sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Os direitos de uma futura venda de José Gomes

José Gomes é um jovem de 18 anos que faz parte da equipa B do Benfica e um dos mais promissores futebolistas da sua geração. Chegou ao Benfica na época de 2012/13 e teve uma ascensão rápida nos escalões de formação, jogando quase sempre num patamar acima daquilo que a sua idade permitia. Atualmente ainda tem idade de junior, mas tem jogado sobretudo na equipa B (apesar de também ter feito alguns jogos nos sub-19).

Na época passada, graças a uma série de lesões nos jogadores de ataque do plantel ao serviço de Rui Vitória, José Gomes chegou a fazer alguns jogos pela equipa principal, estreando-se em setembro de 2016 em Arouca, tendo tido, à boa maneira da propaganda benfiquista, uma pequena dose de hype artificialmente gerado por alguma comunicação social. É impossível esquecer a capa do jornal Record em que se escreveu "José Gomes estreou-se e ficou a centímetros do golo", ou o grande destaque de capa do jornal A Bola após ter ganho dois penáltis num jogo particular.

Em outubro de 2016, ou seja, um mês depois da sua estreia em jogos oficiais pela equipa profissional, José Gomes passou a ser representado pela Gestifute de Jorge Mendes.


A ligação ao super-agente haveria de dar frutos um ano mais tarde: em agosto de 2017, José Gomes renovou o seu contrato com o Benfica até 2022.


Agora, uma curiosidade. Em fevereiro de 2017, ou seja, meses depois de José Gomes ter assinado com Jorge Mendes e meses antes de ter renovado contrato com o Benfica, Luís Filipe Vieira recebeu um email de um seu colaborador que continha vários ficheiros com os dados da situação contratual de todos os jogadores do plantel principal, equipa B, emprestados e ainda alguns jogadores das camadas jovens. Entre os dados existentes nesses ficheiros podem encontrar-se os anos de contrato, salários mensais e anuais, prémios por objetivos, cláusulas de rescisão ou detentores dos direitos económicos e direitos de imagem. Dados atualizados, conforme se pode ler no email.


No ficheiro relativo à equipa B, é possível consultar os dados de José Gomes. Vou cobrir o salário mensal e anual, mas posso garantir que em fevereiro de 2017, José Gomes ganhava o mesmo que a maior parte dos restantes jogadores da formação benfiquista que estão nos juniores e na equipa B. Entre esses dados, pode ver-se que...


... a Gestifute tem direito a 20% das mais-valias de uma futura transferência por contrato de intermediação. Ou seja, está definido que Jorge Mendes será o intermediário de uma futura venda (o que não é surpreendente), e que terá direito a 20% das mais-valias por esse papel, seja a venda feita a quem for. 

De referir que num jogador da formação, as mais-valias correspondem à quase totalidade da venda, pois não houve custos com a sua contratação. Portanto, na prática, isto é equivalente a entregarem-lhe 20% dos direitos económicos.

E agora, a pergunta mais complicada: por que razão teve Jorge Mendes direito a 20% das mais-valias? Há empresários que conseguem esse tipo de direitos aquando das transferências ou renovações dos seus atletas (por exemplo: a Promosport, que mediou a renovação de André Silva com o Porto, ficou com direito a 10% das mais-valias de uma venda futura), mas, em fevereiro de 2017, Jorge Mendes ainda não tinha assinado nenhum contrato com o Benfica enquanto representante de José Gomes - a renovação só aconteceria em agosto desse ano.

Não tenho nada a ver com isso, mas se fosse um jogador do meu clube iria gostar de saber por que razão foi dado este direito a Jorge Mendes e, já agora, se lhe foi dado algum direito adicional na renovação de José Gomes que aconteceu meses mais tarde. Da mesma forma que perguntaria se era mesmo necessário o Benfica entregar 10% das mais-valias futuras de uma venda de Gedson Fernandes, outra das joias da formação benfiquista, para além de ter pago 400.000€ de comissão pela sua renovação...