Quando Villas Boas foi contratado para treinador principal do Porto, declarou de forma orgulhosa e apaixonada que tinha chegado à sua cadeira de sonho.
A cadeira de sonho de Villas Boas ao chegar ao Porto |
A expressão pegou e ficará para sempre anexada ao homem que, um ano depois, teve uma oferta irrecusável vinda de Inglaterra. A cadeira de sonho do Dragão não tinha deixado de ser confortável para Villas Boas, mas o cenário envolvente deixou de ter o mesmo encanto. Assim, Villas Boas lá acabou por trocar a sua cadeira de sonho pelos milhões de Abrahamovic.
A cadeira de sonho de Villas Boas após ter tido conhecimento do convite do Chelsea |
A cadeira de sonho (estou a falar especificamente do cargo de treinador principal do Porto) raramente tem finais felizes como o de André Villas Boas e é, do ponto de vista da gestão de carreira de um treinador, um presente envenenado.
Living the dream
É indiscutível que chegar ao cargo de treinador principal de um grande será um objetivo de qualquer treinador com ambição. Faz parte do percurso natural de um treinador que se comece por equipas de escalões inferiores e, à medida que vai demonstrando competência, vá subindo no nível de clubes que treina. Após demonstrar consistência nos resultados e competência acima da média ao longo de vários anos, o treinador começa a ter os grandes ao seu alcance. Jorge Jesus ou Jesualdo Ferreira são excelentes exemplos.
O Sporting nos últimos anos tem andado a cortar etapas em apostas como Paulo Bento e Sá Pinto, mas em matéria de treinadores o Sporting não é exemplo para ninguém. O Benfica nunca contratou alguém que não tivesse uma grande experiência anterior como treinador principal, a não ser para ocupar interinamente o cargo.
O Sporting nos últimos anos tem andado a cortar etapas em apostas como Paulo Bento e Sá Pinto, mas em matéria de treinadores o Sporting não é exemplo para ninguém. O Benfica nunca contratou alguém que não tivesse uma grande experiência anterior como treinador principal, a não ser para ocupar interinamente o cargo.
Voltando ao objeto em análise, podemos verificar que os últimos três treinadores do Porto foram escolhas que desafiaram a lógica. André Villas Boas tinha um ano de experiência com a Académica, Vitor Pereira tinha zero anos de experiência de 1ª divisão como treinador principal, e Paulo Fonseca um ano inesquecível no Paços de Ferreira, depois de alguns anos em escalões inferiores.
Apostar consecutivamente em três treinadores com experiência limitada só pode levar-nos a concluir que o que a direção do Porto procura no seu treinador é:
Capacidade de liderança? Não é preciso, Pinto da Costa desce ao balneário se houver algum motim. Planeamento de longo prazo? Isso é com a estrutura.
Nos grandes clubes europeus, ninguém imagina um Mourinho, Wenger, Ferguson, Ancelotti, Guardiola ou Klopp não terem palavra sobre as principais entradas de um plantel e sobre o projeto para o clube nos anos que se seguem. Descendo à realidade portuguesa, não acredito que Leonardo Jardim não tenha aprovado previamente as contratações, bem como Jorge Jesus (pelo menos algumas delas, são tantas que certamente algumas lhe passaram ao lado). No caso do Porto constrói-se primeiro o plantel e depois complementa-se com o treinador.
Ou seja, dá jeito para as negociatas. As compras milionárias e as vendas ainda mais milionárias, acompanhadas das também milionárias comissões não podem deixar de pingar por causa de caprichos dos treinadores.
Lose - Lose
Durante o período em que treinam o Porto, uma coisa é garantida para o treinador: títulos, títulos e mais títulos. Se a popularidade do treinador baixar demasiado, basta ao ocupante da cadeira de sonho mandar umas bocas dirigidas ao Benfica, e recupera de imediato alguma admiração dos adeptos. Se os jogadores começarem a dar mostras de insatisfação, a estrutura coloca-os na ordem.
Se não ganhar títulos, fica estigmatizado. Um treinador que não ganhe campeonatos no Porto será visto como um leproso na idade média. A carreira fica arruinada.
Se o Porto ganhar campeonatos e taças, os adeptos não reconhecerão o treinador como o principal obreiro das vitórias. Um ou outro até pode dizer que é o treinador, alguns dirão que são os jogadores, e a esmagadora maioria responderá que é Pinto da Costa e a "estrutura".
Ou seja, o ocupante da cadeira de sonho até pode ganhar muitas competições internas, mas nunca receberá qualquer tipo de reconhecimento por isso. Não é verdade, Vítor Pereira?
Para os adeptos da sua equipa, para os adeptos adversários e para o mundo de futebol além-fronteiras, a cadeira de sonho do treinador do Porto é isto:
Apostar consecutivamente em três treinadores com experiência limitada só pode levar-nos a concluir que o que a direção do Porto procura no seu treinador é:
- Competência na preparação física e tática da equipa: sem grandes invenções, pôr os jogadores com capacidade para correr durante 90 minutos e arrumadinhos nos seus lugares
- Que aceite sem contestação o plantel que a direção lhe coloca à disposição: não é difícil, já que estes treinadores jovens devem entrar de tal forma deslumbrados com a oportunidade que lhes caíu do céu, que nem sequer ousarão questionar os reforços que lhes vão chegando e as vendas que desfalcam o plantel
Capacidade de liderança? Não é preciso, Pinto da Costa desce ao balneário se houver algum motim. Planeamento de longo prazo? Isso é com a estrutura.
Nos grandes clubes europeus, ninguém imagina um Mourinho, Wenger, Ferguson, Ancelotti, Guardiola ou Klopp não terem palavra sobre as principais entradas de um plantel e sobre o projeto para o clube nos anos que se seguem. Descendo à realidade portuguesa, não acredito que Leonardo Jardim não tenha aprovado previamente as contratações, bem como Jorge Jesus (pelo menos algumas delas, são tantas que certamente algumas lhe passaram ao lado). No caso do Porto constrói-se primeiro o plantel e depois complementa-se com o treinador.
Ou seja, dá jeito para as negociatas. As compras milionárias e as vendas ainda mais milionárias, acompanhadas das também milionárias comissões não podem deixar de pingar por causa de caprichos dos treinadores.
Lose - Lose
Durante o período em que treinam o Porto, uma coisa é garantida para o treinador: títulos, títulos e mais títulos. Se a popularidade do treinador baixar demasiado, basta ao ocupante da cadeira de sonho mandar umas bocas dirigidas ao Benfica, e recupera de imediato alguma admiração dos adeptos. Se os jogadores começarem a dar mostras de insatisfação, a estrutura coloca-os na ordem.
Se não ganhar títulos, fica estigmatizado. Um treinador que não ganhe campeonatos no Porto será visto como um leproso na idade média. A carreira fica arruinada.
Se o Porto ganhar campeonatos e taças, os adeptos não reconhecerão o treinador como o principal obreiro das vitórias. Um ou outro até pode dizer que é o treinador, alguns dirão que são os jogadores, e a esmagadora maioria responderá que é Pinto da Costa e a "estrutura".
Ou seja, o ocupante da cadeira de sonho até pode ganhar muitas competições internas, mas nunca receberá qualquer tipo de reconhecimento por isso. Não é verdade, Vítor Pereira?
Para os adeptos da sua equipa, para os adeptos adversários e para o mundo de futebol além-fronteiras, a cadeira de sonho do treinador do Porto é isto:
A cadeira de sonho dos treinadores do Porto, segundo Alex Ferguson |
E depois do adeus
A história tem mostrado que a única hipótese de o ocupante da cadeira de sonho poder vir a ter uma carreira internacional (em campeonatos de nível superior ao nosso) é vencendo a Liga dos Campeões ou a Liga Europa.
José Mourinho é o que conhecemos. Villas Boas conseguiu passaporte direto para o Chelsea onde se deu mal, e depois conseguiu lugar no Tottenham onde tem conseguido resultados ao nível do seu antecessor.
Jesualdo Ferreira teve más experiências no Málaga e no Panathinaikos. Depois lá se reabilitou no Sporting, mas tinha uma fasquia que nunca tinha estado tão baixa num grande. Fernando Santos teve passagens relativamente bem sucedidas na Grécia (mas onde nunca ganhou nada) e novas oportunidades no Sporting e Benfica onde fracassou.
António Oliveira prosseguiu a carreira no Bétis, onde não durou mais do que uns dias, e depois foi selecionador nacional no Mundial '2002 de má memória para nós. A carreira de treinador ficou-se por aí.
Vítor Pereira, o homem que perdeu 1(!) jogo em 60 não conseguiu melhor que ir para as arábias. Nem um lugarzito num clube de menor dimensão em Espanha se arranjou. Co Adriaanse prosseguiu a carreira na Ucrânia num clube com um estádio para 5.000 pessoas, e depois acabou por ir para o Qatar.
De José Couceiro é melhor nem falar. Luís Fernandez e Luigi Del Neri prosseguiram a sua carreira nos respetivos países de origem, de onde nunca deveriam ter saído. Não estiveram tempo suficiente para queimarem a sua reputação em Espanha e Itália.
É preciso recuar ao tempo de Bobby Robson para se encontrar um treinador do Porto que tenha subido de patamar sem ter ganho uma competição internacional. Em 1996 Robson saiu para o Barcelona, mas a sua reputação já era monstruosa antes de ter chegado a Portugal. Só mesmo o Sporting para não conseguir ganhar nada com ele.
E agora, Fonseca?
Uma carreira de longo prazo no Porto é algo que Fonseca nunca terá. Independentemente do sucesso que possa ter, o Porto não é equipa para prolongar treinadores durante muito tempo. Jesualdo é o recordista, pois durou 4 anos. A estrutura do Porto não deve gostar que os treinadores comecem a ser vistos como fazendo parte da mobília. A única mobília tolerada para aqueles lados são os Jorge Nunos, os Anteros e os Reinaldos.
A grande esperança de Paulo Fonseca conseguir aspirar a uma carreira internacional bem sucedida é ficar em 3º lugar na fase de grupo da Champions. A não qualificação do Porto para a Champions no ano anterior à entrada de Villas Boas foi precisamente o que acabou por salvar a sua carreira -- que estava completamente queimada em Portugal, perante a quebra de compromisso com o Sporting e as demonstrações de ódio ao Benfica. Se tivesse sido eliminado nos oitavos de final da Champions nesse ano e estaria agora a ganhar um bronzeado invejável no futebol da Arábia Saudita.
O facto de Paulo Fonseca não ter declarado que é do Porto desde pequenino pode viabilizar no futuro a sua ida para outro grande, se continuar a demonstrar a competência que mostrou no Paços. Mas se ambiciona uma carreira internacional de sucesso tem mesmo que apostar as fichas todas nas competições europeias. Caso contrário será apenas mais um dos que ficará conhecido por ter comprado uns quantos títulos domésticos no supermercado.
A história tem mostrado que a única hipótese de o ocupante da cadeira de sonho poder vir a ter uma carreira internacional (em campeonatos de nível superior ao nosso) é vencendo a Liga dos Campeões ou a Liga Europa.
José Mourinho é o que conhecemos. Villas Boas conseguiu passaporte direto para o Chelsea onde se deu mal, e depois conseguiu lugar no Tottenham onde tem conseguido resultados ao nível do seu antecessor.
Jesualdo Ferreira teve más experiências no Málaga e no Panathinaikos. Depois lá se reabilitou no Sporting, mas tinha uma fasquia que nunca tinha estado tão baixa num grande. Fernando Santos teve passagens relativamente bem sucedidas na Grécia (mas onde nunca ganhou nada) e novas oportunidades no Sporting e Benfica onde fracassou.
António Oliveira prosseguiu a carreira no Bétis, onde não durou mais do que uns dias, e depois foi selecionador nacional no Mundial '2002 de má memória para nós. A carreira de treinador ficou-se por aí.
Vítor Pereira, o homem que perdeu 1(!) jogo em 60 não conseguiu melhor que ir para as arábias. Nem um lugarzito num clube de menor dimensão em Espanha se arranjou. Co Adriaanse prosseguiu a carreira na Ucrânia num clube com um estádio para 5.000 pessoas, e depois acabou por ir para o Qatar.
Quando o feitiço se dissipou, Vítor Pereira descobriu o aspeto real da sua cadeira de sonho |
De José Couceiro é melhor nem falar. Luís Fernandez e Luigi Del Neri prosseguiram a sua carreira nos respetivos países de origem, de onde nunca deveriam ter saído. Não estiveram tempo suficiente para queimarem a sua reputação em Espanha e Itália.
É preciso recuar ao tempo de Bobby Robson para se encontrar um treinador do Porto que tenha subido de patamar sem ter ganho uma competição internacional. Em 1996 Robson saiu para o Barcelona, mas a sua reputação já era monstruosa antes de ter chegado a Portugal. Só mesmo o Sporting para não conseguir ganhar nada com ele.
E agora, Fonseca?
Uma carreira de longo prazo no Porto é algo que Fonseca nunca terá. Independentemente do sucesso que possa ter, o Porto não é equipa para prolongar treinadores durante muito tempo. Jesualdo é o recordista, pois durou 4 anos. A estrutura do Porto não deve gostar que os treinadores comecem a ser vistos como fazendo parte da mobília. A única mobília tolerada para aqueles lados são os Jorge Nunos, os Anteros e os Reinaldos.
A grande esperança de Paulo Fonseca conseguir aspirar a uma carreira internacional bem sucedida é ficar em 3º lugar na fase de grupo da Champions. A não qualificação do Porto para a Champions no ano anterior à entrada de Villas Boas foi precisamente o que acabou por salvar a sua carreira -- que estava completamente queimada em Portugal, perante a quebra de compromisso com o Sporting e as demonstrações de ódio ao Benfica. Se tivesse sido eliminado nos oitavos de final da Champions nesse ano e estaria agora a ganhar um bronzeado invejável no futebol da Arábia Saudita.
O facto de Paulo Fonseca não ter declarado que é do Porto desde pequenino pode viabilizar no futuro a sua ida para outro grande, se continuar a demonstrar a competência que mostrou no Paços. Mas se ambiciona uma carreira internacional de sucesso tem mesmo que apostar as fichas todas nas competições europeias. Caso contrário será apenas mais um dos que ficará conhecido por ter comprado uns quantos títulos domésticos no supermercado.