sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

A defesa das borlas por José Manuel Delgado

Ontem, no programa Quinta da Bola, um dos temas debatidos foi a polémica à volta dos pedidos de convites de políticos e dirigentes da FPF e Liga para assistirem a jogos de futebol. Isto vem na sequência da revelação dos emails sobre a solicitação de dois convites em nome do ministro Mário Centeno para a tribuna presidencial do Benfica, bem como os inúmeros bilhetes oferecidos por Paulo Gonçalves aos mais diversos agentes de futebol e que o coroaram, muito justamente, como o rei das borlas.

Aqui fica uma pequena parte do que foi falado:



Como seria de esperar, José Manuel Delgado acha toda esta questão absurda. Considera que há pessoas que, pelos cargos que ocupam, não se devem misturar na bancada com o resto dos espectadores por questões de segurança, que é bom para o futebol que as pessoas do futebol estejam próximas do futebol, e que ao estarem a afastar do futebol pessoas que gostam de futebol estão a causar danos ao futebol.

Em primeiro lugar, há que separar duas situações que são bastante distintas. Compreendo perfeitamente que uma pessoa como o ministro Centeno, pela natureza do cargo que desempenha, assista a um jogo num espaço de acesso reservado. É uma figura pública, toma decisões que podem ter um impacto profundo, para o bem e para o mal, na vida das pessoas, pelo que num dia de azar poderia sujeitar-se a passar por situações desagradáveis se fosse para um lugar normal do estádio. Não é isso que está em causa. O que está em causa, pelo menos para mim, é o sinal que passa ao andar a pedir bilhetes para se sentar ao lado de um dos maiores devedores à banca que este país tem. Outra coisa muito diferente são "as pessoas do futebol", como os membros do conselho de disciplina, delegados ou outros dirigentes. Nestes casos, não faz sentido que se invoque questões de segurança, porque ninguém conhece a maior parte dessas pessoas.

José Manuel Delgado utiliza um outro argumento: o de que é bom que as pessoas do futebol estejam próximas do futebol. A argumentação faria todo o sentido... se muitas dessas pessoas do futebol não andassem a solicitar bilhetes para acompanhantes. Se estiverem lá em trabalho, para observar o que se passa in loco (e é discutível que tenham de o fazer), por que motivo é que precisam de ir acompanhados pelos filhos ou amigos?

Olhem para a imagem ao lado: se vão ao futebol por motivos estritamente profissionais, não bastaria terem solicitado um só bilhete? E era realmente necessário terem acesso ao lounge para catering do bom e do melhor?

Depois há a questão de, segundo José Manuel Delgado, ser danoso para o futebol estar-se a afastar pessoas que gostam de futebol. Mas quem é que os impede de irem ao jogo por meios próprios? Não podem comprar bilhete? Têm mesmo de andar a pedinchar convites, dando sinais desnecessários de promiscuidade com clubes e dirigentes, dos quais se deviam manter equidistantes? Veja-se o caso de João Leal, responsável pelos registos e transferências da FPF, cujo nome tem aparecido em inúmeros emails de pedidos de convites para jogos do Benfica: gostava de saber se costuma ir muitas vezes assistir a jogos do Belenenses, Estoril ou Sporting... é que se a questão é unicamente o amor ao futebol, se calhar seria natural que fosse presença igualmente assídua noutros estádios da região de Lisboa.

Tentar fazer crer que tudo isto é natural, é estar a gozar com a cara das pessoas - ainda mais quando se conhecem as motivações de quem oferece os bilhetes ("o interesse exclusivo do SLB", segundo Paulo Gonçalves) e quando são desenterrados diariamente casos preocupantes de promiscuidade, tráfico de influências ou corrupção.

Compreendo que Delgado se sinta quase ofendido por se colocar em causa o direito à borla. Tanto compreendo, que gostaria que de lhe fazer uma pergunta: qual foi a última vez em que teve de pagar bilhete para assistir a um jogo do Benfica na Luz?