sexta-feira, 17 de abril de 2015

Volta a polémica dos empréstimos e quejandos

Com a aproximação do Belenenses - Benfica na próxima jornada, era inevitável que voltasse à ordem do dia a questão da (não) utilização de jogadores ao serviço de uma equipa contra o clube que os cedeu.

Confesso que neste momento já olho para tudo isto de uma forma mais ligeira: a partir do momento em que o Sporting ficou afastado da luta pelo título, limito-me a aguardar com curiosidade qual o nível de imposições que o Benfica colocará ao seu adversário de sábado, ao mesmo tempo que vou registando a hipocrisia dos queixumes da maior parte dos adeptos portistas (não todos, diga-se), os mesmos que encontram sempre uma justificação plausível para as consecutivas situações do género que também teimam em beneficiá-los - como a ausência do onze de Pedro Moreira na última jornada, de Kléber e Tozé na jornada anterior, a gastroenterite de Tiago Rodrigues há duas jornadas, ou o sumiço de Kayembe há três jornadas - para não falar nas convenientes suspensões de portistas passados ou futuros como André André, André Simões ou Tengarrinha. Até admito que algumas destas situações sejam legítimas e que não passem de coincidências infelizes, mas não vale a pena gastarem energia a tentar convencer o mundo de que todas elas se devem a lesões ou indisposições. Com o histórico que o Porto apresenta neste aspeto particular, estas desculpas são para mim - e acredito que também para os adeptos portistas, mesmo que não o admitam - tão plausíveis como se dissessem que Tiago Rodrigues não pôde ser utilizado por ter sido vítima de um rapto por extra-terrestres enquanto passeava no seu Chevrolet descapotável no deserto do Arizona na companhia da Marilyn Monroe. 

No entanto, a questão da ligação entre Benfica e Belenenses consegue ser libertar um odor particularmente asqueroso. Se as situações individuais entre Porto e Rio Ave, Estoril, Nacional ou Arouca atingem o olfato como um tupperware recém-aberto repleto de ovos podres, os acordos de cavalheiros entre Rui Pedro Soares e Luís Filipe Vieira equivalem a uma vala comum coberta de corpos em decomposição: é que não só há a questão da não utilização dos jogadores do Belenenses emprestados pelo Benfica, mas também dos jogadores do Belenenses sobre quem o Benfica pagou para ter uma cláusula de preferência, dos jogadores do Belenenses sobre quem o Benfica ainda detém percentagens dos direitos económicos, e ainda dos jogadores do Belenenses contratados pelo Benfica para a próxima época. 

Nem na Idade Média as relações entre servos da gleba e senhores feudais apresentavam tamanha dependência e submissão de uns em relação a outros.

E assim continuamos a assistir a situações deste tipo, semana após semana, com a maior parte dos jornais a assobiar para o ar fingindo que nada acontece - o que, em seu abono, significa que tanto A Bola como O Jogo parecem ainda não ter perdido totalmente o sentido de vergonha, face aos imensos telhados de vidro dos clubes que servem. Daí ser de saudar um texto que António Tadeia publicou ontem na sua página de Facebook sobre este tema:



Subscrevendo a generalidade das ideias de António Tadeia - e em particular a imposição de um limite de atletas inscritos e uma severa restrição de empréstimos -, há no entanto um ponto em que discordo. Escreve o jornalista:
O problema não é uns poderem jogar e outros não. O problema é a Liga demitir-se de regulamentar sobre a matéria.

Neste momento, o problema é precisamente uns poderem jogar e outros não. Porque, para o bem e para o mal, existe um regulamento da Liga em vigor que proíbe explicitamente que os clubes que emprestam jogadores a outros. Isso significa que Benfica e Porto estão, consciente e sistematicamente, a violar as regras das competições, e como tal deviam ser punidos por isso. O facto de ser difícil (ou mesmo impossível) de provar é relevante do ponto de vista da aplicação dessas punições, mas nunca poderá tornar esse incumprimento mais aceitável.

A Liga tem que tomar a iniciativa de mudar os regulamentos? Sem dúvida. Não faz sentido manter uma regra que se revela tão ineficaz na sua aplicação e punição. O problema está de facto ainda mais a montante do que diz António Tadeia: antes da incapacidade de regulamentação da liga há que condenar a existência de dois clubes em Portugal que usam de todos os meios possíveis para contornar as regras em seu proveito.