A noite de ontem acabou por ser mais um bom exemplo de como os nossos órgãos sociais não se preocupam muito com os superiores interesses do Sporting Clube de Portugal. Marcar uma AG de destituição da direção para 23 de junho é uma decisão que pode comprometer vários processos fundamentais em curso: a preparação da época 2018/19 (que arrancará entre 21 e 25 de junho) e a emissão do empréstimo obrigacionista prevista no âmbito da reestruturação que permitirá reformular as condições de recompra das VMOCs em condições muito vantajosas para o clube. Para além disso, duvido que esta decisão mude, no quer que seja, eventuais intenções de rescisão de contrato por parte dos jogadores, pois a AG irá realizar-se após o fim do prazo para a tomada dessa decisão.
Considero que é inevitável a realização de eleições para todos os órgãos sociais face ao grande número de demissões que aconteceram na última semana e ao ambiente de turbulência extrema a que chegámos com o ataque à Academia, o caso pós-Madrid, o processo Cashball e o descalabro desportivo no campeonato e taça. Como tal, o cenário que me parecia ideal seria o acordo entre todas as partes para a realização de eleições em setembro/outubro, pois, desta forma, o planeamento da época e a concretização do empréstimo obrigacionista ficariam assegurados e a reestruturação financeira passaria a estar praticamente concluída. A pressa de uns e a intransigência de outros condenou à partida a solução que melhor defenderia os interesses do clube e da SAD.
Na conferência de imprensa realizada após o anúncio de Jaime Marta Soares, Bruno de Carvalho apresentou vários argumentos válidos para criticar a decisão tomada. E se é verdade que Jaime Marta Soares lhe propôs um cenário alternativo com marcação de eleições daqui a 60 dias até eleições, então fez bem em recusar. Não seria melhor solução do que esta marcação de AG.
No entanto, não gostei de ver o discurso de vitimização que dominou a conferência de imprensa de Bruno de Carvalho. O presidente poderia também ter assumido as responsabilidades que teve no ambiente de grande turbulência em que o clube está mergulhado desde fevereiro, mas, como tem sido hábito, prefere continuar a chutar as culpas todas para outras paragens. Para além disso, considero absurda a forma como recorreu aos resultados das votações da última AG para afirmar a sua legitimidade e descartar a necessidade de se colocar nas mãos dos sócios: há muito mais motivos agora para que a vontade dos sócios seja auscultada do que havia na AG de fevereiro - em que fomos todos arrastados apressadamente para um referendo desnecessário por causa de um capricho do presidente. A "validade" da votação dessa AG expirou muito mais depressa do que expirou a "validade" das eleições de 2017, pois muita muita água passou debaixo da ponte desde fevereiro... e estou seguro de que há muitos sócios que, sabendo o que sabem hoje, sabendo a forma como o presidente exerceu o seu mandato desde então, teriam pensado muito melhor antes de lhe confiar o seu voto.
Pelo que Bruno de Carvalho disse ontem, diria que há uma boa probabilidade de que a direção avançará para a impugnação da marcação da AG. Desconheço se isso permitirá "comprar" algum tempo, mas uma coisa é garantida: o próximo mês será uma extensão do circo que se tem vivido ao longo das últimas duas semanas.