terça-feira, 9 de maio de 2017

Será demasiado pedirmos um pouco de bom senso?

Jogadores, treinadores e dirigentes de um clube de futebol são, antes de tudo o resto, cidadãos que usufruem dos mesmos direitos que qualquer outro indivíduo. Há uns que são, por natureza, mais discretos, e há outros que apreciam a visibilidade e mediatismo. Há uns que fogem das câmaras, há outros que se sentem atraídos por elas. Há uns que gostam de partilhar com o público momentos da sua vida privada, há outros que preferem não o fazer. Estão todos no seu direito e não há ninguém que tenha legitimidade para exigir que ajam de maneira diferente.

No entanto, os jogadores, treinadores e dirigentes de clubes de futebol são, também, profissionais muito bem pagos que devem a sua visibilidade à carreira que escolheram. E como qualquer profissional em qualquer área, devem adaptar o seu comportamento na vida privada às especificidades da sua vida profissional. 

Não há ninguém que possa impedir um cidadão de ir para os copos até às tantas da manhã. Mas se o cidadão for um atleta de alta competição, então, por motivos óbvios, não o deve fazer. Um político pode ser muito amigo de um cidadão acusado ou condenado por corrupção, mas sabe que não deve aparecer publicamente ao seu lado. Um técnico de uma qualquer área profissional que esteja de prevenção durante um fim-de-semana, sabe que não pode ir ao cinema e desligar o telemóvel para poder apreciar o filme sem interrupções. Todas as profissões têm especificidades que condicionam a vida pessoal, sendo necessário gerir ambas as componentes profissional e pessoal para que não se atropelem mutuamente para além do que é razoável.

Vem esta longa introdução a propósito disto:


Post de Alan Ruiz no Instagram na tarde de domingo, a fazer um V de vitória, poucas horas depois da derrota com o Belenenses. Também na tarde de domingo, a esposa de Adrien, capitão de equipa, publicou no Instagram uma fotografia romântica de ambos. Têm direito a fazê-lo? Com certeza que sim. Mas depois da vergonha que aconteceu no domingo de manhã, seria do mais elementar bom senso haver algum recato. Tenham jogado ou não, tenham maiores ou menores culpas no cartório, é sinal de falta de brio profissional.

Se eu tivesse cometido um erro colossal na minha vida profissional e não houvesse forma de o remediar de imediato, não conseguiria passar as horas seguintes com este nível de descontração. É claro que nem todos são obrigados a reagir da mesma forma aos problemas profissionais, mas seria de esperar, no mínimo, que demonstrassem algum recato, nem que fosse durante um par de dias, como sinal de reflexão pelo que aconteceu e por respeito pelas milhares de pessoas que pagaram para os ver jogar e saíram completamente defraudadas do estádio. O facto de não o terem feito significa uma de duas coisas: que não fazem ideia daquilo que provocaram aos sportinguistas, ou que estão a borrifar-se para aquilo que provocaram aos sportinguistas.

Este seria um bom momento para pedir à direção para instruir os jogadores para o que devem ou não fazer na sua relação com o grande público, mas não o posso fazer porque, aparentemente, de cima não vêm bons exemplos. Ontem, ainda na ressaca da derrota do dia anterior, acordei com esta feliz notícia:


Como atenuante, há que dizer que Bruno de Carvalho deu a entrevista à CMTV (de onde foram retiradas estas declarações) dois dias antes da derrota com o Belenenses. Mas essas atenuantes não anulam a génese do problema. Bruno de Carvalho já devia saber que: 1) é um erro colocar-se nas mãos de CM / CMTV, que, obviamente, iriam escolher sempre o pior momento possível para publicar as suas palavras; 2) enquanto presidente, deve também liderar pelo exemplo.

E já nem entro pela questão de ver o presidente estar recorrentemente a dar exclusivos a canais e jornais que não perdem uma oportunidade para nos deitar abaixo.

Todos têm direito a fazer o que fizeram, não é isso que está em causa. Não tenho qualquer legitimidade para exigir aos outros que mantenham determinados comportamentos dentro daquilo que são os meus padrões de conduta. Mas será pedir muito aos profissionais do clube que tenham um mínimo de noção daquilo que os rodeia? Será demasiado pedirmos um pouco de bom senso?


P.S.: aproveitando a questão da mistura da vida pessoal e profissional do presidente, permitam-me a seguinte observação adicional: marcar o casamento para 1 de julho, dia do aniversário do clube e da Gala Honoris, é um erro. É muito giro e tal pelo que a data significa, mas politicamente é uma situação lose-lose. Os cenários que existem são:

I) A Gala Honoris realiza-se a 1 de julho, como sempre, sem a presença do presidente. Que sentido faz o presidente ter-se autoexcluído sem necessidade absoluta de um evento que começa a criar raizes e que tem vindo a conquistar um espaço importante na vida do clube?

II) A Gala Honoris realiza-se a 1 de julho, como sempre, com a presença do presidente. Já se está mesmo a ver que haverá quem veja isto como uma espécie de copo-de-água estendido, e que estaremos condenados a que todos os discursos e intervenções na Gala comecem com desejos de felicidade ao presidente e esposa. Será um fartote para aqueles que gostam de chamar coreano a Bruno de Carvalho.

III) Muda-se a data da Gala Honoris para que não colida com o casamento do presidente. Nem preciso de explicar o que isto representaria, pois não?