Já me referi a alguns destes pontos em posts anteriores, mas agora que passaram alguns dias e mais alguns elementos foram conhecidos, vou fazer um ponto de situação em relação às questões que me parecem mais estranhas nesta transação.
1. A super-valorização de Rodrigo e André Gomes
Ninguém anda na vida com o objetivo de perder dinheiro, principalmente um magnata que enriqueceu através da especulação bolsista e um dos agentes de jogadores de futebol mais bem sucedidos do mundo. Valorizar Rodrigo por €30M + €10M por objetivos (que não são conhecidos) e André Gomes por €15M é uma das mais irracionais decisões negociais que já vi alguém tomar na minha vida (ao nível da compra dos submarinos pelo Estado português).
Quem tem muito dinheiro e pouca pressão para o usar tem sempre vantagem negocial. Quem não tem dinheiro e precisa urgentemente de realizar vendas tem sempre desvantagem negocial. Isto é verdade em todos os setores de atividade económica, e o futebol não é exceção. O Benfica pode ser um clube muito especial para os seus sócios e adeptos, mas no mundo dos negócios não é mais do que os outros.
2. A venda a um fundo
Esta é outra originalidade. Fundos com percentagens de passes de jogadores é um fenómeno bastante frequente nos dias que correm. Mas vender 100% dos direitos económicos de uma vez só é, no mínimo, raro.
Faz todo o sentido que um fundo fique com uma parcela minoritária dos direitos económicos de um jogador, e que o clube onde o jogador joga tenha a parcela maioritária. Desta forma, o clube tem motivação para continuar a valorizar jogador e o fundo tem mais probabilidades de rentabilizar o seu investimento.
Ao comprar 100% dos direitos económicos de um jogador, o fundo não tem forma de controlar se esse jogador continua ou não a jogar. Está a deixar nas mãos de um treinador que não controla a valorização ou desvalorização de um seu ativo.
3. O cúmulo da excentricidade
O cúmulo da excentricidade é alguém pagar €15M por um jogador que jogou 5 minutos em 16 jornadas do campeonato, e deixá-lo nesse mesmo clube para o resto da época.
Falo de André Gomes. Já toda a gente percebeu que Jorge Jesus não conta com ele. Faz algum sentido que o fundo o tenha deixado no Benfica até ao final da temporada?
A Santa Casa tem aqui uma ideia interessante para servir de base a um novo anúncio do Euromilhões.
4. Compra sem utilidade aparente
in O Jogo |
Assumindo que os valores divulgados são verdadeiros, dificilmente o fundo conseguirá lucrar com uma futura venda destes dois jogadores. Será razoável pensar que a compra dos passes dos jogadores terá alguma coisa a ver com as sucessivas tentativas de Peter Lim entrar no capital de um clube inglês ou espanhol?
Não me parece. Se a ideia de Peter Lim é utilizar os jogadores como arma de sedução para o deixarem entrar no capital de um clube europeu de renome, dificilmente Rodrigo e André Gomes serão nomes suficientemente aliciantes.
Não me parece. Se a ideia de Peter Lim é utilizar os jogadores como arma de sedução para o deixarem entrar no capital de um clube europeu de renome, dificilmente Rodrigo e André Gomes serão nomes suficientemente aliciantes.
No caso do Atlético de Madrid, que tem jogadores como Villa, Turan ou Diego Costa, seria preciso peixe mais graúdo. E nem sequer no Valência, que no passado recente teve jogadores como Villa, Aimar, Soldado, David Silva, Joaquin ou Cañizares, os nomes de Rodrigo e André Gomes poderão causar grande emoção.
Só se Peter Lim quiser comprar um clube de um nível do Getafe ou do Charlton, com todo o respeito por esses clubes. Mas isso será pouco provável.
5. O comunicado do Benfica e a percentagem de direitos económicos
Olhando para o comunicado que o Benfica enviou à CMVM, foram vendidos 100% dos direitos económicos de Rodrigo e André Gomes.
Acontece que em de Dezembro de 2013, o Benfica não era detentor de 100% dos direitos económicos dos dois jogadores.
Há um mês atrás, 24% do passe de Rodrigo e 20% do passe de André Gomes pertenciam ao Benfica Stars Fund. Apesar de ser um fundo em que o Benfica tem uma pequena participação, não é verdade que a totalidade do passe pertença à SAD do Benfica. A não ser, claro, que tenha havido em Janeiro uma recompra das percentagens de passe. Mas não consegui encontrar qualquer comunicado do Benfica à CMVM nesse sentido.
Conclusão
Assumindo que existe algum nível de racionalidade nas decisões que as diferentes partes de um negócio tomam, é-me completamente impossível compreender esta venda que Vieira conseguiu alcançar.
Para os mais céticos em relação à minha argumentação, deixo esta pergunta: imaginem-se com €1000M para gastar. Eram capazes de ir a um clube húngaro dar €5M por jogadores de segunda linha sem terem um destino imediato onde os colocar?
Conclusão
Assumindo que existe algum nível de racionalidade nas decisões que as diferentes partes de um negócio tomam, é-me completamente impossível compreender esta venda que Vieira conseguiu alcançar.
Para os mais céticos em relação à minha argumentação, deixo esta pergunta: imaginem-se com €1000M para gastar. Eram capazes de ir a um clube húngaro dar €5M por jogadores de segunda linha sem terem um destino imediato onde os colocar?