quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A novela peruana

Começando pelo óbvio: no meio de toda esta novela à volta de Carrillo, o Sporting sairá sempre mal da história caso a renovação não se concretize. O peruano chegou muito novo ao Sporting, foi sendo trabalhado e valorizado ao longo de quatro temporadas, trabalho esse que se arrisca a dar um retorno financeiro nulo caso o clube não consiga chegar a acordo com o jogador para prolongar o contrato.

Aqui ficam algumas reflexões sobre a novela peruana que está a bater recordes de audiências em Portugal.


O pecado de adiar a renovação 

Neste momento é fácil criticar a direção por ter deixado arrastar as negociações até um período perigosamente próximo da data em que o jogador passará a ser livre de assinar por outro clube. No entanto, convém que não haja memória curta em relação a este tema. Há apenas um ano e quatro meses, Carrillo foi alvo de uma das maiores assobiadelas coletivas que me lembro de terem sido dirigidas a um jogador nosso. E isto não aconteceu nem no Dragão nem na Luz. Foi em Alvalade, no último jogo da temporada 2013/14, quando Leonardo Jardim o retirou a poucos minutos do intervalo quando perdíamos com o Estoril de Marco Silva.

Eu não consigo entender os adeptos que assobiam a própria equipa durante um jogo - porque têm o final para "dizer" de sua justiça -, mas acho particularmente degradante quando o fazem dirigindo-se a um jogador em particular. Parece óbvio que Carrillo era um dos jogadores menos populares para o universo sportinguista, e faltavam nessa altura dois anos para o final do seu contrato. Será que encarariam a renovação Carrillo como uma prioridade na altura?

Só com Marco Silva é que o peruano aliou ao seu inegável talento a consistência que lhe permitiria assumir o estatuto de titular indiscutível. Ou seja, apenas por volta de outubro / novembro de 2014 é que Carrillo começou a sobressair como um jogador imprescindível à equipa, altura em que começaram também as notícias da intenção do clube renovar com o jogador.

Pode-se alegar que a direção teria a obrigação de antecipar a explosão do jogador. Isso até pode ser verdade, mas eu diria que a esmagadora maioria dos sportinguistas não ajudou em nada o processo pela forma como tratava Carrillo até este se assumir definitivamente como um dos jogadores mais importantes do plantel.


As complicações da renovação

É difícil perceber o que é verdade no meio de tantas informações contraditórias que vão saindo diariamente. Há quem diga que Carrillo quer renovar mas que está preso ao seu contrato com Casareto, que prefere enviá-lo para outras paragens. Há quem diga que o peruano quer experimentar outros campeonatos. E há ainda quem diga que encara com bons olhos uma mudança para Porto ou Benfica.

Ou seja, fica complicado fazer juízos de valor quando há tantas vontades em jogo: a do jogador, a do empresário, e ainda de Pini Zahavi, que detém 50% do passe. A questão do empresário israelita é provavelmente a mais complexa de todas, pois à primeira vista também não tem nada a ganhar com a expiração do contrato - já que perde em definitivo os direitos económicos que detém.

Se é verdade que a direção do Sporting está disposta a pagar a Carrillo um valor acima do que paga a Rui Patrício e Adrien, diria que estão no limite daquilo que pode ser feito. No entanto, esta minha compreensão desapareceria se o entrave nas negociações estiver no valor da cláusula de rescisão - que atualmente está nos €30M. Se o Sporting conseguisse renovar e vender o jogador por €25M seria um grande negócio do ponto de vista financeiro. Será portanto um capricho tentar forçar o aumento da cláusula para os 45 ou 60 milhões da praxe. Havendo abertura dos jogadores para isso, ótimo. Não havendo, não é motivo suficientemente importante para ser um deal-breaker.


E se Carrillo não quiser renovar?

As duas hipóteses em cima da mesa são manter o jogador no plantel e continuar a utilizá-lo normalmente, ou então colocá-lo a treinar com a equipa B. A primeira opção tem a vantagem óbvia de estarmos a aproveitar até ao fim o rendimento desportivo do atleta, que seguramente será muito importante para ficarmos mais perto de alcançar os nossos objetivos para esta época. A segunda opção tem o mérito de abrir espaço a outros jogadores como Mané, Gelson ou Matheus - que sabemos que farão parte do futuro do clube - e de dar um recado da forma de agir para futuros casos de renovações que fiquem num impasse.

Se fosse eu a decidir, com base no que sei (ou seja, aquilo que é público), mantinha Carrillo no plantel até ao fim. Não me parece que faça sentido estarmos a abdicar do seu talento na época em que decidimos apostar forte na conquista do título. Se achámos boa ideia pagar salários altos a jogadores como Teo, Ruiz e Aquilani - que nunca renderão valores significativos numa venda futura -, então parece-me lógico que se olhe para esta última época de Carrillo como um custo de oportunidade e não pelo lado do investimento que nunca terá retorno.

Mas isto é com base no que sei. Se eu estivesse na posse de todos os factos relevantes deste processo, provavelmente decidiria em função do comportamento do jogador para com o clube. Carrillo sempre disse de forma clara o que queria? As suas exigências são razoáveis? A dificuldade em renovar deve-se ao empresário ou ao facto de o Sporting não ter capacidade para igualar essas exigências? Então se dependesse de mim Carrillo continuaria no plantel às ordens do treinador. Carrillo teve comportamentos dúbios e erráticos nas negociações apenas para ganhar tempo e ir mantendo-se a jogar, não tendo qualquer intenção de renovar com o Sporting? Equipa B, nem podia ser de outra forma.