segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Jorge Jesus e a Catch-22

"Catch-22" é um livro satírico sobre uma unidade da força aérea americana durante a segunda guerra mundial. O protagonista, Yossarian, capitão de um bombardeiro B-25, tenta a todo o custo voltar para casa por baixa psiquiátrica argumentando que está maluco. No entanto, há uma diretiva burocrática, a Catch-22, que diz que quem argumenta estar maluco para escapar à guerra está na realidade a revelar uma enorme saúde mental, e por isso não pode ser dispensado do serviço. Ou seja, se está maluco e pede para ir para casa é considerado mentalmente são e tem que continuar a combater, e se não está maluco continua também a combater.

O termo Catch-22 pegou e é agora usado nos EUA como uma expressão que descreve uma situação paradoxal do qual um indivíduo não pode escapar devido a regras contraditórias.

Jorge Jesus é um homem que foi enfiado numa situação Catch-22. 

Todos nos lembramos que até 11 de Maio era unânime que Jesus tinha colocado o Benfica a praticar o melhor futebol em Portugal durante a época passada, tinha conseguido levar a equipa a disputar três competições até ao seu final, e arriscava-se a conseguir uma das melhores temporada da história do clube. No entanto, um lance fortuito já em tempo de descontos saído dos pés de um jogador improvável acabou por tirar o campeonato que parecia não ir fugir ao Benfica. Depois, na final da Liga Europa, após ter feito um fantástico jogo e merecer a vitória contra o Chelsea, um lance de bola parada também nos descontos tirou o título europeu ao Benfica. Finalmente, na final da Taça com o Guimarães, um jogo que parecia controlado foi entregue ao adversário após um erro individual de Artur. Arrasado psicologicamente, o Benfica perdeu em duas semanas as três competições em que estava envolvido.

A opinião pública não perdeu tempo a identificar o problema. A tática de Jesus é suicida, dá para ganhar a Moreirenses mas é curta contra Portos e Chelseas. Matic precisa de um jogador ao lado, senão o Benfica perde o meio-campo contra equipas de nível superior. Os laterais são demasiado ofensivos, os extremos não ajudam a defender e o meio-campo tem poucos elementos.

Jesus, pressionado por todos os lados, decidiu fazer a vontade aos seus críticos. O Benfica contratou Fejsa. Nos dois ou três primeiros jogos choveram elogios. Fejsa dá consistência defensiva. Fejsa é mais completo que Javi García. O Benfica tinha conseguido dois jogos sem sofrer golos. 

No entanto, seguiram-se depois dois resultados negativos contra Belenenses e PSG. De repente, Fejsa impede que Matic possa jogar na posição 6, onde é um dos melhores do mundo. Fejsa não dá profundidade ofensiva à equipa. Fejsa empurra Enzo para o flanco direito, onde não rende o mesmo. Fejsa tira o lugar ou a Lima, ou a Djuricic ou a Cardozo, e contra equipas mais fracas a equipa não consegue ser suficientemente forte ofensivamente para abrir defesas fechadas.

O Benfica terminou o campeonato passado com 77 pontos. Em 30 jogos, empatou 5 jogos e perdeu 1. Se não tivesse ido tão longe na Liga Europa dificilmente deixaria de ser campeão. Os 77 pontos que conseguiu, mesmo jogando em todas as competições quase até ao fim (foi eliminado na Taça da Liga nas meias-finais, nos penalties), dariam para ganhar 5 dos últimos 7 campeonatos (desde que passaram a haver apenas 16 equipas na primeira divisão).

Jorge Jesus tem defeitos que todos conhecemos. É arrogante, comunica pessimamente e é um mau líder pois colhe para si os louros das vitórias e tenta-se descartar da responsabilidade das derrotas. Mas tem uma grande qualidade: percebe de futebol como poucos. O grande erro que cometeu foi ter cedido às enormes pressões que lhe caíram de todos os lados, e mudado uma fórmula que estava condenada a ter sucesso nas competições nacionais e resultados medianos na Liga dos Campeões. Mas como há gente acima de si que sonha ganhar a Liga dos Campeões este ano, teve mesmo que mudar.

Jesus está de facto em fim de ciclo. Não por vontade própria ou por falta de qualidade para conseguir a vitória no campeonato, mas por estar embrulhado numa situação paradoxal. Para ambicionar chegar mais longe na Liga dos Campeões, tem que montar uma equipa rotinada com Fejsa + Matic que lhe dê mais solidez. Mas assim, vai provavelmente perder pontos no campeonato que não perderia se tivesse rotinado uma equipa mais ofensiva. Mas de qualquer forma existem adversários na Liga dos Campeões que são de um nível muito superior, e por isso provavelmente terá uma carreira não tão longa quanto o seu presidente deseja, pois na melhor das hipóteses dará para chegar aos quartos de final.

Ou seja, Jorge Jesus não tem forma de sair vitorioso. Catch-22.