Não me parece que
a entrevista que Sousa Cintra deu ontem ao Record tenha vindo num momento muito
oportuno. Nem para o Sporting, já que são feitas algumas revelações que não são
propriamente agradáveis de digerir numa altura em que vai existindo bastante
contestação à equipa de futebol e em particular ao seu treinador, nem mesmo
para o próprio Sousa Cintra, que deveria aguardar mais uns meses para poder
fazer um balanço mais completo – nomeadamente ao nível desportivo - daquilo que
foi o seu trabalho enquanto presidente interino. Cintra foi presidente da SAD - ou seja, a sua área de ação foi exclusivamente o futebol - numa altura crítica para o sucesso da época desportiva, pelo que terá legitimidade para reclamar uma grossa fatia dos sucessos que esta temporada nos trouxer, mas também não se poderá esquivar das responsabilidade pelos insucessos que sucederem.
A questão da
contratação de Peseiro é, para mim, o assunto mais importante da entrevista, mas não de uma forma positiva: Cintra espalha-se ao
comprido quando continua a tentar defender o indefensável. É de uma completa falta de noção dizer que dispensou Mihajlovic por não ter campeonatos nem taças no currículo para, logo a seguir, afirmar que contratou Peseiro por ser um vencedor - quando na realidade é um treinador que tem somado insucessos sucessivos, apenas interrompidos por uma Taça da Liga conquistada ao serviço do Braga. Infelizmente, aquilo que está a acontecer ao futebol do Sporting não é surpresa para praticamente ninguém: Peseiro foi uma péssima escolha e o facto de Cintra assumir que tomou a decisão sozinho, contra a vontade de outros elementos da direção que o acompanhavam, deixa-o muito mal na fotografia.
Não lhe fica nada bem, também por isso, estar agora a apontar as responsabilidades dos graves desequilíbrios do plantel para as indecisões do treinador. Se é verdade que Peseiro andou aos avanços e recuos sobre determinados nomes que estavam em cima da mesa, então é mais uma desagradável constatação que o Sporting tinha e tem a pessoa errada ao comando do clube, e que faltou um pulso mais forte a Cintra para obrigá-lo a tomar decisões em tempo útil. Dizer agora uma coisa destas - numa altura em que existe uma enorme contestação a Peseiro - é estar a colocar o treinador numa situação ainda mais fragilizada perante os adeptos sportinguistas.
Ainda relacionado com a procura de treinador em finais de junho, é assustadora a revelação de que Jesus "esteve por um fio" para voltar. Obviamente que a competência de Jesus é incomparavelmente superior à de Peseiro (tal como o cheque que leva para casa no final do mês), mas toda a gente (menos Cintra, aparentemente) percebia que o ciclo de Jesus no Sporting estava mais que esgotado, não havendo qualquer margem para a sua continuidade em Alvalade.
A justificação dada para a presença na tribuna da Luz também não faz qualquer sentido: não pode usar o excelente relacionamento pessoal que tem com Vieira como argumento para defender uma posição de cariz institucional que contraria a vontade da esmagadora maioria dos sócios, ainda mais considerando a natureza temporária da sua presidência.
Cintra voltou a afirmar que os jogadores recuperados da rescisão não ficaram com um ordenado superior nem receberam qualquer prémio de assinatura, mas revelou que foram pagas comissões aos respetivos empresários. Esta afirmação é contrária aos rumores de que Dost teve uma melhoria contratual ligeira e de que Battaglia teve um aumento mais significativo. O tempo encarregar-se-á de confirmar os valores que foram despendidos nestas operações - que, na minha opinião, foram das mais importantes medidas tomadas por Sousa Cintra.
Termino com os aspetos mais positivos da entrevista: o facto de não ter aceitado as pretensões salariais de Podence, não ter cedido nas negociações com o Atlético por Gelson, e ter tomado a iniciativa de renovar contrato com Jovane - a política que se seguia de tratar todos os jovens da formação por igual é um modelo que, comprovadamente, não funciona.