sábado, 3 de outubro de 2015

"Sejamos isentos!", ou a fina arte de analisar os temas pela metade

Já toda a gente sabe que de Rui Pedro Braz se pode esperar o comentário mais criticamente aguerrido quando o tema é o Sporting ou o seu presidente, e análises mais macias e até reverenciais quando o assunto aborda o Porto e, especialmente, o Benfica. Mas há uma coisa em comum no discurso de Rui Pedro Braz sobre os três grandes: normalmente aborda os temas pela metade, esquecendo-se sistematicamente da metade que menos lhe interessa.

Ontem, na edição da tarde do MaisTabaco 2, conseguiu mais quatro bons exemplos de análises seletivamente incompletas no espaço de 13 (!) minutos.


Caso Sporting / Doyen / Rojo


Rui Pedro Braz diz que o Sporting era obrigado a vender Rojo a partir do momento em que existissem ofertas superiores a 8 milhõe de euros, seguramente suportando-se na cláusula 10.2:


No entanto, Rui Pedro Braz esqueceu-se de um pormenor que pode ser relevante: o Sporting tinha efetivamente a opção de não vender o jogador - tendo que indemnizar a Doyen caso o fundo acionasse a cláusula 10.5. Não é conhecido se tal foi feito formalmente pela Doyen antes de o fundo ter ameaçado com a recusa de Rojo em deixar de treinar.


E, claro, nenhuma análise ao conflito fica completa sem se mencionar a cláusula 14 - o ponto cujo incumprimento pela Doyen serve de base aos argumentos do Sporting no conflito no TAS.



As comissões na compra de Teo Gutierrez




Desconheço neste caso se Rui Pedro Braz mentiu ou se simplesmente é ignorante. Apesar de ser verdade que o Sporting, desde que Bruno de Carvalho assumiu a presidência, tem evitado pagar comissões enquanto comprador, a prática comum de mercado não é essa: os empresários e intermediários conseguem obter comissões dos dois lados das negociações. Não é preciso ir muito longe para ver como isso é frequente. Comecemos pelos R&C's do Porto relativos às épocas 2011/12, 2012/13 e 2013/14:


 

O Benfica não discrimina os valores de intermediação pagos nas aquisições de jogadores, mas a página 105 do R&C de 2013/14 faz uma referência bem explícita à existência desse tipo de despesas:



O caso Porto / Doyen / Imbula


Não era preciso a revelação do documento pelo Football Leaks para chegar à conclusão que o Porto não suportou a totalidade dos €20M de transferência. Mas é extraordinário como Rui Pedro Braz consegue passar ao lado dos dois pontos fundamentais deste caso:

1. A Doyen negou publicamente o financiamento da transferência de Imbula. Uma afirmação que é falsa, pois a Vela (que aparece na minuta) é uma empresa do universo Doyen.



2. Este contrato mostra que o Porto, a Doyen e o investidor preparam a divisão das receitas de uma futura venda de Imbula...


... o que, independentemente de o fundo e o investidor deterem ou não formalmente uma parcela dos direitos económicos do jogador, é ilegal segundo o regulamento de transferências aprovado pela FIFA e que entrou em vigor a 1 de maio:


Rui Pedro Braz que esta revelação não faz qualquer mossa no Porto. O futuro dirá se isso é realmente verdade.


As tochas lançadas por benfiquistas em Madrid


É lamentável que um comentador procure desvalorizar a gravidade do ato ao dizer coisas como "e muitas vezes este tipo de situação é até inofensiva, sejamos realistas". É verdade que são numerosos os jogos em que são usadas tochas e outros engenhos pirotécnicos nos estádios, sem que nada aconteça, mas já não é tão normal que esses objetos sejam arremessados contra outras pessoas. E se já é suficientemente grave que arremessem para o relvado para perto da zona onde estão jogadores - como aconteceu com adeptos do Sporting no Bessa -, é gravíssimo quando se atiram estes engenhos para bancadas repletas de gente onde não existe muito espaço para as pessoas se afastarem assim que são atingidas.

Rui Pedro Braz lembrou e bem a morte de Rui Mendes, mas também deveria ter lembrado as responsabilidades dos dirigentes benfiquistas na situação - quando reagiram com escárnio aos petardos lançados contra adeptos sportinguistas no final do derby de há 8 meses.

Mas pelos vistos, para este jornalista, as críticas aos dirigentes só são justificáveis quando as suas cores são o verde e branco. Remember Shikabala & Taarabt.