O Sporting nunca teve obrigação de passar esta eliminatória, e com muito menos obrigações ficou depois de ter perdido por dois golos sem resposta em Madrid. Tinha obrigação, isso sim, de disputá-la até ao limite das suas possibilidades, e foi precisamente isso que fez, tanto ontem como em Madrid. A grande diferença entre um e outro jogo esteve nos três erros crassos que cometemos - a entrada desastrada levou a que alguns jogadores abanassem em algumas situações de aperto. Mas no geral, creio que a equipa teve atitude nas duas mãos da eliminatória, ao nível do que mostrou em praticamente todos os jogos da Liga dos Campeões.
O percurso europeu acabou mas foi meritório. Arrisco dizer que esta época defrontámos três das dez melhores equipas europeias do momento. Nessas seis partidas realizadas, apenas nas duas com o Barcelona é que vimos o adversário a superiorizar-se de forma mais ou menos clara - e mesmo num desses jogos, não deixámos de discutir o resultado até ao fim.
O crescimento europeu do Sporting tem sido visível com Jorge Jesus. É verdade que de um ponto de vista resultadista, Jesus não está a fazer nada que Paulo Bento, Sá Pinto ou José Peseiro não tenham feito nas suas passagens pelo clube. Mas do ponto de vista da personalidade com que se encara os adversários, os progressos são mais que evidentes.
Isto, na minha opinião, torna evidente uma outra questão: como é que uma equipa que soube encarar de frente alguns dos maiores da Europa, passou tão mal contra adversários internos que estão a milhas da realidade europeia?
Bem sei que os campos, em Portugal, têm andado constantemente inclinados contra uns e a favor de outros, e isso explica facilmente a diferença de pontuação em relação a quem está no topo, mas, ainda assim, parece-me óbvio que não fizemos tudo o que estava ao nosso alcance. Não coloco em causa que os jogadores têm dado o litro até ao fim nos jogos do campeonato quando o resultado não é o pretendido. O meu problema é que não têm dado tudo entre o primeiro minuto e o momento em que se apercebem que a vitória pode fugir. Pelo meio, vai-se acelerando o jogo em períodos curtos, o que muitas vezes chega para marcar, mas nem sempre.
É fundamental que a equipa esteja predisposta a correr até cair para o lado desde o primeiro minuto, e isso, de uma forma geral, não tem acontecido nas competições internas.
Claro que a motivação que um jogador tem quando defronta um tubarão europeu é diferente da motivação de um jogo rotineiro para o Tugão, mas se não estamos neste momento mais perto do topo da classificação é, claramente, porque essa diferença de motivação é muito mais ampla do que deveria ser.
A qualidade está lá, mais a qualidade, só por si, não é suficiente. Dentro daquilo que depende exclusivamente de nós, falta-nos conseguir reduzir a tal oscilação motivacional, perceber qual o modelo de jogo mais adequado para as competições internas, e ter prioridades bem definidas para o nosso calendário. Prioridades bem definidas, na minha opinião, que passavam por usar a Liga Europa para rodar a equipa... mas não foi isso que entenderam o presidente - que estabeleceu a vitória na competição como objetivo -, o treinador - que aprecia o palco europeu - e os jogadores - pelo menos na eliminatória com o Atlético. Foi uma competição gira enquanto durou, que melhorou o nosso ranking, trouxe prestígio assim-assim, mas, em contrapartida, deu pouco dinheiro e foi pródiga no desgaste e nas lesões que provocou. No geral, será que valeu a pena?
Em relação ao jogo de ontem, no entanto, mentiria se não reconhecesse o prazer que me deu a exibição da nossa equipa. Muito bem Jesus, mesmo com a ausência de quatro titulares indiscutíveis, a montar a estratégia que permitiu pôr os espanhois aos papéis durante a primeira parte: colocou três centrais para evitar as aflições de 2x2 (Coates e Mathieu contra Costa e Griezmann) que nos matou em Madrid; abriu os laterais a toda a largura e com permissão para explorarem a profundidade (e que enormes exibições fizeram Ristovski e Acuña); Battaglia e Bryan a fazerem um jogo de grande sacrifício e competência no miolo. Mesmo com o percalço da saída de Mathieu, Petrovic esteve impecável defensivamente - sempre muito concentrado e certo no posicionamento, sabendo quando tinha de se manter na linha defensiva ou quando tinha que sair em contenção. Chegámos ao intervalo a ganhar por 1-0 e a lamentar a estupenda defesa de Oblak a cabeceamento de Coates e a falta de pontaria de Gelson de cabeça numa situação em que apenas tinha que escolher o lado onde colocar o esférico. A segunda parte começou a ser mais complicada, principalmente quando começaram a faltar pernas. Infelizmente, falharam as outras duas substituições: Rúben e Doumbia não acrescentaram nada, mas há que reconhecer que qualquer equipa está sujeita a que isso aconteça quando se está a rapar o fundo do tacho (ou do banco - não esquecer que para além da indisponibilidade de Dost, Coentrão, Piccini e William, também não havia Podence, Leão e o talismã das noites europeias chamado Bruno César) e que também não ajudou o facto de, nessa altura, haver vários jogadores em nítidas dificuldades físicas, como Gelson ou Bruno Fernandes.
Uma última palavra para o grande ambiente que se viveu no estádio do início ao fim. Apesar de ser um jogo que merecia mais gente, os que marcaram presença tiveram nota máxima. Apesar da eliminação, foi uma noite europeia que valeu a pena presenciar ao vivo.