quinta-feira, 8 de novembro de 2018

A vez de Keizer

Tudo indica que estará por dias a oficialização de Marcel Keizer como novo treinador do Sporting. Sendo certo que o despedimento de Peseiro reuniu um consenso bastante alargado no universo sportinguista, o mesmo não se poderá dizer da sua substituição. A contratação do técnico holandês dividirá seguramente as opiniões: há quem aponte a ausência de títulos no currículo, há quem aponte o facto de não conhecer o futebol português, e há quem aponte a escassa experiência como treinador principal em clubes com ambições idênticas às do Sporting. São questões pertinentes, algumas mais relevantes do que outras.


Ausência de títulos

A ausência de títulos, para mim, não é um problema. O historial dos treinadores campeões em Portugal demonstra que isso não é uma condição necessária para se ter sucesso: Rui Vitória tinha uma Taça de Portugal antes de ingressar no Benfica, Jorge Jesus nunca tinha ganho nada, o mesmo aplicando-se a Vítor Pereira e André Villas Boas. Por aqui estamos conversados.


Desconhecimento do futebol português

O desconhecimento do futebol português é uma questão bem mais relevante, nomeadamente nestes primeiros meses de contacto com a realidade nacional. As dificuldades que existem em Portugal nos confrontos com equipas do meio e do fundo da tabela não têm absolutamente nada a ver com o que se passa nos outros campeonatos, nomeadamente o holandês. É um foco de risco que, no entanto, poderá ser mitigado pela presença de adjuntos portugueses (Tiago Fernandes e Rodolfo Correia deverão fazer parte da equipa técnica).


A experiência passada

Há, depois, a experiência anterior do treinador, que é indiscutivelmente escassa. O único ponto marcante da sua carreira é a curta passagem pela equipa principal do Ajax, que acabou com um despedimento a meio da época. No entanto, olhando para os resultados de Keizer no Ajax, não se pode dizer que tenha feito um trabalho terrível: na realidade, ao nível interno teve um desempenho muito na linha daquilo que têm sido as últimas épocas do Ajax, incluindo a atual. Keizer saiu à 17ª jornada com o Ajax em 2º lugar a 5 pontos do líder PSV - curiosamente, numa altura em que tinha o melhor ataque e a melhor defesa e em que a equipa estava em franca recuperação: nas jornadas anteriores ao despedimento o Ajax tinha derrotado o líder PSV por 3-0 e tinha ido a Alkmaar (que era 3º classificado) vencer por 2-1. A sua saída acabou por ser ditada pela eliminação na Taça e, sobretudo, pelo péssimo início de época - mau arranque no campeonato e eliminação nas fases de qualificação da Liga dos Campeões e da Liga Europa -, que, segundo li, foi afetado pelo grave incidente com Nouri.

O Ajax acabaria essa época em 2º lugar, a 4 pontos do PSV. Esta época, está também em 2º lugar a 5 pontos do PSV.

Só por curiosidade, Keizer deixa o Al-Jazira no 2º lugar do campeonato dos Emiratos Árabes Unidos com 5 vitórias, 4 empates e 0 derrotas, a 2 pontos do 1º lugar. Vale o que vale, mas o holandês conseguiu um claro progresso em relação à época passada, em que o Al-Jazira ficou em 7º lugar (em 12 equipas) com 7 vitórias, 7 empates e 8 derrotas, a 25 pontos do campeão.


O Perfil

Há, depois, a questão do perfil de Keizer enquanto técnico. Admito que não conheço o seu trabalho pelo que me baseio apenas no que tenho lido nos últimos dias, mas em teoria agrada-me a mentalidade ofensiva e de posse e a apetência para apostar em jogadores jovens. As declarações que tenho lido sobre Marcel Keizer vão todas no sentido de ser capaz de pôr as equipas a jogar um futebol atrativo e de olhos postos na baliza adversária. Ou seja, por aqui não me parece que haja nada a apontar à escolha da direção. Há uma filosofia de futebol positivo e com forte cunho da formação que se quer estabelecer, e o perfil de Marcel Keizer parece perfeitamente adequado a essa ideia.

Havendo capacidade para Keizer implementar as suas ideias no Sporting, seguramente que teremos grandes melhorias em relação ao que nos foi oferecido nestes primeiros meses de 2018/19. Terá, no entanto, de haver alguma tolerância para o novo técnico: é uma realidade nova que terá de enfrentar, o plantel está fechado nos próximos dois meses, entra com a época está em andamento e com pouca disponibilidade de calendário para treinar. Não critico os mais desconfiados, mas é justo que se lhe dê o benefício da dúvida nestes primeiros meses.

Que tenha a melhor das sortes neste grande desafio que vai abraçar. A sua felicidade será a nossa.