra contra um presidente em exercício necessite de pontos de diferenciação que lhe permita captar o maior número de votos possível. Seria de esperar algumas propostas inovadoras no programa e, verdade seja dita, essas propostas inovadoras apareceram. Infelizmente, a maior parte não faz grande sentido face à realidade do clube. Ainda assim, há algumas ideias interessantes que gostaria de ver implementadas, independentemente de quem ganhe as eleições.

Retirei do programa as medidas que me parecem merecer maior destaque, seja por bons motivos ou por me parecer não fazerem sentido, e as que me parecem necessitar de esclarecimentos adicionais. Coloco-as pela ordem que aparecem no programa, e não pelo nível de importância. A negrito está o texto do programa, seguindo-se, a fonte normal, os meus comentários.



Positivo

Utilizar a equipa B como plantel de apoio à equipa principal: a meu ver, a equipa B poderia ser muito mais útil caso existisse uma maior interligação com a equipa principal. A equipa B deveria servir para dar ritmo competitivo aos jogadores menos utilizados da equipa principal, como também, havendo um plantel principal mais reduzido, se deveria incentivar a promoção temporária de jogadores da equipa B à equipa principal, em caso de necessidade - o que certamente serviria de fator de motivação aos mais jovens. Obviamente, a colocação em prática desta ideia depende muito do treinador da equipa principal, mas, como é óbvio, a direção tem sempre formas de a "facilitar".

Garantir a interligação entre os horários dos jogos das várias modalidades para voltarmos a ter dias “à Sporting”: com a entrada em funcionamento do pavilhão João Rocha, isto é, para mim, essencial. É verdade que neste momento ainda não existe um pavilhão próprio, mas têm sido demasiadas as ocasiões em que se marcam jogos de modalidades para a mesma hora de jogos da equipa de futebol, o que não faz qualquer sentido.

Explorar a possibilidade de introdução do voto electrónico nos núcleos, salvaguardando a total fiabilidade dos sistemas: em 2017, não faz sentido que não exista ainda uma solução que facilite a participação eleitoral dos sportinguistas que vivem longe de Lisboa.

Dinamizar a proximidade de sócios às figuras do clube, aproveitando o site e as plataformas de comunicação organizando, entre outros, live chats regulares: há relativamente pouco tempo - creio que no início desta época - fez-se um live chat com jogadores da equipa de futsal, que correu muito bem. O clube só tem a ganhar com a aproximação dos seus atletas (incluindo os de futebol) aos adeptos. Já temos no Sporting um exemplo perfeito daquilo que pode ser feito pelos jogadores na comunicação com os adeptos: Carlos Ruesga. No futebol, em particular, têm existido algumas iniciativas muito interessante nas redes sociais do clube (o que se fez com Campbell no momento da contratação, Dost a cantar o cântico que lhe foi dedicado), mas parece-me que a maior parte dos jogadores vive completamente alheada da necessidade de contribuir para um maior envolvimento com os sportinguistas.


Negativo

Utilizar a equipa B como plataforma de transição principal dos jovens formados na Academia: apesar de defender uma maior proximidade entre a equipa B e a equipa principal, isto, para mim, é uma utopia. Existe uma distância muito grande entre a competitividade da II Liga e as exigências da equipa principal do Sporting, pelo que a plataforma de transição principal deverá ser o empréstimo a outros clubes da I Liga. A promoção definitiva ao plantel principal a partir da equipa B deverá acontecer em casos excecionais, e não como regra. A não ser que por "plataforma de transição principal dos jovens formados na Academia" se entenda a passagem das camadas jovens para o futebol sénior. Se for esta última hipótese, nesse caso estou de acordo.

Impor a utilização do nosso equipamento principal tradicional e travar a banalização e excessiva secundarização do equipamento Stromp, com utilização apenas em ocasiões relevantes: ?!

Propor a criação da figura do sócio-claque, permitindo aos membros das claques um desconto na quotização até aos 21 anos: neste momento, penso que os membros das claques já têm regalias suficientes em relação aos demais sócios. O apoio no estádio tem sido exemplar, mas abusam do seu estatuto com as visitas de protesto na Academia e os comunicados a criticar a equipa de futebol. Não vejo necessidade de os discriminar positivamente ainda mais.

Recuperar no imediato a posse da Academia Sporting, na posse do Banco Comercial Português desde 2014, com o apoio de investidores que entrarão com um valor a rondar os 14 M €: parece-me uma má utilização de recursos. A Academia pertence ao BCP apenas no papel, pois o Sporting tira total partido do espaço, que ficará na posse da SAD quando o atual contrato de leasing terminar. Para quê gastar 14 milhões de euros na reaquisição imediata da Academia, em vez de canalizar estes recursos para outras necessidades mais relevantes? E, já agora, quem são esses investidores? E que interesse têm esses investidores nesta operação?

Criar uma fan zone junto ao relvado que permita que associados sorteados possam ter acesso directo aos jogadores: uma coisa é haver um sócio premiado que possa tirar uma fotografia no início do jogo; outra é uma iniciativa deste tipo. Nada contra uma fan zone em dias de treino aberto aos sócios, mas, em dia de jogo, apenas serve para dificultar a concentração dos jogadores. 

De uma forma geral, as propostas ao nível do património: a proposta de construção de um velódromo e de um clube naval é, simplesmente, ridícula. O Sporting tem não tem ciclismo de velocidade nem tem qualquer tradição ao nível da vela - houve uma secção da modalidade na década de 80, que rapidamente se extinguiu. Não faz qualquer sentido avançar para este tipo de infraestruturas, quando ainda há tanto que pode ser feito no melhoramento das condições das modalidades já existentes. O centro de estágios no norte do país não faz grande sentido, considerando que seria uma infraestrutura com custos de implementação e manutenção demasiado elevados (para além dos funcionários adicionais que exigiria) para o número de ocasiões em que seria utilizado. Medidas como a criação de uma residência para antigos atletas, de uma residência universitária e de uma creche parecem saídas da mente de Luís Filipe Vieira.


A necessitar de mais esclarecimentos

Assumir inequivocamente a transparência na identificação dos investidores: perfeitamente de acordo, face ao anúncio de Bruno de Carvalho de que os 18 milhões do novo investidor já terão entrado, mas sem ter revelado quem é o investidor. No entanto, existe neste mesmo programa uma outra medida que pressupõe o recurso a investidores (a recuperação da Academia) que não foram identificados. Louvo a ideia, mas não posso deixar de assinalar a incoerência.

Propor a criação da figura do sócio-filho. Um agregado familiar com pelo menos dois sócios efectivos de escalão A poderá ver os seus descendentes directos isentos de quota até aos 14 anos: simpatizo com esta proposta, mas não entendo por que motivo é necessário haver dois sócios efetivos no mesmo agregado familiar para se usufruir deste escalão.

Propor a criação da figura do sócio-internacional, permitindo uma maior ligação ao clube do número cada vez mais elevado de sportinguistas que vivem fora de Portugal: percebo a ideia, mas à partida parece-me redundante face à quota económica, perfeitamente acessível e adequada para sportinguistas que raramente têm a oportunidade de vir a Alvalade. Gostava de saber exatamente o que é que a categoria de sócio-internacional ofereceria de diferente em relação às categorias já existentes.

Reduzir os gastos com fornecimentos e serviços externos: tenho muitas dúvidas em relação a este ponto, porque me parece que existe, neste momento, um enorme controlo neste tipo de gastos. Se calhar, até demais, face às carências que se notam em determinadas áreas de competência do clube e SAD. Em que tipo de serviços pensa Madeira Rodrigues reduzir os gastos?



Resumindo, não encontro nenhuma ideia que possa classificar de revolucionária, que possa servir de bandeira da lista de Madeira Rodrigues. Não era fácil consegui-lo, admito. Há, no entanto, algumas propostas interessantes que merecem ser discutidas. O mais negativo, na minha opinião, é a parte respeitante ao património - que no seu conjunto ultrapassariam em muito o custo do pavilhão João Rocha, sem que daí resultassem benefícios efetivamente relevantes para o Sporting.