Francisco J. Marques revelou ontem novos emails, desta vez envolvendo um conjunto alargado de pessoas, algumas das quais com cargos de muito relevo no Benfica e na Liga. Parece um programa de discos pedidos, mas em que apenas é permitida a escolha de um único género musical.
O primeiro conjunto de emails revelado por Francisco J. Marques voltou a ter Adão Mendes como protagonista, mas, desta vez, o seu interlocutor não foi Pedro Guerra. O responsável pela arbitragem da AF Braga trocou mails com Paulo Gonçalves, assessor jurídico do Benfica e braço direito de Luís Filipe Vieira para os assuntos dos bastidores, com o intuito de pedir ajuda para subir uma nota do "nosso amigo Manuel Mota". "Temos de lhe dar nota positiva". Ao "nosso amigo Manuel Mota", repito. Adão Mendes também pediu ajuda para melhorar as avaliações do filho, o árbitro Renato Mendes, quer junto do Conselho de Justiça, quer junto do próprio Vítor Pereira. Acrescentou, pelo meio, observações como "ponho a carne no assador todos os dias" pelo Benfica, e a já habitual referência ao "glorioso".
Mas o melhor, neste conjunto de mails, ficou guardado para o fim: em junho de 2016, ou seja, há apenas um ano, Adão Mendes enviou para Paulo Gonçalves uma lista com os 5 árbitros assistentes candidatos a promoção de escalão que seriam os melhores para o Benfica. "Nada pode falhar", concluiu em relação a este tema.
O segundo conjunto de emails envolveu um conjunto de informações passadas por Nuno Cabral, delegado da Liga, a Paulo Gonçalves - e, num deles, ao próprio Luís Filipe Vieira. Também envolvido está, indiretamente, o árbitro João Pinheiro. Bons serviços prestados por um delegado da liga que escreveu, com todas as letras, que quer ser "o menino querido" do Benfica e "fazer bem o seu trabalho", para ser homem de confiança de Paulo Gonçalves e Luís Filipe Vieira.
No terceiro conjunto de emails, às personagens já mencionadas, junta-se o então presidente da Liga, Mário Figueiredo. Nuno Cabral queixa-se a Paulo Gonçalves pelo facto de ainda não ter sido nomeado para jogos da I Liga. O assessor benfiquista intercede junto de Mário Figueiredo, e a resposta do presidente da Liga não podia ter sido mais elucidativa: "Vem [está disponível para] fazer um jogo ao Porto? Só tens que dizer.". E, para rematar, uma troca de mails entre Mário Figueiredo e Luís Filipe Vieira, em que o então presidente da Liga diz ao presidente benfiquista: "Por favor, tem calma, que sempre tenho estado e estive do teu lado".
Estes mails, sendo privados, permitem-nos fazer interpretações que vão além daquilo que está escrito. Adão Mendes pede a Paulo Gonçalves que interceda em nome do filho junto do CJ e de Vítor Pereira. Se o fez, e sendo alguém do meio que tem uma ligação muito próxima ao Benfica, é porque sabe que o Benfica tem esse poder. Adão Mendes pede a Paulo Gonçalves, de forma enfática, que é necessário que Manuel Mota tenha nota positiva. Se o fez, é porque sabe que o Benfica tem interesse (e poder) em influenciar as revisões de notas dos árbitros.
Mas, claro, aquilo que está escrito não deixa margem para dúvidas. Paulo Gonçalves aceitou ajudar Adão Mendes, dando conselhos e fazendo contactos. Adão Mendes pediu, em seu nome e em nome de Manuel Mota, para que o Benfica invertesse uma nota negativa. A troco de quê? Adão Mendes dá uma lista dos árbitros assistentes que devem ser promovidos - a bem dos interesses do Benfica. Que interesses são esses? Nuno Cabral, delegado da Liga, entende que a sua finalidade é ajudar o Benfica - e não o desempenho das suas funções de forma isenta. Paulo Gonçalves queixa-se junto de Mário Figueiredo da não nomeação do candidato a menino-bonito para jogos da I Liga. Resposta imediata: "Só tens que dizer".
Casos que apontam, de forma clara, para um esquema de tráfico de influências - que, como se sabe, é crime. O que vão agora fazer a Liga e a FPF em relação a isto? E, já agora, o Ministério Público...