quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Quanto vale um Kit Cortesia?

Tive o cuidado de rever a forma como Pedro Guerra reagiu à revelação que Bruno de Carvalho fez do Kit Cortesia, uma caixa evocativa da memória de Eusébio que continha uma camisola víntage, e ainda um voucher de jantar para quatro pessoas na Catedral da Cerveja ou no Museu da Cerveja. O diretor de conteúdos da Benfica TV não desmentiu as palavras de Bruno de Carvalho, preferindo mostrar a sua indignação pelo inaceitável ataque à memória desse (indiscutível) símbolo nacional que é Eusébio da Silva Ferreira. Areia para os olhos de quem foi apanhado de calças na mão e não sabia o que dizer, já que é claro para toda a gente que não era a figura de Eusébio que estava ali em causa.

No dia seguinte esperou-se por uma reação do Benfica... mas nada. Apenas a APAF fez uma declaração em que tacitamente admite a existência daquelas ofertas.

Ficou reservada para o final da tarde e noite a resposta do Benfica através de alguns dos seus habituais intermediários. Vou destacar dois. Comecemos por João Malheiro:


Portanto, ficamos totalmente esclarecidos que o Kit Cortesia existe. Vamos agora saber mais detalhes pelo especialista da TVI24 em retalho, Rui Pedro Braz:


Rui Pedro Braz diz que gosta de ser rigoroso mas começou mal: o limite colocado pela UEFA não são €200 mas sim 200 Francos Suíços, o que corresponde a €183,50 ao câmbio atual. Depois diz que a camisola tem um PVP de €59,90 (qualquer visita ao site o comprova) e um preço de custo de €24 (que é uma informação que só pode ser o próprio clube a fornecer-lhe).

Neste caso o preço de custo é irrelevante, porque o que é importante é o valor comercial da oferta. Caso contrário qualquer clube poderia dar artigos de valor bem mais significativo - como relógios de luxo ou peças de joalheria - desde que pagos do bolso de algum particular. Assim o "preço de custo" para o clube seria zero. De qualquer forma os 60€ ainda estão muito longe do tal limite de 183€.


Passemos ao voucher. Rui Pedro Braz revela que apenas 7 árbitros os utilizaram em 2014/15, de forma a desvalorizar a dimensão da acusação. Mas mais uma vez está a ver o assunto de forma parcial, pelo lado que mais lhe convém. Rui Pedro Braz teria que olhar para as duas faces da questão em análise, pois é tão relevante para o caso saber que árbitros utilizaram os vouchers como saber quantos vouchers o Benfica efetivamente ofereceu.

De qualquer forma ficámos a saber que há sete árbitros a mais do que aquilo que Fontelas Gomes imaginaria a usufruir do convite para jantar do Benfica. E também que o Benfica controla muito de perto e de forma precisa o número de árbitros (e seguramente também saberão os nomes dos árbitros em concreto) que aceitaram a sua gentil oferta. Seguramente é uma informação que poderá vir a ter a sua utilidade no futuro.

E já que estamos a ser tão minuciosos em relação ao valor da camisola, já agora também convinha saber quanto valerá em média um jantar para quatro pessoas nos estabelecimentos propostos pelo Benfica. Assumindo que os árbitros e seus acompanhantes não abusam da generosidade do atual campeão nacional, vamos criar o seguinte cenário: o grupo de quatro pessoas pedirá duas entradas para partilhar, um prato de carne para cada, seis cervejas (as garrafas de vinho tinto custam €35, um abuso), quatro sobremesas e café.

Carta do Museu da Cerveja - LINK - dados do site atualizados há 11 dias (obrigado, Ace-XXI!)

Ora bem, duas cestinhas de pão (€6,40), um prato de presunto (€12,50) e uma tábua de queijos (€15), quatro bifes à portuguesa (4 x €20), 6 cervejas (a média é de 5€ cada, logo dá €30), 4 maçãs assadas (€16) e 2 cafés (é de noite e há quem não queira abusar da cafeína, 2,50€). Se entregassem a conta para este jantar, que não teve qualquer tipo de excentricidades, e haveria que pagar €164,90. Junte-se a camisola (a preço de loja ou a preço de custo, é indiferente para o caso) e ficamos acima do tal patamar de referência que a UEFA definiu. Repito, sem qualquer abuso no jantar.

Isto significa que estamos perante casos de suborno? É evidente que não. Mas nem querendo entrar na questão de princípio que deveria levar profissionais bem pagos a recusar este tipo de cortesias, o facto é que há regras que estão a ser violadas de duas formas - um clube a oferecer brindes de valor superior ao permitido e árbitros a aceitá-los - e como tal as entidades responsáveis terão obrigatoriamente que investigar estas ofertas de forma completa e detalhada. Doa a quem doer.