sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

A montanha pariu uma Sábado

A revista Sábado publicou esta semana um extenso artigo de investigação a que deram o título "O banco sujo do BES". Na capa, podem ver-se referências a Ricardo Salgado e Álvaro Sobrinho, à existência de "esquemas" que movimentam "milhões" em "offshores", que podem ser considerados "crimes de infidelidade", "gestão danosa" ou "branqueamento de capitais", e que envolvem entidades como "governo de Angola" ou o... "Sporting".


Começa a ser uma tradição. A propensão para a Sábado publicar artigos pouco simpáticos para o Sporting até poderia ser considerada algo de natural, se se vislumbrasse algum esforço da revista em explorar assuntos sensíveis de outros clubes. No entanto, nos últimos tempos, só tem dado Sporting, Sporting, Sporting. 

Em maio, a três dias do final da Taça, lembraram-se de escrever sobre a vida dupla do fundador do Sporting. Em vésperas do Benfica - Sporting para o campeonato, publicaram a defesa do Benfica no processo contra Jorge Jesus. Dois dias antes do Sporting - Benfica para a Taça, fizeram a polémica entrevista com Rui Barreiro, um sócio que poucos sportinguistas conheciam, onde foram feitos ataques cerradíssimos à atual direção. 

E agora, num tema extremamente amplo que envolve desvios de milhares de milhões de euros, figuras governamentais de destaque, grandes grupos empresariais e crimes económicos gravíssimos, a Sábado destaca o envolvimento... do Sporting.

No entanto, esse destaque ao Sporting não parece encontrar qualquer justificação no conteúdo do artigo. Olhando para o interior da revista, ao longo das 10 páginas que o artigo ocupa, as referências ao clube resumem-se a um único parágrafo:

"Paula Gramaça, do Compliance do BES, citou aos técnicos da Deloitte o que terá sucedido quando, em 2011, o DCOMPL fez pedidos de esclarecimento à subsidiária de Angola devido a irregularidades no preenchimento de operações a débito de cinco transferências, com um total de 7 milhões de euros, a favor da Sporting SAD: '(...) A dra. Paula Gramaça (...) informou que (...) os pedidos de esclarecimento (...) não foram respondidos pelo BESA, sendo que as operações já tinham sido processadas aquando dos pedidos de esclarecimento.' Em 2012, existiram outras seis transferências com o mesmo destino, totalizando 6,7 milhões de euros, mas a SÁBADO não apurou se foram estes movimentos que permitiram a entrada de Sobrinho como accionista de referência no Sporting."

O facto de a Holdimo ter transferido dinheiro para o Sporting não é nenhuma novidade. Os anos de 2011 e 2012 coincidiram com o mandato de Godinho Lopes, durante o qual foram vendidos percentagens de direitos económicos de inúmeros jogadores do plantel do Sporting à Holdimo. Direitos económicos que, em finais de 2014 - altura em que a reestruturação financeira do Sporting se concretizou -, acabariam por ser devolvidos à SAD como moeda de troca pela emissão de ações no valor de 20 milhões de euros em favor da Holdimo.

Ou seja, a participação do Sporting em toda esta história é perfeitamente circunstancial, e não é nem melhor nem pior que a de muitas outras sociedades que, ao longo dos últimos anos, estiveram envolvidas com o grupo BES, com os seus administradores ou acionistas de referência. Não é muito diferente, por exemplo, da torneira aberta de crédito de que o Benfica dispôs mesmo quando o edifício do BES já dava sinais de estar prestes a entrar em colapso.

Estes 13,7 milhões que a revista Sábado descobriu são apenas uma pequena parcela das transferências duvidosas que analisam, e uma gota no oceano de uma história que tem ainda muitos ângulos por explorar - alguns dos quais envolvem figuras bem conhecidas do nosso futebol. Veremos se terão a mesma vontade em fazer capas sensacionalistas com outros clubes quando essas pontas forem levantadas. Para já, a montanha pariu uma Sábado.