segunda-feira, 23 de abril de 2018

The Day After (@3295c_)

Novo texto do 3295c.



No dia em que se ficou a conhecer um email - mais um para a conta dos 20Gb que andam a ser escrutinados -, desta vez envolvendo Domingos Soares Oliveira num eventual plano para controlar a arbitragem, os políticos, a justiça e até a comunicação social num documento “pessoal e comprometedor” (cito a reportagem da SIC Notícias), “publicado num conhecido blogue anti-Benfica, cuja autoria se desconhece, mas que entretanto está já a ser investigado pela Polícia Judiciária” (continuei a citar a mesma reportagem).

Não preciso de falar sobre o conteúdo do email, pois todos já o leram nas notícias. O que interessa, neste caso, é o chamado “the day after”.

Tal como em todos os outros mails anteriores que foram já tornados públicos, nunca houve, até aos dia de hoje uma negação peremptória dos factos gravíssimos que têm vindo a público sobre comportamentos, escolhas, decisões, pedidos, tudo actos de gestão do outro lado da estrada. Pelo contrário. Ouvimos, sim, o porta-voz dos advogados do clube da Luz, João Correia, na próprio canal de televisão do Clube dizer: “É absolutamente essencial que o Ministério Público e a Polícia Judiciária venham aqui a esta casa e verifiquem se aquilo que é divulgado pelo Porto Canal corresponde ou não à realidade” [16 de Outubro de 2017].

Pior. No site do próprio clube, está escrito o seguinte: “Porta-voz da equipa de advogados do clube explicou na SIC e na SIC Notícias os motivos pelos quais este está a notificar todos aqueles que se “apoderaram do seu sistema informático”, “descarregando, acedendo e divulgando emails”, um crime claro e onde o Benfica - como “agredido” - “reage” em legítima defesa”.

Admitem que é tudo deles. João Correia diz na mesma entrevista que, juridicamente, não interessa se os mails são verdadeiros ou não, se estão truncados, se são verdadeiros ou não. Juridicamente, pode não ser relevante, mas criminalmente é o cerne da questão. Aliás, não sei se serei o único a ficar confuso com esta incongruência: não interessa se os mails são verdadeiros, mas passem-nos cá que são nossos e não têm que mexer nas nossas coisas.

Não será necessário fazer o filme de tudo o que se passou entretanto, lembrar apenas que já foram feitas buscas a várias residências de dirigentes, do próprio presidente - apanhado na Operação Lex, do casal de juízes Rui Rangel e Fátima Galante -, do próprio clube, de um alto responsável hierárquico, que ficou detido uma noite, sendo libertado na manhã seguinte. Saldou-se a prisão preventiva do funcionário de um tribunal que passava informações sobre processos do interesse do Benfica, próprios ou de adversários.

Gostaria de acreditar - porque na verdade não sei se é assim que está a situação das investigações judiciais -, que não se focou, apenas, os esforços na busca dos delatores, hackers, blogueiros, heróis, criminosos, o que queiram chamar aos que têm divulgado os emails da controvérsia. Acredito que também prossegue, a bom ritmo, uma exaustiva investigação para saber o que significa tudo aquilo que tem vindo a público e que já todos percebemos que tem de ser levado a sério porque os verdadeiros autores reclamam o conteúdo como seu.


Já não é apenas um clube, o futebol, o desporto (pela dimensão do assunto) que estão em causa. É, igualmente, a justiça. Que não está, realmente, a passar a melhor fase da sua existência em democracia. O hiper-mega-processo resultante da Operação Marquês está a provocar brechas demasiado grandes para não terminar em desgraça. Também. Parece, o Ministério Público, não conseguir arranjar provas que não suscitem dúvidas razoáveis para a culpabilidade do arguido e, misteriosamente, surgem as gravações dos interrogatórios escarrapachados num canal de informação, travestidos de reportagem jornalística, num claro julgamento público em HD.

O caso do clube ali ao lado é diferente. Assenta como uma luva no princípio utilizado pela Wikileaks, de subversão para revelar o lado podre de quem tem poder e torce-o em proveito próprio, aniquilando os adversários. O contrário de jogo limpo.

O bom do caos é que a partir dele vem, evolutivamente, a ordem. Digo evolutivamente porque o futebol português tem neste momento importante, uma oportunidade de se colocar em ordem. Evoluir.

Entretanto, não se admirem de Portugal não levar um só árbitro ao Mundial, quando foi uma das seis ligas em todo o Mundo a ser pioneira no uso do VAR. A Inglaterra também não leva nenhum árbitro, mas a Premier League não foi uma das seis a estrear o vídeo-árbitro, ou seja, nem a experiência nos valeu.

Para terminar como se começou, uma pergunta que fica: que relação poderá haver entre os elogios - onde se inclui os de Luís Filipe Vieira - à “estrutura” do Benfica e dos seus reconhecidos evangelizadores da mensagem de sucesso do caminho trilhado até aqui, no futebol, com a mensagem agora divulgada de Domingos Soares Oliveira, com cinco anos de diferença, os mesmos do famoso plano que terminaria em 2018, com o tão desejado penta?

“A estratégia terá sido apresentada através de slides, na VIII Reunião de Quadros do Benfica, em junho de 2012, e passava por "aumentar a influência/controlo" sobre a "Federação e respetivos conselhos de arbitragem, poder político, meios de comunicação/media e [poder] judicial”. Para atingir aquele fim, importava "definir e implementar uma estratégia coerente a cinco anos, partindo de um diagnóstico sobre as envolventes internas e externas (federativo, político, comunicação e judicial)", apontava o slide.” [in Jornal de Notícias].

Isto está realmente a ficar cada vez pior. Extraordinário fim de época que aí vem! O melhor de tudo vai ser o Jamor. E o seu Day After.