quinta-feira, 30 de julho de 2015

Como moldar os acontecimentos em função dos preconceitos pessoais, por António Varela

Quiseram as circunstâncias que Sporting e Porto, dois clubes com relações cortadas cujos dirigentes se envolveram em acusações, provocações e insultos ao longo dos últimos dois anos, tivessem posições convergentes em dois assuntos de grande importância do futebol português que foram notícia ao longo do mês de julho: o sorteio dos árbitros e a eleição do presidente da Liga.

De uma coisa ninguém duvidará: em ambas as situações foi o Sporting o primeiro clube a procurar uma solução alternativa à nomeação dos árbitros e à liderança de Luís Duque. E em ambas as situações a mudança de posição do Porto foi algo surpreendente, mas uma vez assumida o clube (pela voz de Pinto da Costa) explicou publica e repetidamente os motivos que o levou a querer o sorteio dos árbitros já para a próxima época e a apoiar Pedro Proença nas eleições da última terça-feira.

Daí que, por muitas voltas que tente dar ao meu limitado cérebro, não consiga entender por que motivo o jornalista António Varela escreveu o seguinte na edição de ontem do Record:


Dou de barato que o poder do Porto nos bastidores do futebol português é muito superior ao do Sporting, mas daí a alguém dizer que o sorteio dos árbitros foi rejeitado devido ao facto de a sua defesa ter ficado entregue ao Sporting e que a eleição de Pedro Proença se concretizou apenas porque o Porto tomou conta da ocorrência - como se ambos os clubes não tivessem capacidade para combater mais que uma guerra em simultâneo - parece-me um produto de uma mente que só pode ser doentiamente preconceituosa em relação ao Sporting e ao seu presidente. O que na realidade, no caso de António Varela, não é nada que surpreenda.

Mas nem é isto o mais inacreditável. Com a devida vénia ao Álamo, do blogue Leoninamente, que muito oportunamente se apercebeu daquilo que vou escrever já de seguida, António Varela conseguiu uma proeza ainda mais assinalável.

Ao ter escrito "Na semana passada, Pinto da Costa tirou férias e deixou a defesa do sorteio dos árbitros entregue ao Sporting", dando a entender que o Porto não se incomodou muito com o tema do sorteio, é estranho que o mesmo jornalista tenha escrito - apenas 13 dias antes - o seguinte:


É caso para ficarmos confusos: afinal Pinto da Costa agarrou a ideia do sorteio dos árbitros com as duas mãos ou tirou férias? Antes o Porto aparecia como subalterno no Sporting, agora o Sporting é uma personagem marginal no processo? Haja paciência para tamanha falta de coerência.

Bruno de Carvalho não tem tido uma vida simples desde que chegou à presidência do Sporting. O comentário desportivo português está carregado de mentes iluminadas que só consegue avaliar a sua atuação de uma forma: se Bruno de Carvalho falha no quer que seja é porque é incompetente, nada mais que um chefe de claque que não consegue triunfar num dirigismo de homens; se por acaso calha ter sucesso é porque o mérito é atribuível a outros - treinador, jogadores, banca, antiga direção, outros clubes, you name it.

Episódios deste tipo já são um hábito há muito. António Varela é apenas um caso entre várias mentes iluminadas com demasiado tempo de antena na nossa comunicação social, e cujo comentário é ditado exclusivamente pelos seguintes critérios:

1. Preconceitos pessoais
2. Narrativas encomendadas
3. Resultados

Sendo que o 3 acaba por se moldar em função de 1 e 2. Tudo o resto é acessório.