domingo, 7 de julho de 2019

A vida depois de Bruno

Os sócios confirmaram ontem a expulsão de Bruno de Carvalho do Sporting. Um desfecho previsível que dita o fim de um penoso processo que teve início em maio de 2018 e que tem mantido a vida do clube em suspenso. No espaço de 17 meses, o antigo presidente passou de uma situação de apoio massivo que roçava os 90% para um ponto em que a maioria dos sportinguistas não tolera sequer a possibilidade de o deixar continuar a pagar quotas e participar na vida do clube na qualidade de associado.

Votei em consciência contra a expulsão. Apesar de ser para mim evidente que Bruno de Carvalho cometeu infrações graves - que, do ponto de vista estritamente regulamentar, podem justificar a expulsão -, não esqueço tudo aquilo de muito bom que fez pelo Sporting. Pegou no clube numa altura em que ninguém mais o queria fazer, reergueu-o desportiva e financeiramente contra as previsões de muitos, promovendo um nível de militância que arrebatou várias gerações de sócios que apenas tinham conhecido lideranças resignadas e fatalistas que foram afundando gradualmente o Sporting até ao estado desesperado que culminou nas eleições de 2013. Inverteu o definhamento do ecletismo devolvendo a competitividade das nossas equipas e construindo uma casa das modalidades que é a menina dos olhos de muitos de nós. Na minha opinião, apesar de todos os erros que cometeu na fase final da sua presidência, Bruno de Carvalho deixou o Sporting em melhor estado do que aquele que encontrou e, por isso, acho injusto que lhe seja aplicada a mais severa das punições.

Foi, também, mais uma oportunidade perdida pelos atuais órgãos sociais de honrarem o seu lema de campanha: unir o Sporting. Não contesto, de forma alguma, a legalidade da sentença do CFD, da realização da AG e da decisão final dos sócios - que respeito democraticamente -, e não me passa pela cabeça que o clube tenha de viver refém da vontade e caprichos de um conjunto de fanáticos ruidosos incapaz de separar o clube do seu antigo líder. Mas creio que, considerando a delicadeza do tema, poderiam ter sido feitas pequenas cedências que em nada afetariam o decurso da AG e que ajudariam a passar uma ideia de magnanimidade de quem exerce o poder e de alguma vontade de sarar as profundas fraturas que hoje existem. Que mal viria ao mundo se fossem atribuídos 30 minutos em vez de 15 para Alexandre Godinho e Bruno de Carvalho se defenderem perante os sócios? Que mal viria ao mundo se as votações apenas se iniciassem após o final dessas duas intervenções? Que necessidade havia de emitir tiradas de pura demagogia que transformaram a AG numa espécie de Agora Escolha em que as opções eram "BdC continua sócio e não podemos ganhar campeonatos de futebol" vs "BdC é expulso e podemos ganhar campeonatos de futebol"? 


A intransigência revelada, em conjunção com os vários sinais dados ao longo destes dez meses de mandato, é, para mim, indicativo de que existem nestes órgãos sociais alguns elementos tão extremistas como os extremistas que os insultaram repetidamente nas últimas AGs. Nas cabeças desse punhado de indivíduos - seja por desejo de vingança ou paranóia -, #UnirOSporting é a menor das preocupações. Nas cabeças desse punhado de indivíduos, só hoje começou a vida pós-Bruno quando, na realidade, a vida pós-Bruno começou no dia em que os atuais órgãos sociais tomaram posse.

O ciclo de Bruno de Carvalho do Sporting está morto e enterrado desde setembro de 2018. Os problemas que a fase final da sua presidência gerou são indesmentíveis e condicionaram fortemente a época que terminou em maio, mas nada do que o sócio Bruno de Carvalho fez ou pudesse ter feito desde as última eleições alterou ou alteraria o quer que fosse. Daí achar que a sua expulsão não vai resolver absolutamente nada, não vai mudar absolutamente nada.

Votei nestes órgão sociais por achar que a melhor forma de unir o clube é através da competência, das vitórias e dos títulos. Até ver, as promessas feitas nesse sentido estão a ser cumpridas na generalidade. Há uma estratégia coerente que me parece estar a ser bem executada, a época está a ser bem preparada (há a exceção do andebol, pelas razões que se conhecem), e encaro com otimismo o desempenho da maior parte das nossas equipas em 2019/20. No entanto, não se fazer qualquer esforço para unir e cativar os sportinguistas que se afastaram - a esmagadora maioria por desilusão com o estado a que o clube chegou e não por lealdade a presidentes ou candidatos - é um caminho perigoso. Quando os sócios e adeptos não se revêm numa direção, a sua paciência vai depender quase exclusivamente da bola que entra ou deixa de entrar na baliza - e isso coloca a estabilidade do Sporting TOTALMENTE dependente do sucesso desportivo da equipa principal de futebol. Num futebol tão podre como o nosso, é um risco muito, muito imprudente de se tomar.

Se há coisa de que estou farto, é de suspensões, expulsões e eleições. De 2017 para cá parecemos mais um partido político do que um clube desportivo. Pobre Sporting...