segunda-feira, 25 de junho de 2018

A vida após a destituição

A Assembleia Geral

Os sportinguistas pronunciaram-se no sábado de forma clara e escolheram destituir Bruno de Carvalho e os restantes membros dos órgãos sociais que ainda o acompanhavam. Enquanto sócio que votou contra a destituição, apenas tenho que respeitar a vontade da maioria - neste caso, uma maioria que não deixa quaisquer dúvidas quanto ao sentimento do universo sportinguista face à continuidade do agora ex-presidente, pois o sim ganhou em todos os níveis de antiguidade: de forma mais acentuada nos associados com mais anos de filiação, com mais equilíbrio nos sócios mais recentes.

Infelizmente, a reação de Bruno de Carvalho à derrota não podia ter sido pior. Primeiro falou a frustração, anunciando a renúncia ao estatuto de sócio e o fim de toda e qualquer relação com o Sporting. Um punhado de horas mais tarde falou a falta de noção, invertendo o sentido de marcha de forma súbita e anunciando que, afinal, vai impugnar a AG e recandidatar-se à presidência. O dia não terminaria sem mais um par de intervenções em direto que culminou com a humilhação de ver a sua chamada a ser cortada pela SIC Notícias quando se repetia e divagava em questões sem interesse. A impugnação é uma tremenda falta de respeito pela vontade dos sócios e os recuos e avanços não revelam nada de bom sobre a sua estabilidade emocional, o que apenas vem dar razão a certo tipo de críticas que lhe foram feitas ao longo dos últimos meses/anos, e que acabará por colocar em risco a forma como muitos sportinguistas recordarão (ou não) a parte boa do legado da sua presidência. Uma coisa é certa: continuando a seguir este caminho autodestrutivo e indo a eleições, será um milagre se conseguir repetir a votação de 29%. 

As pessoas passam e o clube, melhor ou pior, fica. E é também pela parte boa do legado de Bruno de Carvalho que, após tomada a decisão da sua destituição, há dois grandes temas que terão de merecer completa atenção dos sportinguistas daqui para a frente.


A ação da Comissão de Gestão


O primeiro tema é a ação da comissão transitória nomeada por Jaime Marta Soares que fará a gestão corrente do clube até às eleições de 8 de setembro. É certo que estarão em funções apenas durante dois meses e meio, mas são dois meses e meio absolutamente críticos, durante os quais serão tomadas decisões muito importantes sobre temas extremamente sensíveis - o maior dos quais é, pela sua urgência, a condução do tema das rescisões. 

De acordo com as palavras de Artur Torres Pereira (na semana passada) e do, sabemos agora, presidente da SAD Sousa Cintra (ontem), a estratégia passará por fazer regressar os jogadores ao clube e, nos casos em que tal não for possível, negociar um certo valor de transferência com os clubes que os contratarem. 

Admito que possa ser possível recuperar um ou outro jogador, admito que os adeptos receberão bem um ou outro que tenha tido mais razões para querer abandonar o clube, mas nunca poderei esquecer que os jogadores decidiram abandonar o clube num dos piores momentos da sua história - a maior parte dos quais numa atitude de oportunismo puro para se colocarem a jeito de receberem generosos contratos e prémios de assinatura - sem sequer dirigirem uma palavra aos sócios e adeptos que, de forma esmagadora, repudiaram os acontecimentos de Alcochete.

O pior cenário possível, para mim, será a via da negociação. Querer negociar com jogadores e clubes em circunstâncias destas é um cenário que nunca admitirei, porque cheira a pedido de esmola e é um péssimo exemplo para o futuro que se está a dar aos jogadores que representam ou representarão o Sporting: compensará sempre apresentarem uma rescisão por justa causa, por mais absurdos que sejam os seus motivos, pois já sabem que o clube ficará satisfeito se recuperar umas raspas do seu valor do mercado. Para bem do futuro do Sporting, é obrigatório procurar fazer valer os nossos direitos pela via judicial até às últimas consequências, contra os jogadores e contra os clubes que os acolherem.

Há, também, as questões financeiras de curto prazo: a emissão do empréstimo obrigacionista e a criação das condições necessárias para concretizar o acordo de recompra das VMOCs. É uma oportunidade irrepetível que não podemos desperdiçar, pelo que será um crime contra o Sporting se esta Comissão de Gestão não fizer tudo ao seu alcance para fechar de forma satisfatória esta questão fundamental para o futuro do clube.

São temas prioritários sobre os quais espero ter esclarecimentos da Comissão de Gestão nos próximos dias.


O processo eleitoral que se segue

Estará agora na altura de aparecerem os candidatos com as suas listas e programas. Não encaro os resultados de sábado como um sinal de que o regresso da linhagem anterior é uma fatalidade impossível de contrariar. É óbvio que vão tentar retomar o poder do clube e da SAD, mas não tenho dúvidas de que muitos dos que votaram a favor da destituição de Bruno de Carvalho não tolerarão o regresso a esses tempos.

Estou, por isso, confiante que aparecerão listas alternativas que valorizarão o desígnio do ecletismo, transparência financeira, intransigente defesa dos interesses do clube e ambição desportiva, sendo certo que o tal lado bom da presidência de Bruno de Carvalho estabeleceu uma bitola elevada nos aspetos que referi atrás. Felizmente, o Sporting de 2018 é muito diferente do Sporting de 2006, 2009 ou 2011, pelo que acho difícil voltarmos a um passado em que direções centradas no futebol sénior masculino usam e abusam do clube para as suas negociatas. O nível de escrutínio e exigência dos sócios nunca foi tão elevado como é hoje.

É perfeitamente óbvio para todos o caminho que os sócios querem, e isso irá refletir-se nos candidatos e programas que aparecerão. Caberá aos sportinguistas saber separar o trigo do joio e identificar aquele que tiver melhores intenções e maiores probabilidades de as cumprir com êxito.

P.S.: confesso que me meteu um certo asco observar a deferência com que os membros da Comissão de Gestão trataram certa comunicação social durante a conferência de imprensa de ontem. Espero que tenha sido um momento de hipocrisia e não de ingenuidade... porque aquela malta, que vos tratou nas palminhas nas últimas semanas, será a primeira a atacar-vos sem quartel se por acaso se tornarem incómodos para os donos disto tudo. Nunca se esqueçam disto.