quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Atenção aos unicórnios vermelhos

Se vos disserem que aquilo que estão a ver é um unicórnio vermelho, verifiquem primeiro se não é apenas um cavalo pintado com um corneto colado na testa.

Quando uma notícia parece ser demasiado boa para ser verdade, geralmente é porque nem tudo está a ser contado. Isto a propósito do acordo anunciado ontem entre o Benfica e a NOS, mas que também se aplica a isto:


As notícias que davam conta de um contrato de patrocínio da Emirates de oito milhões de euros anuais - e que podem chegar aos dez milhões -, ou seja, quase o dobro daquilo que era pago pela PT, tiveram as seguintes consequências na rubrica de patrocínios nas contas do Benfica:

R&C da Benfica SAD, 1º trimestre de 2015/16

Ou seja, apesar de o Benfica ter mantido os contratos com os restantes main sponsors - como a Adidas, Sagres ou CGD -, os valores recebidos em patrocínios e publicidade diminuíram da época passada para esta, quando o expectável seria que subissem significativamente. Há portanto aqui qualquer coisa que não encaixa bem e que deveria ser alvo de explicações adicionais.

Quanto ao acordo de direitos televisivos, clube e operador anunciaram esclarecimentos para dia 10. Para já ainda existe imensa poeira no ar e muitas questões a clarificar, como:
  • Qual o valor efetivo a receber nos 3 anos de contrato garantido?
  • Ao fim dos 3 anos basta mesmo uma das partes acionar a opção para o acordo continuar válido? 
  • Que papel terá a BTV depois disto? 
  • A centralização dos direitos que tanto interessou os dirigentes benfiquistas há uns meses deixou de interessar?
  • Qual o real objetivo da NOS com esta ação?
  • Que valor antecipado do contrato será pago de imediato ao Benfica? Estará este acordo de alguma forma ligado à imensa dívida que existe para pagar no prazo de um ano? O facto de BCP e Novo Banco - os principais credores do Benfica - serem também acionistas da Sport TV teve alguma influência neste desfecho? Ou seja, terá havido pressão da banca junto do Benfica para assinar este acordo?

Algumas notas rápidas:
  • É legítimo pensar que a transmissão dos jogos na BTV não era afinal um negócio assim tão fabuloso quanto os dirigentes benfiquistas afirmavam.
  • Mais uma vez, fica provado que aquilo que Luís Filipe Vieira diz não deve ser levado à letra.

  • A negociação da NOS pode ser vista como uma espécie de salvação de face - assinar diretamente com a Sport TV seria um número de contorcionismo de grande nível depois de tudo o que foi dito pelos dirigentes benfiquistas nos últimos três anos. Mas a verdade é que os jogos do Benfica voltarão mesmo a ser transmitidos pela Sport TV.
  • Não se pode excluir a hipótese de existir muita maquilhagem nestes 400 milhões. De que outra forma se justificaria aos sócios o fim do projeto da BTV, se não fosse por uma proposta aparentemente irrecusável? 
  • Até que ponto a Sport TV conseguirá deixar de dar prejuízos? Faz sentido que os jogos em casa do Benfica, só por si, atraiam assinantes suficientes para cobrir o investimento agora feito? É preciso não esquecer que os benfiquistas já só podiam ver os jogos fora do seu clube do campeonato e Champions (para além da Taça de Portugal) na Sport TV.
  • Independentemente dos pontos anteriores, sempre foi claro para mim que a negociação com a Sport TV seria sempre um cenário a considerar caso o Benfica não se sentisse satisfeito com os resultados do projeto BTV, conforme escrevi AQUI em agosto de 2013.

  • Mesmo que os valores do contrato não sejam os 40 milhões limpos que se falam, é normal que o Benfica consiga agora um contrato mais favorável que os de Sporting e Porto: obteve alguma força negocial através da BTV, é o clube com mais adeptos, e os rivais estão a cumprir a segunda metade de acordos de longa duração com a Sport TV. É sabido que quem assina contratos de longa duração arrisca-se a ser ultrapassado nos últimos anos, como aliás aconteceu também com o Benfica antes de decidir transmitir os seus próprios jogos. Há que considerar a hipótese de que os valores deste acordo com a NOS poderão ser menos interessantes daqui a 7 ou 8 anos, mas o contrário também pode ser válido. O tempo encarregar-se-á de mostrar qual das partes acabou por conseguir o melhor negócio.