A reação de Benfica e Porto contra o Sporting
A capa de ontem do Record pode ser interpretada de várias formas. Deve ser, em primeiro lugar, encarada como uma simples constatação das reações de Porto e Benfica à tomada de posição do Sporting perante os prejuízos de que foi alvo.
É claro que, depois de constatarmos o óbvio, podemos questionarmo-nos sobre a teatralização da capa, que mostra Pinto da Costa e Vieira encostadinhos, a olhar com um ar meio desconfiado para um Bruno de Carvalho amuado e de braços cruzados, dando ênfase à palavra JUNTOS. Contra o Sporting.
Não sei se o objetivo de quem arranjou esta capa era ter piada, exibir uma frase de mobilização anti-sportinguista, ou simplesmente chamar a atenção. Estou mais inclinado para a última hipótese.
Se há alguém que deve sentir-se ofendido com esta capa, na minha opinião, são os benfiquistas. Após tantos anos a diabolizarem Pinto da Costa e a intitularem-se como os grandes defensores da verdade desportiva em Portugal, deve ser particularmente irritante verem o seu líder encostadinho ao arqui-inimigo opondo-se ao único clube que realmente tem feito algo para tentar aumentar a transparência no nosso futebol.
Mas voltando ao que realmente interessa, esta capa e a forma como está construída é algo que não me preocupa minimamente. Após os ataques que o presidente do Sporting fez, dizendo explicitamente que os beneficiados diretos com o prejuízo de 7 pontos foram precisamente Porto e Benfica, não podemos ficar ofendidos ou intimidados pela resposta destes senhores.
Mas olhando um pouco para além do valor facial do que disseram, o que me parece mais relevante na forma como Porto e Benfica reagiram é que:
Tivesse o Porto derrotado o Sporting, e provavelmente Vieira e Pinto da Costa deixariam Bruno de Carvalho a falar sozinho. Aliás, tem sido essa a postura de Porto e Benfica nos últimos anos, resultado de um acordo tácito entre os dois clubes que tem o objetivo de empurrar o Sporting do estatuto de grande clube nacional, de forma a poderem repartir tranquilamente os espólios das qualificações diretas para a Liga dos Campeões e das verbas de um mercado publicitário cada vez mais curto.
Quando as comadres realmente se zangam
De tempos a tempos, Vieira e Pinto da Costa também protestam quando se sentem penalizados face ao rival, mas raramente se atacam um ao outro de forma direta. Não admira, pois são duas faces da mesma moeda, em que um foi professor e o outro aluno, conhecendo cada um os métodos que o outro utiliza. Havendo um certo equilíbrio de favores dos agentes do futebol para ambos, Benfica e Porto ficam calados, preferindo ajustar as contas mexendo os cordelinhos dos fantoches que possuem nas instâncias de poder do futebol.
As comadres só se zangam quando começa a haver um grande desequilíbrio nos serviços prestados a uma e a outra. E quando isso acontece temos alguns vislumbres de como as coisas realmente funcionam, pois o ofendido é obrigado a levantar um pouquinho o véu que cobre a podridão em que ambos se habituaram a movimentar.
Por exemplo, recuemos a Setembro de 2013. O Benfica já se considerava prejudicado nos jogos com o Sporting e com o Guimarães. O Porto já tinha sido favorecido com um erro que lhe deu a vitória contra o Paços, e acabava de voltar a ser beneficiado com um penálti escandaloso inventado por Proença contra o Guimarães que lhes valeu 3 pontos. No dia imediatamente a seguir ao Porto - Guimarães, o Benfica volta a ser prejudicado, em casa contra o Belenenses, num jogo que acabaria empatado.
Perante tamanha injustiça na distribuição de favores, a reação de Vieira foi esta:
in maisfutebol.pt |
Vieira propositadamente revelou uns detalhes sobre os métodos utilizados para influenciar resultados, e o aviso foi levado muito a sério. Coincidência, ou talvez não, o Benfica não voltou a ser prejudicado pelas arbitragens durante largos meses.
O maior elogio que nos poderiam fazer
É por isso que considero que esta tomada de posição simultânea dos presidentes de Benfica e Porto é o melhor elogio que nos podem fazer. Na primeira volta, Bruno de Carvalho espicaçou várias vezes os dirigentes do Porto na véspera do Porto - Sporting. O Porto não reagiu, e choveram elogios pelo facto de terem deixado o presidente do Sporting a falar sozinho. Era mais fácil ficarem calados nessa altura, pois não só o Porto ganhou ao Sporting, como também tinha 5 pontos de avanço sobre o 2º classificado.
O facto de aparecerem agora a falar contra o Sporting acaba por ser um bom sinal. Sinal de que estão incomodados -- mais o Porto que o Benfica, por motivos óbvios, que também acaba por determinar o nível de contundência de cada um nas suas afirmações.
Mas não há nada de novo nesta união entre os dois clubes. Pela calada, sempre houve uma concertação bem definida entre as duas pessoas mais poderosas do futebol português no que toca ao tratamento extra-futebolístico que o Sporting deve receber.
O facto de abandonarem a postura silenciosa que os caracterizava face ao Sporting demonstra que estão incomodados. E isso é uma coisa boa.