Realizou-se hoje a Festa dos Fundos organizada pelas ligas portuguesa e espanhola num hotel em Madrid. O evento foi transmitido por streaming pelo site da liga espanhola, e garanto-vos que foi entretenimento de 1ª categoria: um festival de lamentação, desonestidade intelectual e incoerência que faz as delícias de qualquer sportinguista que deseje o fim dos fundos.
Só acompanhei o evento a partir do painel 2 (regulação vs. proibição), por isso vou apenas descrever o que se passou a partir daqui.
Ao contrário do que o programa previa, o painel 2 não incluiu qualquer representante da UEFA, sobrando apenas figuras ligadas a clubes ou organizações que apoiam os fundos. Muito democrático.
Começou por falar Marcos Motta, que apontou (e com razão) algumas situações discutíveis do futebol europeu atual - como os patrocínios da Gazprom a vários clubes que participam nas mesmas competições e a concorrência desleal dos clubes que têm investidores que injetam grandes quantias de dinheiro. Mas o facto de serem pontos pertinentes não deixam de soar como uma discussão entre as nádegas sobre quem é mais favorecido pelas arbitragens ou pelos emprestados que subitamente adoecem: os erros a favor dos outros nunca deverão justificar os erros a seu favor.
O representante do Sevilla lamentou-se que sem os fundos o clube não será capaz de competir com os clubes maiores na contratação dos melhores jogadores (como se hoje em dia já fossem). Depois foi a vez do representante do Porto:
Basicamente a sua intervenção foi uma lamentação em como a proibição dos fundos coloca em causa a principal fonte de receitas do Porto - a venda de jogadores -, pois são fundamentais para conseguir contratar os jogadores de maior potencial.
Seguiu-se o representante do Corinthians, que começou a sua intervenção desta forma:
Aquilo que já era evidente para todos - que a iniciativa era tão ou mais da Doyen do que das próprias ligas - ficou assim exposto publicamente. Continuou a defesa dos fundos usando uma argumentação absolutamente surreal, como podem ver através destes comentários no Twitter:
Sim, segundo o representante do Corinthians os fundos são benéficos porque é graças a eles que podem formar (!) jogadores. E chegou ao ponto de dizer que até as transmissões televisivas causam mais problemas que os fundos porque "retiram o público da arquibancada". Valeu tudo, mesmo.
Terminado este painel, passou-se para o seguinte ponto da agenda:
E eis a primeira grande surpresa da manhã. Mário Celso Petraglia vinha acompanhado por esta pessoa:
Era mesmo o "nosso" Pedro Sousa. Não sei porquê, mas não fiquei particularmente admirado por vê-lo naquelas companhias. Pedro Sousa limitou-se a apresentar o presidente do Atlético Paranaense, que iniciou a sua prestação com uma longa exposição do trabalho que tem feito no clube para o dotar de infraestruturas e de uma formação de excelência. Daí seguiu para a importância que os fundos têm no seu projeto para o futebol - o que é uma autêntica contradição. Num país como o Brasil, em que os fundos gerem os destinos de miúdos desde muito novos, desenvolvê-los e vendê-los bem deveria ser a forma mais eficaz de gerar receitas. Aparentemente os fundos é que salvam esse modelo todo ao ficarem com a maior parte das vendas que poderiam pertencer na totalidade aos clubes. Vá-se lá perceber.
De seguida, chegou a sessão de encerramento, que no programa indicava como oradores os presidentes de ambas as ligas.
No entanto, não foi Luís Duque a falar. Aparentemente o facto de ser um presidente não remunerado não lhe permitiu ter dinheiro para pagar o bilhete de avião até Madrid. Quem falou foi João Martins, que faz parte da comissão executiva da Liga. João Martins é um antigo dirigente do Guimarães que foi um dos principais impulsionadores da destituição de Mário Figueiredo e da eleição de Luís Duque. Folgo em saber que foi devidamente recompensado. Infelizmente, a sua apresentação foi de uma pobreza extrema.
Usou depois da palavra o presidente da Liga Espanhola, Javier Tebas. Notou-se que a sua principal preocupação com o fim dos fundos é o aumento da distância que separa os clubes médios espanhóis dos clubes médios ingleses. E aqui está a maior contradição de todas: os clubes médios ingleses têm muitas receitas porque os direitos televisivos são distribuídos de forma muito equilibrada, enquanto que em Espanha há dois que açambarcam praticamente tudo. Se calhar os fundos não seriam assim tão relevantes caso Real e Barcelona não recebessem uma percentagem tão grande do bolo total.
Terminado o seminário, os participantes reuniram-se no palco para uma foto de família, altura em que Nélio Lucas disse qualquer coisa como isto: "Peço desculpa aos oradores anteriores, mas queria dizer uma última coisa. Sei que as pessoas mais importantes devem ser as últimas a falar, mas não queria deixar de fazer isto.". E eis que...
Quem resumiu bem tudo isto foram o @sportingloewe e o @sporting_soul: