O discurso de Bruno de Carvalho na abertura da Assembleia Geral de ontem foi bastante longo e abordou uma infinidade de temas, mas houve um momento em que fiquei particularmente incomodado - não pela frase em si, mas pela constatação de algo que me perturba há muito enquanto sportinguista: "Eu não me vou poupar a mim. Eu vou defender o Sporting com toda a força, com toda a garra. Eu amo o Sporting. Mas protejam-me, porque senão [as forças que está a combater] dão cabo de mim.".
É triste que o presidente se sinta na necessidade de desabafar desta forma, mas é compreensível por que o fez. Desde que foi eleito, Bruno de Carvalho é provavelmente a pessoa mais criticada em todas as áreas da sociedade portuguesa, provavelmente apenas com a exceção da classe dos banqueiros. No que toca ao futebol é indiscutivelmente o mais atacado. Nem Godinho Lopes, enquanto arrastava o clube para a falência, era alvo de tantas críticas. Nunca houve presidente de clube como Bruno de Carvalho que gozasse de um estado de graça tão curto - ao fim de um par de semanas já era criticado por pressionar a banca (!) nas negociações pós-eleições -, e nunca houve presidente de clube cujas palavras fossem tão criticamente escrutinadas e indevidamente interpretadas, sobretudo por uma questão de forma e raramente em função do conteúdo.
Admito que o estilo de Bruno de Carvalho possa não agradar a muita gente, mas sinceramente não consigo compreender como é possível ainda existir tanta má vontade de tantos sportinguistas em relação a esta direção, depois da evolução que o clube registou em praticamente todas as vertentes ao longo destes dois anos e meio de mandato.
Número de sócios a disparar. Modalidades cada vez mais competitivas. Um pavilhão em construção. Estabilização do futebol de formação. O futebol sénior de regresso aos títulos depois de sete anos de jejum. Um plantel que ano após ano se vai valorizando. Controlo dos problemas financeiros graças a uma gestão rigorosa que exigiu sacrifícios tremendos. Registo de lucros em anos consecutivos, a contrastar com os 115 milhões de prejuízo nos três exercícios que antecederam a entrada desta direção. Alguém imaginava em março de 2013 que tudo isto seria possível?
Face a tudo aquilo que foi alcançado em tão pouco tempo, enoja-me (a palavra é forte mas é a que reflete melhor aquilo que realmente sinto) a facilidade com que se critica certas decisões tomadas pelo presidente, como se o próprio apreciasse dar tiros nos pés só para aparecer nas capas dos jornais. Como se tomasse as decisões mais difíceis sempre de forma intempestiva, sem pesar os prós e os contras de cada uma das opções. Como se o mundo fosse a preto e branco, em que de um lado está a solução perfeita e do outro a catastrófica escolhida por Bruno de Carvalho. Por teimosia, por incompetência, por orgulho, por desonestidade, ou por qualquer outro dos inúmeros defeitos que tanta gente lhe atribui.
Devia ser caso de estudo o facto de o clube não ter fechado as portas no par de meses que se seguiram às eleições, perante esta ausência de qualidades e coleção de defeitos.
Marco Silva, e agora Carrilo: dois dossiers polémicos usados até à exaustão para atacar Bruno de Carvalho. Que se juntam à questão de estar ou não estar sentado no banco de suplentes, de cumprir a execução da auditoria de gestão exigida pelos sócios, do salário do presidente e dos administradores, da guerra aos fundos, da procura de um patamar de relacionamento saudável com os empresários de jogadores, de não prestar vassalagem aos poderes instituídos do futebol que sempre fizeram e continuam a fazer questão de nos infernizar a vida, e a tantas outras coisas que vão servindo sistematicamente de arma de arremesso contra esta direção.
Esta administração NUNCA virou as costas a uma luta em que os melhores interesses do clube estivessem em causa. Seria fácil formar uma legião de avençados a tecer diariamente loas ao seu trabalho e a espalhar contrainformação. Seria fácil dar aos empresários quinhões obscenos das transferências que realizamos. Seria fácil ceder às exigências dos clubes dos jogadores em que estamos interessados para fecharmos as contratações rapidamente. Seria fácil renovar com todos os jogadores a partir do momento em que fazem um par de jogos conseguidos, com aumentos salariais significativos. Seria fácil ir buscar jogadores com cartel, bastando para isso abdicar de uma percentagem significativa de uma futura venda e aceitando a totalidade dos riscos na eventualidade de os atletas não se valorizarem. O problema é que mais cedo ou mais tarde a fatura haveria de aparecer, como descobrimos amargamente no tempo de Godinho Lopes e continuamos a descobrir com as pesadas heranças que esta direção resolveu, continua a resolver, e está condenada a resolver nos anos que se seguirão.
Não quero estar a dizer a cada um como deve julgar ou deixar de julgar o trabalho de Bruno de Carvalho, mas tenho a certeza de uma coisa: perante tudo aquilo que já conseguiu alcançar, o mínimo que todos os sportinguistas lhe podem dar é o benefício da dúvida quando as decisões são polémicas.
Da parte que me toca, não tenho dúvidas que o Sporting tem um presidente com competência demonstrada, a quem não falta coragem para levar a cabo as lutas que têm que ser feitas, e que não deixará de ir ao limite das suas capacidades para conseguir o melhor para o clube. É um presidente jovem que comete erros, mas que saberá aprender com eles, pelo que o normal é que com o tempo se torne ainda melhor presidente do que já é. A única coisa que me preocupa é se, perante os tantos ataques internos e externos de que tem sido alvo, conseguirá manter a férrea determinação que tem revelado até agora. A bem do Sporting, espero que consiga. Mas isso também dependerá muito da atitude dos próprios sportinguistas em relação ao seu presidente.