quinta-feira, 17 de maio de 2018

Cuidado com os julgamentos precipitados

O objetivo deste texto não é defender a inocência de ninguém nem desviar as atenções das graves acusações que pendem sobre o Sporting. No entanto, no meio da enxurrada informativa a que se tem assistido nos últimos dias têm-se registado também várias situações de desinformação que se podem explicar por negligência face ao ritmo dos acontecimentos, mas também por aproveitamento doloso daqueles que têm cartilhas para apregoar.

Há múltiplos exemplos que se podem arranjar. Na segunda-feira, a Comunicação Social anunciou em massa que Jorge Jesus tinha sido suspenso de funções. Como se sabe, Bruno de Carvalho desmentiu essa notícia à saída do estádio, mas, ainda assim, no dia seguinte foram várias as rádios e televisões que continuavam a garantir que estava iminente um processo disciplinar a Jorge Jesus, faltando apenas a entrega de um documento. 

Na terça-feira, o Correio da Manhã identificou André Geraldes como sendo responsável pelas modalidades do Sporting. Apesar de qualquer pessoa minimamente atenta saber que André Geraldes nunca foi responsável pelas modalidades (era oficial de ligação aos adeptos antes de ter entrado no departamento de futebol, onde foi responsável pelo gabinete de apoio aos jogadores e é agora team manager), o resto da Comunicação Social foi atrás.

À esquerda, em baixo: a referência do CM a André Geraldes na edição sobre corrupção no andebol


 



Como se pode ver, o grau de escrutínio não é propriamente exemplar. Mais uma vez, um órgão de comunicação social deu a notícia e muitos outros foram atrás sem fazer as devidas validações.

Ontem houve outra situação idêntica. A meio da tarde, a Comunicação Social noticiou em massa que a NOS estaria a equacionar a rescisão de contrato com o Sporting.




Pouco tempo depois, a NOS negava oficialmente essas notícias.


Ainda assim, houve quem chegasse atrasado à "notícia inicial" já depois do desmentido oficial. Isto só vendo para crer:


Como é fácil de perceber, há demasiada vontade da Comunicação Social em avançar notícias sobre o assunto. Uma sofreguidão que impede um escrutínio rigoroso e acaba por fazer com que passem muitas imprecisões.

À hora em que escrevo isto já circulam rumores sobre as bombas dos próximos dias: casos de doping a envolver jogadores do Sporting (Nuno Saraiva já tinha alertado que iria sair uma reportagem sobre doping no princípio de maio) e uma iminente prisão de Bruno de Carvalho. Tal como as coisas andam, já nada me admira. No entanto, voltando ao que iniciou tudo isto - a reportagem do CM e as provas apresentadas pelo arrependido, continuo a ver muitas inconsistências e factos estranhos:

1. Está mais que visto que é a justiça a ir a reboque das notícias publicadas na Comunicação Social, e não o contrário. No caso das investigações de aliciamento a adversários do Benfica, já existiam investigações quando a Comunicação Social as revelou ao público.

2. Por enquanto não há árbitros nem jogadores arguidos.

3. O único jogador cujo nome foi divulgado (pelo menos que me tenha apercebido) é João Aurélio, reconhecidamente um benfiquista ferrenho. No momento em que termino este texto, João Aurélio acaba de emitir um comunicado em que nega as acusações (vale o que vale, obviamente) e afirma-se surpreendido por ainda não ter sido chamado pelas entidadades competentes para prestar declarações (LINK).

4. As mensagens de Whatsapp que ouvi são quase todas do arrependido, sempre no diz-que-disse. Não há diálogos, são apenas mensagens de voz num único sentido, e o que é dito nem sempre é propriamente convincente. E falta saber o contexto, se é que existe contexto.

5. Continuo a achar estranho o arrependido ter ido primeiro ao CM e não à PJ ou ao MP.

6. Continuo a achar muito curioso que César Boaventura tivesse conhecimento de tudo e andado a publicar teasers desde a semana passada.

7. É difícil não estabelecer algum tipo de relação entre os casos de doping que parece que aí vêm e a entrada de Luís Horta (que foi presidente da ADoP durante 5 anos) no Benfica.

8. Depois de décadas em que foram raros os casos de doping e corrupção no futebol português, é surreal que apareça tanta coisa num espaço de tempo tão curto.

Repito: não sei se aquilo de que o Sporting é acusado é ou não verdadeiro, e não ponho as mãos no fogo por ninguém. Também se pode dar o caso de haver algumas coisas verdadeiras e outras falsas. Mas que há aqui algumas coincidências e ocorrências que carecem de explicação adicionais, lá isso há. Junte-se a isso uma Comunicação Social demasiado sôfrega de notícias bombásticas e um gabinete de crise a funcionar a todo o vapor com a colaboração de um ex-SIS... e parece-me, por isso, que será sensato resistirmos a fazer julgamentos precipitados sobre tudo o que está a acontecer. Há que dar tempo para as investigações ocorrerem e para que novos dados (devidamente trabalhados por quem de direito) sejam conhecidos, para podermos então passar a ter uma opinião mais fundamentada.

P.S.: Ainda assim, a minha opinião em relação à necessidade à saída de Bruno de Carvalho não muda: aquilo que se passou na Academia é demasiado grave e revela que neste momento o Sporting é um clube sem liderança. A marcação de uma AG extraordinária para esclarecimento dos sócios em relação ao atual momento não me satisfaz, parece-me apenas uma forma de perder tempo para tentar adiar o inevitável.