segunda-feira, 2 de novembro de 2015

O endividamento dos três grandes

Agora que o Benfica divulgou (finalmente) as contas de 2014/15, vou fazer posts comparativos entre os três clubes em alguns pontos-chave: custos com pessoal, proveitos operacionais e empréstimos obtidos.

Começando pelo endividamento bancário e obrigacionista, eis a evolução nos últimos dois anos:


No caso do Porto e do Sporting, existem dois fatores a ter em consideração:
  • O Porto passou a integrar a Euroantas (detentora do estádio) no seu relatório consolidado a partir do 1º semestre de 2014/15, altura em que o clube cedeu à SAD 50% dessa sociedade em troca da subscrição de ações da SAD no âmbito de um aumento de capital. Isto fez com que o endividamento bancário relativo à construção do estádio passasse a ser incluído no relatório. Em dezembro de 2014 o valor a liquidar dos empréstimos relativos ao estádio era de 15,3M, e em junho de 2015 esse valor já tinha sido reduzido para €13,9M.
  • O Sporting concretizou o acordo de reestruturação financeira durante o 1º semestre da época de 2014/15, que incluiu a conversão de dívida em VMOCs e a incorporação da SPM (empresa detentora do estádio) na SAD.

É comum aos três clubes a notória incapacidade em reduzir a dívida pelo pagamento dos empréstimos contraídos. O Sporting aumentou a dívida em €10M no 2º semestre pela emissão de obrigações no montante de €30M para pagar um de €20M que estava a vencer. É sempre motivo de preocupação quando para conseguirmos liquidar dívida somos obrigados a contrair mais dívida. É necessário no entanto relembrar que a emissão dessas obrigações já estava prevista no acordo da reestruturação financeira.

O Porto, que durante anos teve de longe as contas mais saudáveis dos três grandes, não tem conseguido evitar um galopante aumento da dívida. Se subtrairmos os €13,9M relativos ao estádio, o Porto passou no espaço de dois anos de um nível de endividamento de €91,9M para €147,5M. Ou seja, nesse espaço de tempo a dívida aumentou 60%. As vendas milionárias que o Porto tem realizado têm servido unicamente para tapar o gigantesco buraco operacional. A gestão do Porto é assumidamente de risco e está altamente dependente das vendas que consegue concretizar, não havendo qualquer folga para liquidar dívida. Pelo contrário.

O caso do Benfica é o mais intrigante. Apesar de Vieira ter anunciado há um ano a intenção de reduzir o passivo e de insistir que o clube vive numa saúde financeira invejável - afirmação que até pode ser suportada pelas receitas-recorde que o clube tem conseguido gerar através da BTV, dos prémios da UEFA, dos patrocínios e da bilheteira -, a verdade é que isso apenas se refletiu numa redução de €8M do endividamento, o que acaba por ser algo curto.

É curto, porque durante o período em que Vieira conseguiu a tal redução da dívida em €8M (entre janeiro de 2014 e junho de 2015), o clube reportou nos relatórios e contas um volume de vendas de jogadores nunca antes visto no futebol português:
  • Rodrigo (30M);
  • Matic (25M);
  • Enzo Perez (25M);
  • Markovic (25M);
  • Oblak (16M);
  • Bernardo Silva (15,75M);
  • André Gomes (15M);
  • João Cancelo (15M);
  • Garay (6M);
  • Cardozo (5M);
  • Kardec (4,5M);
  • Funes Mori (3,5M);
  • Sulejmani (3M);
  • Benito (3M);
  • Jara (1,5M).

Levando a sério os valores de todas estas vendas e fazendo as contas, vemos que neste período de dezoito meses o Benfica encaixou €193,25M (dos quais é necessário deduzir comissões e percentagens de passes pertencentes a terceiros) e gerou mais-valias contabilisticas que rondam os €110M. Se estes valores são verdadeiros (e é um grande "se"), então a pergunta que se deve colocar é a seguinte: se num período em que o Benfica realizou vendas absolutamente extraordinárias apenas conseguiu abater €8M à dívida bancária e obrigacionista, como será num cenário em que não consiga manter este nível de transferências? Apesar de em 2015/16 já ter vendido Lima por €7M e Cavaleiro por €15M (mais uma vez, estes quinze milhões deviam aparecer entre aspas, pelos motivos que se conhecem), não se vê no atual plantel potencial suficiente para continuar a realizar encaixes deste nível - Gaitán será a única exceção. A não ser, claro, que Mendes volte a fazer a sua magia.

Outra questão que deve preocupar os clubes tem a ver com a dívida corrente, ou seja, aquela que tem um prazo de pagamento inferior a um ano. Os valores são os seguintes:


É normal que os clubes negoceiem o adiamento do pagamento dos empréstimos prestes a vencer para uma data posterior, mas duzentos e trinta e nove milhões de euros para resolver no espaço de um ano deve ser dose...