terça-feira, 10 de janeiro de 2017

M*rdas que só mesmo connosco, nº 11: Um fora-de-jogo cósmico

O futebol português é pródigo em casos polémicos. A qualidade das arbitragens é a que se sabe, e os erros vão-se sucedendo a um ritmo galopante. Umas vezes por responsabilidade dos árbitros, outras vezes por responsabilidade dos fiscais-de-linha, e outras até por responsabilidade do quarto árbitro. Mas o que não é definitivamente usual - nem sequer no futebol português - é um fiscal-de-linha tomar uma decisão correta num fora-de-jogo e, à vista de todos, ser convencido pelo árbitro de que esse fora-de-jogo não existiu.

Refiro-me, como todos já devem ter percebido, a um dos maiores escândalos de arbitragem da época passada: a decisão de Cosme Machado em validar um golo ilegal à Académica em Alvalade.


Contextualizando o lance: depois de um golo madrugador da Académica, o Sporting conseguiu dar a reviravolta no resultado por Adrien e Bryan Ruiz, colocando-se numa vantagem de 2-1. Pelo meio, Cosme já tinha perdoado um penálti cometido sobre Carlos Mané (quando a Académica vencia por 0-1) e tinha expulsado Jorge Jesus por este ter protestado um amarelo mostrado a Adrien Silva por... ter tentado marcar rapidamente um livre (quando o resultado estava em 1-1).

Continuava o Sporting em vantagem no marcador quando, aos 59', há um livre a favor da Académica a meio do meio-campo do Sporting. A bola é batida para a área, Rui Patrício sai dos postes e soca a bola, que vai cair no local onde estava um jogador da Académica. Este cabeceia, na direção da baliza, mas Ewerton, o homem mais recuado, estava em posição de a aliviar. Não consegue aliviá-la em condições, no entanto, porque João Real o pressiona, partindo de uma posição de fora-de-jogo. Ewerton acaba por cabecear para trás, a bola entra na baliza e estava feito o empate.

Na realidade, não estava feito o empate, pois o fiscal-de-linha apercebeu-se da irregularidade e, de imediato, assinalou fora-de-jogo ao avançado da Académica. Alvalade suspira de alívio mas, passados uns segundos, assiste, incrédulo, a uma conferência entre Cosme Machado e o seu árbitro-assistente junto à linha lateral, ambos rodeados por vários jogadores da Académica. E, perante o espanto geral, após uma longa conversa... o árbitro aponta para o círculo central e valida o golo.

O árbitro convenceu o fiscal-de-linha a mudar a sua decisão. Surreal.

Aqui fica o lance, para refrescar a memória:


Uma decisão grotesca que não tem qualquer base lógica de sustentação, ainda para mais porque, como se pode ver na sequência de imagens abaixo, o árbitro não estava numa posição minimamente favorável para avaliar a existência ou não de fora-de-jogo.


Como é evidente, os jogadores e adeptos sportinguistas ficaram em estado de choque perante o roubo à mão armada que ali ocorria - menos de um mês depois da Xistralhada do Guimarães - Benfica (esse, sim, o maior escândalo de arbitragem da época, com 3 penáltis e 2 cartões vermelhos perdoados ao Benfica, para além de outras decisões ridículas - LINK - e um empurrão de Xistra a um jogador do V. Guimarães que sofreu uma falta clara - LINK), que manteve a equipa de Rui Vitória na luta pelo campeonato.

Felizmente, acabaria por ser reposta a justiça no resultado, com um golo de Montero marcado aos 84'. O Sporting venceu por 3-2.

Mas a história não acabaria aqui. Numa atitude raríssima, Cosme Machado deu, com a benção de Vítor Pereira, uma entrevista à SIC no dia seguinte ao jogo. Admitiu o erro, deu umas explicações mal amanhadas que não encontram correspondência com aquilo que todos puderam ver, mas também não pediu desculpa. Uma pobre tentativa de limpeza de imagem de um ato mal-intencionado que acabou por não surtir o efeito final desejado.


No final da época, Cosme Machado foi despromovido à 2ª categoria de árbitros, e decidiu terminar a carreira. No entanto, o seu fraco talento para o apito foi suficiente para não o deixar descalço: no dia seguinte a ter abandonado a carreira, foi contratado pelo Braga de António Salvador para as funções de conselheiro de arbitragem.