Parece inegável que a pré-temporada do Porto está a ser fortemente condicionada pela sua situação financeira. Os fortes prejuízos dos últimos dois anos, aliados à dificuldade de valorização de atletas face à ausência de sucesso desportivo, fazem lembrar - sem o mesmo nível de gravidade, pelo menos por agora - aquilo que o Sporting viveu durante a presidência de Godinho Lopes.
A forma como Rúben Neves está a ser negociado é uma consequência desses constrangimentos. No âmbito da falta de cumprimento por parte do Porto do Fair Play Financeiro, a UEFA aplicou várias medidas que o clube terá que cumprir religiosamente. Uma das imposições da UEFA definem que o Porto teria que chegar ao fim de 2016/17 com o máximo de 30 milhões de prejuízo. Como a época terminava oficialmente a 30 de junho, o Porto deixou passar para a imprensa que o jogador estaria vendido, mas a verdade é que até à hora em que escrevo este texto, nada foi oficializado.
Ainda na quarta-feira passada, ou seja, no dia 5 de julho, ou seja, já em período de 2017/18, Nuno Espírito Santo referiu-se ao negócio e confirmou que ainda não está fechado. No entanto, tenho poucas dúvidas de que o negócio de Rúben Neves entrará nas contas de 2016/17, à imagem do esquema que o Porto montou na venda de Jackson Martinez ao Atlético Madrid. Para quem não se recorde desse episódio, o Porto anunciou a venda, sem explicitar montantes, após as 23h do dia 30 de junho - que, em Espanha, já correspondia ao mês de julho, devido à diferença horária. Só cerca de duas semanas depois o acordo foi realmente fechado, mas ambos os clubes meteram o negócio no exercício que lhes interessava. O que não se compreende é como é que a CMVM permite operações destas..
Poderia ser um grande sarilho para o Porto não cumprir o primeiro passo de um acordo bastante favorável que a UEFA estipulou, mas esse problema parece resolvido. De qualquer forma, nem tudo foram rosas. A necessidade de vender acabou por retirar poder negocial ao clube, que se viu condenado a ter que recorrer aos serviços de Jorge Mendes - quer na venda de Rúben, quer na venda de André Silva. Ambos os negócios são, a meu ver, bons para o Porto, se considerarmos apenas aquilo que os atletas têm feito dentro de campo, e se não olharmos para o seu potencial. Mas convém não esquecer que os negócios com Mendes implicam, normalmente, outro tipo de obrigações.
A imposição da UEFA que, a meu ver, é mais complicada de atingir, é a de adequar os custos com pessoal para uma percentagem (não divulgada) das receitas operacionais excluindo venda de jogadores. É um desequilíbrio que, para ser resolvido, implicará a redefinição do plantel através de cortes sempre dolorosos. E aí, o anúncio de Casillas em acionar a opção de mais um ano de contrato acaba por complicar as contas. Sendo o jogador mais bem pago em Portugal, acredito que o Porto veria a sua saída de bom grado - mesmo considerando a excelente segunda época que fez de dragão ao peito -, ainda para mais quando se sabe que o Real Madrid já não comparticipará 50% do salário na época que agora começa. Resta a dúvida sobre se o guarda-redes espanhol aceitou abdicar da parte do vencimento que era coberto pelo seu antigo clube, e, em caso negativo, se também aqui existirá alguma solução contabilisticamente criativa que ajude a contornar o problema que isso constituiria para o acordo com a UEFA. A forma como o Porto irá gerir a tesouraria nos próximos meses poderá ajudar a perceber se houve ou não cedência por parte do jogador.