No debate entre candidatos presidenciais na última quarta-feira, José Maria Ricciardi afirmou que o Sporting já tinha antecipado 60 milhões do contrato da NOS. O número adiantado é surpreendente pela negativa, pois no R&C mais recente, relativo ao 3º trimestre de 2017/18 (ou seja, à data de 31 de março de 2018), os números do factoring rondavam apenas os 7,5 milhões de euros.
Ao longo da época, é no quarto trimestre que os clubes têm um menor fluxo de dinheiro a entrar. A partir do momento em que Sporting não conseguiu concretizar a emissão do empréstimo obrigacionista previsto para maio e viu-se privado, em virtude das rescisões, dos seus ativos de maior valor que poderiam (e iriam certamente) proporcionar encaixes consideráveis no defeso, o recurso à antecipação do contrato da NOS passou a ser uma inevitabilidade.
Ainda assim, de 7,5 milhões para 60 milhões vai um salto gigantesco que não pode deixar de preocupar os sportinguistas.
Pode-se argumentar que Ricciardi poderá estar a manipular números de forma a criar um alarmismo que favoreça os argumentos da sua lista, mas convém lembrar que o candidato a presidente acabou de recrutar dois ex-elementos do Conselho de Gestão que estarão certamente bem informados.
O R&C do 3º trimestre de 2017/18
Na rubrica Financiamentos Obtidos, está disponível o seguinte quadro:
O valor do factoring a 31 de março de 2018 era de 7,515 milhões - 3,75 milhões com prazo de vencimento inferior a um ano (corrente) e 3,765 milhões com prazo de vencimento superior a um ano (não corrente).
Acontece que houve valores antecipados de receitas futuras que não foram colocados neste quadro. Mais à frente no relatório, na rubrica Outros Passivos Não Correntes, temos isto...
... e na rubrica Outros Passivos Correntes ainda há isto:
A observação "(nota 21") aponta para a explicação dada na imagem anterior (a rubrica Outros Passivos Não Correntes é o ponto 21 do R&C).
O R&C não refere se estes valores antecipados são referentes ou não ao contrato da NOS, mas o relatório anual de 2016/17 diz isso explicitamente.
Suponho que tenham sido colocados à parte por questões técnicas, mas deverá ser tudo considerado em conjunto quando falamos de antecipação de receitas.
Suponho que tenham sido colocados à parte por questões técnicas, mas deverá ser tudo considerado em conjunto quando falamos de antecipação de receitas.
Assim, a 31 de março de 2018, o Sporting tinha antecipado 32,055 milhões de receitas futuras. Isto significa que, caso os números de Ricciardi sejam rigorosos, houve recurso à antecipação de cerca de 28 milhões adicionais de março para cá - o que me parece um valor plausível.
Considerando todas as rubricas, a evolução das antecipações ao longo dos anos foi a seguinte:
Exclui deste gráfico os valores referentes à antecipação de receitas da venda de jogadores, utilizada sobretudo nas relações com fundos de jogadores - algo que foi perdendo relevância à medida que o Sporting se foi desligando dos TPO's.
"O momento não é para estagiários"
A antecipação de receitas é uma ferramenta entre várias que existem para fazer a gestão de tesouraria. A partir do momento em que os bancos fecharam a torneira aos empréstimos, os clubes passaram a ter que se virar para outras formas de se financiarem. Os empréstimos obrigacionistas e a antecipação receitas são as mais normais. Obviamente que não é bom estarmos perante um cenário destes, mas é preciso ter em consideração que atravessamos uma situação extraordinária que nos impediu de fazer boas vendas e emitir um empréstimo obrigacionista. E convém relembrar que o Sporting tem conseguido reduzir significativamente o montante dos empréstimos bancários. O essencial é que a dívida, na sua globalidade, vá descendo.
"O momento não é para estagiários"
A antecipação de receitas é uma ferramenta entre várias que existem para fazer a gestão de tesouraria. A partir do momento em que os bancos fecharam a torneira aos empréstimos, os clubes passaram a ter que se virar para outras formas de se financiarem. Os empréstimos obrigacionistas e a antecipação receitas são as mais normais. Obviamente que não é bom estarmos perante um cenário destes, mas é preciso ter em consideração que atravessamos uma situação extraordinária que nos impediu de fazer boas vendas e emitir um empréstimo obrigacionista. E convém relembrar que o Sporting tem conseguido reduzir significativamente o montante dos empréstimos bancários. O essencial é que a dívida, na sua globalidade, vá descendo.
O momento não é para estagiários, como disse Ricciardi mas também não vejo a situação como sendo desesperada. Fazendo uma época desportiva decente, é possível ao Sporting voltar em breve a uma situação de normalidade - sem ter que recorrer a investidores que, uma vez cá dentro, dificilmente voltarão a sair. Vendendo um par de jogadores bem vendidos no prazo de um ano e conseguindo indemnizações justas pelos jogadores que rescindiram no prazo de dois, a situação financeira poderá passar a ser mais saudável do que alguma vez me lembro de ter sido.
O que é fundamental - mesmo fundamental - é que o clube seja bem gerido por gente que acautele os seus melhores interesses.