sexta-feira, 23 de maio de 2014

Os desafios do defeso

Agora que terminou a época de clubes, é difícil não começarmos a pensar já em 2014/15.

A próxima temporada irá sobretudo girar à volta da capacidade que o Benfica terá para consolidar o domínio conseguido este ano. Estaremos perante um novo ciclo de hegemonia do futebol português, desta vez pintada a tons de vermelho?

Infelizmente, no centro desta resposta estará, em primeiro lugar, aquilo que o Benfica conseguirá ou não fazer. Do ponto de vista de qualidade de plantel, o Benfica parte à frente dos adversários. Nas lutas nos corredores do poder, é uma evidência à vista de todos que o Benfica recuperou um respeito que os coloca bem mais protegidos de erros alheios do que estavam no passado.

Isto não quer dizer que o Sporting não tenha as suas hipóteses de conquistar títulos em 2014/15. Acima de tudo significa que o nosso sucesso não dependerá apenas de nós, mas também dos erros que os nossos adversários possam cometer durante o defeso e com a época a decorrer. Se todos os clubes fizerem o seu trabalho de forma competente, a diferença de orçamentos e a influência nas instâncias de poder continua a ser um handicap impossível de ignorar, colocando o Sporting num patamar de favoritismo inferior em relação ao Porto e, sobretudo, em relação ao Benfica.

Muito do que será a próxima época ficará definido no trabalho que os clubes realizarem até agosto, cada um com os seus próprios problemas e desafios pela frente.


Sporting

Na minha opinião, a mudança de treinador deixa-nos mais longe do título do que estaríamos se Leonardo Jardim continuasse como treinador do Sporting. No entanto, Marco Silva era a melhor alternativa disponível para dar continuidade ao trabalho feito na época que passou. O trabalho que fez no Estoril é notável e parece-me que existem condições para que possa demonstrar toda a sua competência num clube cada vez mais organizado e estável. Com o tempo, tenho confiança que Marco Silva conseguirá atingir (e quem sabe superar) o excelente trabalho de Leonardo Jardim.

Arrumada de forma muito satisfatória a questão do treinador, os desafios do Sporting são vários. Em primeiro lugar, parece-me importantíssimo segurar Rui Patrício, Rojo, e William Carvalho, o que poderá não ser uma tarefa fácil. O orçamento da próxima época não está dependente de vendas (as receitas da Liga dos Campeões e dos direitos televisivos cobrem os €25M de orçamento referidos por Bruno de Carvalho), mas o assédio de grandes clubes europeus e o desejo dos jogadores em experimentar outros campeonatos podem ter uma palavra a dizer. Neste aspeto, estou convencido que o William ficará. Acredito que Patrício saia se houver uma boa proposta, e (infelizmente) penso que a saída de Rojo será inevitável.

Independentemente das saídas, o plantel terá que ser sempre reforçado em várias posições. Havendo pouco dinheiro para gastar, o Sporting terá sempre mais dificuldades em acertar em pleno nas contratações do que os seus rivais. A abordagem usada em procurar jogadores em mercados menos visíveis e mais acessíveis parece-me interessante. O problema é que as equipas de sucesso raramente se constroem exclusivamente à base de jogadores jovens com potencial. 


Porto

Honestamente, não me parece que na próxima época o Porto tenha condições de se bater de igual para igual com um Benfica de poderio idêntico ao deste ano. Parece-me no entanto perfeitamente possível que a prestação do Porto se situe uns bons furos acima do que fizeram este ano, bastando para isso construírem um plantel mais equilibrado e afastando jogadores que claramente não têm vontade de continuar.

No entanto, o paradoxo da construção do plantel do Porto está no facto de os jogadores que querem sair serem difíceis de substituir a curto prazo -- nomeadamente Jackson e Fernando. Retirando esses jogadores, sobra uma equipa jovem que terá a tarefa complicada de lutar contra os fantasmas que esta época criou. 

Existe muito talento: Fabiano, Danilo, Alex Sandro, Mangala, Quaresma (se passar a bola), Quintero, Ghilas, são uma boa base para começar. Mas ao contrário do que o Porto tem conseguido ao longo da última década, não haverá em campo nenhum líder que seja uma voz de comando e experiência, nem nenhum desequilibrador nato ao nível de um Falcao, Jackson, James, ou Hulk.

Há no entanto que considerar a falada reaproximação entre o Porto e Jorge Mendes, possivelmente uma forma salomónica que Pinto da Costa encontrou para tentar resolver as fraturas existentes na estrutura. Por outro lado, não se pode ignorar a situação financeira do Porto. Apesar de o Porto ser o clube grande com contas mais saudáveis, os rumores de problemas de tesouraria e a realidade do desequilíbrio orçamental que o 1º semestre do R&C revelou, poderão ser um fator importante na capacidade de reforço do plantel.


Benfica

A grande incógnita está em saber qual o nível de mexidas que haverá no plantel. A saída de Rodrigo parece inevitável. André Gomes também deverá continuar a carreira noutro lado, mas o impacto da sua saída será reduzida. Siqueira e Sílvio são emprestados. O brasileiro parece ter bastantes interessados, o que obrigará o Benfica a ter que pagar por inteiro o valor de opção de €7M, caso queira continuar a contar com ele.

Fora isso, quantas saídas mais haverão?

Dependerá muito do esforço financeiro que os bancos estiverem na disposição de tolerar a Vieira. Comentadores ligados ao Benfica vão dizendo que deverão sair à volta de 4 jogadores. Garay parece uma inevitabilidade. O problema é que tendo o Benfica apenas 40% do passe, o jogador renderá no máximo €8M aos cofres do clube. Fala-se também no interesse de vários clubes em Enzo e Gaitan, que foram as estrelas da equipa, pelo que pelo menos um dos jogadores deverá sair. Enzo será mais complicado de substituir. Gaitan seria um mal menor, pois o Benfica ainda ficaria muito bem servido de extremos como Markovic e Sálvio.

Para além disso, Luisão não caminha para novo, e Cardozo, que foi fundamental para manter o Benfica dentro da corrida do campeonato e taça entre setembro e novembro, parece estar com um pé fora da Luz.

E há, claro, a questão do treinador. Para mim é o ponto chave em relação à próxima época. Mesmo que saíssem Rodrigo, Garay, Enzo, e Gaitan, para mim o Benfica continuaria a ser de longe o favorito. Mas saindo Jesus estou convencido que as hipóteses de revalidação do título deixariam de ser tão elevadas. 

São muitas incógnitas, mas é preciso não esquecer que o Benfica tem o poder de decisão em relação à resolução da maior parte dos casos. Seria para mim uma surpresa se o Benfica não fizesse tudo ao seu alcance para manter a equipa que tantas alegrias deu aos seus adeptos o mais intacta possível.