quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Vamos encher Alvalade


Compreendo que muitos sportinguistas resistam a deslocar-se ao estádio para ver a nossa equipa jogar ao vivo. É muito mais cómodo e barato ficar em casa a ver os jogos com a garantia de se ficar ao abrigo dos caprichos do boletim metereológico. Assim como assim, a assinatura da SportTV tem que se pagar na mesma, não se perde tempo no ir e vir do estádio nem se gasta gasóleo. Para aqueles que (ao contrário de mim) conseguem encher o bandulho enquanto vêm um jogo, até há a vantagem de poderem ter uma mesinha de apoio ao lado da poltrona para pousar a lata de cerveja e o pratinho com os snacks, que gradualmente se vão esvaziando pelo meio das teimas que se vão tirando através das múltiplas repetições dos lances mais duvidosos. E depois ainda há o bónus de se poder ouvir as "isentas" opiniões de uma legião de comentadores que começa a debitar sentenças quando os adeptos no estádio ainda estão a aplaudir a equipa, festejando a vitória ou reconhecendo o esforço que os jogadores deixaram em campo.

Compreendo completamente. Falo por experiência própria, porque durante um longo período de tempo da minha vida poucas vezes pus os pés no estádio.

Nos meus tempos de adolescente e estudante universitário era espectador assíduo nas partidas do velhinho Alvalade (benesses de quem tinha os pais que davam uma mesada suficiente para pagar as quotas e os bilhetes dos jogos), mas o final do curso, o início da carreira profissional e outras responsabilidades que passei a ter obrigaram-me a tomar opções - e deixar de pagar as quotas e reduzir drasticamente a presença no estádio foram certamente as que mais me custaram. 

Depois veio um ano a trabalhar no estrangeiro, anos consecutivos a trabalhar fora de Lisboa que cortavam o fim-de-semana ao meio (o final de domingo era para preparar a mala e fazer-me à estrada) e, claro, os filhos, foram toda uma sequência de circunstâncias que me levaram a adiar sucessivamente a decisão de voltar a ser uma presença assídua em Alvalade. Durante todos esses largos anos os jogos do Sporting que não vi devem-se poder contar com os dedos das mãos - com exceção do tempo passado no estrangeiro, pois na altura ainda não existiam os milagrosos streams da internet -, jogasse a equipa bem ou mal, mas quase sempre em casa, num café ou restaurante, ou num hotel. Ver um jogo no estádio era um acontecimento esporádico. 

Os constrangimentos financeiros que me levaram a deixar de ser sócio e ir assiduamente ao estádio felizmente há muito que estavam ultrapassados, mas o hábito é uma coisa realmente complicada de contrariar.

O clique que me fez voltar a querer fazer parte da vida do Sporting foram as últimas eleições. Durante anos assisti ao declínio progressivo do clube com enorme angústia, mas nunca me ocorreu que poderia ser parte da solução - voltando a ser sócio, podendo participar mais ativamente na vida do clube ao escolher os nossos líderes e contribuindo com a minha presença no estádio para apoiar os nossos jogadores. Durante os meses finais do mandato de Godinho Lopes, só houve uma coisa pior que o sentimento de ver o meu clube afundar-se a caminho da bancarrota: a constatação de que se isso se concretizasse eu não teria feito absolutamente nada para o evitar. Não poder votar nas últimas eleições foi algo que me incomodou profundamente. 

Poucos dias depois das eleições reinscrevi-me como sócio e aproveitei para juntar os meus filhos à família sportinguista. Na época 2013/14 finalmente comprei a gamebox e apenas perdi um jogo, por coincidir com o aniversário do meu filho mais novo. Este ano ainda não falhei nenhum, e no que depender de mim não tenciono falhar. E para o ano que vem certamente que poderão contar com a renovação da gamebox - e por aí adiante, desde que haja saúde e dinheiro para isso.

Não tenho por hábito escrever sobre mim porque é algo que não tem qualquer interesse para quem costuma vir aqui, mas achei que devia partilhar isto para dizer que não estou a ser minimamente irónico quando digo que percebo perfeitamente quem prefere ficar em casa do que ir ao estádio.

É com base na experiência que tive que peço a quem ainda não é presença regular em Alvalade que reconsidere, porque se decidir engrossar a legião de leões que fazem de cada jogo um ambiente extraordinário certamente não se arrependerá.

Uma presença de sportinguistas em massa, neste momento, poderá fazer decisivamente a diferença para as portas que se abrirão para o nosso clube num futuro próximo. Se um estádio cheio passasse a ser a regra, sem em vez dos típicos 35.000 / 40.000 passassem a ser 45.000 / 50.000, para além das receitas diretas e do apoio à equipa, já viram o sinal que isso mandaria para o país, para os patrocinadores e para os agentes do futebol? Tudo isto numa altura em que a equipa de futebol demonstra uma vitalidade gigantesca, em que a construção do pavilhão está cada vez mais perto de acontecer, e em que o Sporting Clube de Portugal, enquanto força eclética, está a tomar consciência dos erros cometidos no passado e quer despertar de um pesadelo que parecia não ter fim.

O clube tem feito os possíveis e os impossíveis para merecer a presença dos sportinguistas no estádio. Começando por uma direção que tem defendido (goste-se ou não do estilo) os interesses do clube de forma intransigente, ao mesmo tempo que concretizou de forma extraordinária o reequilíbrio das contas do clube através de uma gestão rigorosa. A frase fazer mais com menos não podia ser mais apropriada. Um treinador jovem e corajoso que foi capaz de pôr um grupo de jogadores a jogar à bola de uma forma que há muitos anos não via. Um conjunto de jovens jogadores talentosos e raçudos, com uma forte componente de elementos portugueses e da formação que nos dão uma identidade única a nível nacional - sim, porque nós agora podemos dizer que temos a espinha dorsal da seleção.

Não estou a querer dar lições de sportinguismo a ninguém porque não sou nitidamente a pessoa indicada para o fazer. Há por aí muita gente que dedicou muito mais tempo, dinheiro e energia ao clube do que eu. Mas é um apelo que vos faço, a bem do Sporting e a bem de quem me esteja a ler: se puderem, vão ao estádio no domingo. Se gostarem do que viram - não me refiro a resultados, refiro-me ao ambiente das bancadas e à atitude dos jogadores - voltem contra o Schalke. E por aí adiante. Passadas quatro ou cinco partidas ao vivo vão ver que assistir ao jogo no sofá saberá a muito pouco.