sábado, 23 de dezembro de 2017

O negócio Jimenez

Ontem, ao final, foram divulgados os contratos referentes à transferência de Raul Jimenez do Atlético Madrid para o Benfica. O seu conteúdo confirma os elevados valores que já se conheciam - surpreendentes, considerando o rendimento do jogador mexicano em Espanha e o facto de ter sido uma das mais caras aquisições de sempre do futebol português -, mas vêm acrescentar mais alguns pormenores que tornam todo este negócio ainda mais estranho. Vale a pena lerem até ao fim.

Comecemos pelo princípio: em agosto de 2015, o Benfica anunciou a contratação do jogador. Os valores despendidos conferem com o que se sabia: os encarnados pagaram 9 milhões de euros ao Atlético Madrid por 50% dos direitos económicos do atleta...


... o jogador recebeu 202.500 euros em prémio de assinatura, enquanto o empresário recebeu 750.000 euros pelos serviços de intermediação. O total da operação rondou, portanto, os 10 milhões de euros.

Um ano mais tarde, o Benfica adquiriu os restantes 50% por 12 milhões de euros, elevando o montante total do negócio para 22 milhões de euros.


Conforme se devem lembrar, a aquisição do jogador causou alguma estranheza. Em 2015, porque o Benfica pagou 9 milhões por metade do passe de um jogador que teve uma época discreta em Espanha (marcando apenas um golo), quando, um ano antes, o Atlético Madrid tinha pago 10,5 milhões pela totalidade do passe ao América. Convenhamos que 9 milhões seria um valor justo pela totalidade do passe, e não por metade. Em 2016, a surpresa ainda foi maior: Jimenez não fez uma primeira época propriamente deslumbrante (12 golos em 45 jogos), mas o Benfica aceitou pagar um valor ainda maior pela outra metade do passe.

No entanto, existem um par de pormenores nos documentos ontem revelados que fazem com que este negócio seja ainda mais peculiar.

Em primeiro lugar, não havia nada no contrato de transferência dos primeiros 50% dos direitos económicos que obrigasse o Benfica a adquirir os restantes 50%. Considerando o rendimento do jogador e os valores em causa (12 milhões), só podemos concluir que o Benfica tomou uma decisão muito pouco racional.

Depois, é preciso olhar para os encontros de contas referentes aos vários negócios realizados entre os dois clubes. Neste caso, os 12 milhões da segunda metade dos direitos económicos de Jimenez serviram para abater os 25 milhões de dívida que o Atlético tinha para com o Benfica por Nico Gaitán...


,,, ficando o Atlético a dever apenas 13 milhões de euros, a pagar em três tranches:


E agora podemos encaixar outra peça do mesmo puzzle: a aquisição das opções de compra de Lucas Hernandez e Borja Bastón por 2,5 e 1,5 milhões, respetivamente (LINK). Dos 13 milhões em dívida, o Atlético pagou ao Benfica a primeira tranche de 4,3 milhões, ficando a dever 8,7 milhões...


... mas, depois, voltando a abater a dívida usando os 2,5 milhões devidos pelo Benfica pela aquisição dos direitos de Lucas Hernandez, colocando o valor da dívida em 6,2 milhões, e com o Benfica a ficar a dever 1,5 milhões pela opção de Borja Bastón. 


Na prática, o Atlético ficou a dever apenas 4,7 milhões ao Benfica.

Reparem no que isto significa: o Atlético adquiriu Gaitán por 9 milhões de euros (4,3 da 1ª tranche + 4,7 do que ficou em dívida) + 50% ultrainflacionados de Jimenez + duas opções de compra que não serviram de nada. Considerando que o Benfica aceitou cobrir, por 50%, praticamente a totalidade do investimento que o Atlético tinha feito por 100% de Jimenez (e não se pode dizer que o mexicano se tenha valorizado em Madrid, antes pelo contrário), então podemos considerar os 12 milhões como uma espécie de componente virtual dos negócios entre os dois clubes e que, na prática, o proveito que o Benfica obteve da venda de Nico Gaitán se limitou a 9 milhões de euros: os 4,3 milhões que o Atlético pagou da 1ª tranche pós encontro de contas entre as transferências de Gaitan e Jimenez, e os 4,7 milhões que ficou a dever após se deduzir as opções de compra de Lucas e Borja. Resta saber se esses 4,7 milhões foram efetivamente pagos, ou se entretanto apareceu mais uma dívida de outra aquisição de uma opção de compra para compensar parte desse valor... quando estes dois clubes se juntam, nunca se sabe.

Colocadas as coisas desta forma, não parece um negócio muito bom para o Benfica, pois não?