domingo, 22 de novembro de 2015

Justa reviravolta de uma equipa convertida ao Slimanismo

Terceiro dérbi da época, terceira vitória do Sporting, terceira demonstração de clara superioridade sobre o Benfica. Dos embates desta época, este foi seguramente o mais sofrido, mas nem por isso menos meritório.

O jogo não poderia ter começado de pior forma: o Benfica colocou-se em vantagem bem cedo na sequência de um lance de contra-ataque, ficou na cómoda situação de se poder fechar no seu meio-campo sem correr grandes riscos no ataque, usando e abusando do antijogo para quebrar o ritmo de jogo, e procurando um novo erro sportinguista que lhe permitísse ampliar a vantagem.

O Sporting acusou inicialmente o golo e durante algum tempo demonstrou dificuldades em conseguir criar oportunidades de perigo, mas foi recuperando a confiança e o domínio de forma gradual, acabando por encostar o Benfica às cordas no final da primeira parte e conseguindo alcançar o empate que já se justificava momentos antes do intervalo. A entrada na segunda parte também foi muito forte, mas com o passar dos minutos o Benfica arriscou um pouco mais e também dispôs de algumas ocasiões de perigo. No entanto, a ida a prolongamento foi um castigo que o Sporting definitivamente não merecia, tal foi a superioridade na globalidade dos 90 minutos.

O merecido prémio acabaria por aparecer na segunda parte do prolongamento, com mais um golo do inevitável Slimani, um jogador com uma alma que enche o campo, contagia os colegas pela atitude que revela, e que personifica o esforço e dedicação que queremos ver em todos os atletas que equipam de leão ao peito. E foi disso que se construiu esta vitória: toda a equipa acreditou, batalhou até ao limite das suas capacidades e manteve a crença na sua ideia de jogo, mesmo nos momentos mais complicados.



Positivo

Uma equipa e um estádio inteiro convertidos ao Slimanismo - começam a faltar adjetivos para descrever a importância de Slimani para esta equipa. Impressionante a quantidade de sprints que fez ao longo dos 120 minutos, quer em lances ofensivos quer em tarefas defensivas, isto depois de ter feito 178 minutos pela seleção argelina na última semana. Para além das habituais doses industriais de esforço e sacrifício que coloca em campo, marcou o fulcral segundo golo que nos deu o apuramento, manteve vivo o lance do 1º golo ao reagir mais rápido que Luisão, Sílvio e Júlio César numa bola perdida, fez um cabeceamento ao poste aos 4' de jogo, e ainda fez um remate para uma defesa inacreditável do guarda-redes benfiquista perto do final do tempo regulamentar. Enorme exibição de um jogador que se transformou numa figura imprescindível e incontornável do atual Sporting.

O decisivo Adrien - teve uma exibição com as virtudes e defeitos que lhe são habituais, tendo sido absolutamente decisivo nos dois golos: marcou o primeiro golo com um remate de primeira que atravessou um mar de pernas, e foi dele o forte pontapé que obrigou Júlio César a uma defesa incompleta que sobrou para Slimani fazer o segundo golo.

Jesus, o grande vencedor da noite - depois da campanha difamatória de que tem sido alvo desde que decidiu assinar pelo Sporting, Jorge Jesus respondeu sempre de forma arrasadora dentro de campo. Com esta terceira vitória deixa em pratos limpos a inegável mais-valia que oferece aos clubes que treina.

O ambiente no estádio - tirando um ou outro episódio protagonizado por um punhado de idiotas de ambos os clubes, o ambiente nas bancadas foi absolutamente frenético e entusiástico, contribuindo para o excelente espetáculo a que assistimos. O aproveitamento do Bailando da Luz é uma delícia e ficará na memória coletiva sportinguista. Uma referência também para o facto de no meu setor vários benfiquistas terem festejado o golo da sua equipa de forma vibrante (um dos quais mesmo atrás de mim) sem que tivesse havido qualquer tipo de problema - tal como já tinha acontecido, segundo o que li, com sportinguistas na Luz no jogo para o campeonato. Assim mesmo é que tem que ser.

Vitória com selo da formação - o Sporting terminou o jogo com Rui Patrício, Tobias Figueiredo, Ricardo Esgaio, William Carvalho, Adrien Silva, João Mário e Gelson Martins. Sete jogadores da academia que ajudaram a alcançar uma vitória em jogo de exigência máxima.


Negativo

Condicionamento da estratégia pelos problemas físicos - Jefferson e Ewerton estiveram em dúvida durante a semana, mas acabaram por fazer parte da equipa titular. Dá a ideia que Jesus já teria consciência de que não poderia forçar a sua utilização num prolongamento, pois foi adiando substituições que pareciam óbvias a quem via o jogo. O refrescamento do meio-campo acabou por ter que ser sacrificado, e um desgastadíssimo Bryan Ruiz foi obrigado a fazer os 120 minutos. Não havendo estes constrangimentos, provavelmente teriam sido lançados Aquilani e Matheus Pereira, que poderiam ter ajudado a manter um ritmo elevado e a pressão sobre o adversário. Valeu a tenacidade e a vontade de vencer a compensar a inevitável falta de frescura física.


Outras notas

O caminho escolhido por Rui Vitória - à medida que os desaires se vão acumulando, o cavalheiro Rui Vitória vai revelando uma faceta bastante menos sóbria e equilibrada. Na flash interview - que começou atrasada seguramente para receber o briefing - e na conferência de imprensa falou apenas e só dos erros de arbitragem, fugindo a toda e qualquer análise ao jogo propriamente dito e ao facto de somar três derrotas em três jogos com o Sporting. Não me parece que Rui Vitória tenha razão ao dizer que há penálti de João Pereira sobre Luisão perto do fim - há contacto, mas nada de anormal. Curioso, no entanto, que não tenha mencionado dois lances em que Jorge Sousa efetivamente errou: um penálti de Samaris sobre Slimani (o empurrão com os dois braços é claríssimo) e uma agressão de Slimani a Samaris que deveria ter valido a expulsão ao argelino. Rui Vitória revelou também uma enorme desonestidade intelectual ao referir os penáltis não assinalados a favor do Benfica nos dois dérbis anteriores, mas sem incluir nessa análise os variadíssimos lances em que o Benfica também foi beneficiado (golo mal anulado a Teo e expulsão perdoada a Sílvio na Supertaça, e expulsões perdoadas a Jonas e a Samaris no campeonato). E ainda teve um momento ainda mais lamentável: disse "tenho dois jogadores que acabaram de ir para o hospital", acrescentando a informação de que Gaitán, depois de ter sido assistido no relvado devido a um embate com a cabeça, "está com problemas em termos de consciência, teve o jogo praticamente sempre com alguma tontura". Ou seja, reconheceu uma atitude totalmente irresponsável ao colocar em causa a saúde do jogador. No futebol americano ou no rugby, Gaitán não teria continuado em campo. Curiosamente, à hora em que estou a escrever este texto, o 60 Minutos da SIC Notícias passa uma peça sobre as precauções que a NFL tomou para reduzir o risco das concussões na saúde dos jogadores - que inclui a retirada de campo obrigatória do jogador se houver qualquer indício nesse sentido.



Vitória importantíssima não só pelo facto de nos permitir continuar a defender um título que nos pertence, mas também pelo que representa em termos de crescimento de um grupo muito jovem - não esquecer que utilizámos 6 jogadores com 23 anos ou menos - e pelo impacto psicológico positivo que poderá ter numa equipa que ainda está em pleno processo de construção. E, claro, pela convulsão que irá causar na estrutura do rival que vai tendo cada vez mais dificuldades em ocultar a sua responsabilidade numa espécie de processo de autodestruição, quando optou por não renovar com o treinador que mais sucesso lhes trouxe nas últimas décadas.